Adriana Sarra

Lucas Farah

Mateus Zottarelli

Não é segredo que a imparcialidade e a independência dos árbitros são pilares fundamentais do instituto da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/arbitragem">arbitragem</a>, seja no Brasil, seja internacionalmente. A confiança no instituto depende diretamente da percepção de que os árbitros são livres de quaisquer influências externas que possam comprometer sua imparcialidade e independência.
Dentro desse contexto, o §1º, do art. 14 da Lei de Arbitragem (<a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9307.htm">Lei 9.307/1996</a>), é cristalino ao prever o dever de revelação do árbitro sobre qualquer fato que denote dúvida justificada quanto à sua imparcialidade e independência. Os regulamentos de arbitragem das principais Câmaras do mundo dispõem no mesmo sentido, determinando a necessidade de o árbitro revelar imediatamente – e a qualquer tempo do procedimento – os fatos ou circunstâncias que possam gerar dúvidas razoáveis em relação à sua imparcialidade ou independência.
Não por outro motivo, a International Bar Association (IBA), uma das principais organizações jurídicas internacionais, elaborou há 20 anos diretrizes sobre o assunto. Publicadas originalmente em 2004, as Diretrizes da IBA sobre Conflitos de Interesses em Arbitragem Internacional tiveram grande aceitação no mundo jurídico e foram atualizadas em 2014 e, mais recentemente, ao final de maio de 2024.
As Diretrizes foram elaboradas como instrumentos de soft law, de modo que não possuem automaticamente força vinculante sobre partes e árbitros. Assim, podem ser utilizadas como ferramenta de persuasão, sendo aplicadas como referência de melhores práticas. Podem, também, adquirir força vinculante por meio da autonomia das partes, que podem prever a sua aplicação ao celebrar, por exemplo, convenções arbitrais ou termos de arbitragem.
Para promover maior consistência e evitar contestações desnecessárias, bem como afastamentos e remoções de árbitros, as Diretrizes estabelecem, em suma, princípios gerais orientadores e apresentam listas exemplificativas de situações específicas que podem (ou não) levar à necessidade de revelação por parte dos árbitros (ou até mesmo renúncia). Seu objetivo é ilustrar as normas gerais de conduta, auxiliar os árbitros em suas revelações e, consequentemente, contribuir com as partes na avaliação das informações reveladas pelos árbitros.
A IBA dividiu as Listas em três cores: (i) a Lista Verde, quando são apresentadas situações onde não há conflito de interesse ou sequer a aparência de tal conflito, não sendo necessário que o árbitro faça qualquer revelação; (ii) a Lista Laranja, quando há situações que, dependendo das circunstâncias do caso específico, podem gerar dúvidas sobre a imparcialidade e independência do árbitro, recomendando-se, portanto, a devida revelação; e (iii) a Lista Vermelha, que se subdivide em dois grupos, o das situações classificadas como conflitos renunciáveis, em que as partes podem concordar com a permanência do árbitro, e o dos conflitos não-renunciáveis, quando a existência de um conflito de interesse impede que as partes concordem com a sua permanência e o árbitro não pode continuar no caso.
A versão mais recente das Diretrizes, datada de 2024, trouxe inovações significativas, mas manteve a essência das Diretrizes anteriores, publicadas em 2004 e 2014. A nova versão acrescentou certas circunstâncias nas listas, reforçando a importância dos padrões gerais de imparcialidade, independência e transparência em procedimentos arbitrais. Entre as principais atualizações, destacam-se:
<ul>
<li>Os deveres de imparcialidade e independência devem permanecer vigentes até a data de prolação da decisão, não se estendendo para o período de execução e/ou contestação da sentença arbitral perante o Poder Judiciário – Item (1).</li>
<li>O árbitro deve recusar ou renunciar à nomeação caso seja impedido de divulgar informações sobre imparcialidade e independência devido a sigilo profissional – Item (3)(e).</li>
<li>A omissão do árbitro em divulgar determinado fato ou circunstância não implica necessariamente a existência de um conflito de interesses ou a necessidade de desqualificação – Item (3)(g).</li>
<li>A atribuição de um “dever de investigação” razoável às partes, que se estende a quaisquer fatos ou circunstâncias que uma parte poderia ter tomado conhecimento por meio de uma investigação razoável conduzida no início ou durante o processo – Item (4)(a).</li>
<li>A obrigação das partes de informar aos árbitros sobre a existência de pessoas físicas ou jurídicas com as quais mantêm relação de interesse econômico - Item (7)(a)(1).</li>
</ul>
A nova versão das Diretrizes, ainda, trouxe inovações relacionadas às situações que se enquadram na Lista Laranja, a qual trata de situações que podem levantar dúvidas sobre a imparcialidade e independência do árbitro e, portanto, recomenda-se a revelação pelo profissional. Entre as principais alterações, destacam-se os casos em que o árbitro:
<ul>
<li>atua, ou atuou nos últimos três anos, como especialista (expert) ou parceiro de uma das partes em um assunto não relacionado à arbitragem (Item 3.1.6);</li>
<li>foi nomeado, nos últimos três anos, para auxiliar em julgamentos simulados ou preparativos para audiências em mais de três ocasiões pelo mesmo advogado ou pelo mesmo escritório de advocacia (Item 3.2.10);</li>
<li>atua ou atuou em conjunto, seja como árbitro ou advogado, com o advogado de uma das partes em outra arbitragem (Item 3.2.12 e Item 3.2.13);</li>
<li>atua em conjunto com o especialista (expert) que participa de procedimento arbitral em outro assunto em que o árbitro atua como advogado (Item 3.3.6);</li>
<li>defende publicamente posição sobre o caso, seja em um artigo publicado, palestra ou através de mídias/plataformas sociais (3.4.2); ou</li>
<li>participou de decisões, sejam elas administrativas ou não, relativas à arbitragem em alguma instituição arbitral/autoridade nomeadora (Item 3.4.3).</li>
</ul>
Tais diretrizes, ao estabelecer critérios internacionais padronizados, reforçam a confiança das partes na imparcialidade e independência do tribunal arbitral e promovem a consistência e previsibilidade nos procedimentos arbitrais, assegurando que os árbitros permaneçam imparciais e livres de conflitos que possam comprometer a celeridade e, sobretudo, a integridade do processo.

sala de arbitragem

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JOTA

Confiança no instituto depende da percepção de que árbitros são livres de quaisquer influências externas

Novas diretrizes da IBA sobre conflitos de interesses em arbitragem internacional

Confiança no instituto da arbitragem depende da percepção de que árbitros são livres de quaisquer influências externas