Silvia Cristina Sampaio

Hoje, sexta-feira, é dia de mais um capítulo do projeto “Dúvida Trabalhista? Pergunte ao Professor!” dedicado a responder às perguntas dos leitores do JOTA, sob a coordenação acadêmica do Professor de Direito do Trabalho e Mestre nas Relações Trabalhistas e Sindicais, Dr. Ricardo Calcini.
O projeto tem periodicidade quinzenal, cujas publicações são veiculadas sempre às sextas-feiras. E a você, leitor, que deseja ter acesso completo às dúvidas respondidas até aqui pelos professores, basta acessar o portal com a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/pergunte-ao-professor"># pergunte ao professor</a>.
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias"><img class="aligncenter cta-tributos size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/cta-jota-pro-tributos.png" width="688" height="688" /></a>
Neste episódio de nº 69 da série, a dúvida a ser respondida é a seguinte: 
Pergunta ► Os advogados das empresas, após o julgamento da ADI 5.766 pelo STF, terão que devolver os honorários advocatícios sucumbenciais recebidos nas ações trabalhistas?
Resposta ► Com a palavra, a Professora Silvia Cristina Sampaio.
A <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm">Lei nº 13.467/2017</a>, vulgo reforma trabalhista, introduziu na CLT uma série de dispositivos, entre eles o novo artigo 791-A, instituindo uma nova regência normativa sobre honorários advocatícios de sucumbência na Justiça do Trabalho, conforme disposto abaixo:
Art. 791-A.  Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% e o máximo de 15% sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
<ul>
<li>1.º Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)</li>
<li>2.º Ao fixar os honorários, o juízo observará: (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)</li>
</ul>
I - o grau de zelo do profissional; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
II - o lugar de prestação do serviço; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
III - a natureza e a importância da causa; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
<ul>
<li>3.º Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)</li>
<li>4.º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)</li>
<li>5.º São devidos honorários de sucumbência na reconvenção. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[1]</a></li>
</ul>
Explicam Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado que a alteração trazida pelo legislador quanto ao regime de concessão dos honorários advocatícios de sucumbência foi um dos aspectos mais impactantes da reforma, no plano processual trabalhista<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[2]</a>.
A interpretação dos doutrinadores se justifica pelo fato de entenderem que o conjunto normativo constante no artigo 791-A celetário poderia inviabilizar o direito e a garantia constitucionais fundamentais da justiça gratuita prevista no inciso XXXV do artigo 5.º da Constituição Federal, considerando a grande maioria dos trabalhadores, pessoas físicas, do país. Alertam ainda sobre os elevados riscos econômico-financeiros que envolvem o processo judicial trabalhista, especialmente para esses trabalhadores que são destituídos de renda e/ou riqueza.
Corroborando os citados autores, Carlos Henrique Bezerra Leite referenciou que § 4º do artigo 791-A seria manifestamente inconstitucional por violação ao direito fundamental de acesso à justiça para o cidadão/trabalhador/pobre, ratificando que justamente devido a esse fato que a Procuradoria-Geral da República ajuizou a Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.766 contra o caput do art. 790-B da CLT, parte final, e também em face do seu § 4º, sustentando que a gratuidade judiciária ao trabalhador pobre equivale à garantia inerente ao mínimo existencial<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[3]</a>.
Bezerra Leite relata que “na referida ação, o PGR argumenta – com razão – que ao pleitear na Justiça do Trabalho cumprimento de direitos trabalhistas inadimplidos os trabalhadores carecedores de recursos buscam satisfazer prestações materiais indispensáveis à sua sobrevivência e à da sua família<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[4]</a>.
Esclarecem ainda Thereza Nahas, Leone Pereira e Raphael Miziara que existia uma linha de entendimento de que essa regra trazida no § 4º do artigo 791-A da CLT prejudicaria substancialmente o amplo acesso do trabalhador hipossuficiente ao Judiciário Trabalhista, o que resultaria na inconstitucionalidade de aludida norma<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[5]</a>.
Destarte, em 20 de outubro de 2021, o STF finalmente concluiu o julgamento da ADI 5.766, ajuizada pela PGR, e invalidou regras da Lei nº 13.467/2017 que determinavam o pagamento dos honorários periciais e advocatícios por beneficiários da Justiça gratuita, caso fossem sucumbentes nos pedidos da reclamatória, mas obtivessem créditos suficientes para o pagamento dessas despesas em outra demanda trabalhista<a href="#_ftn7" name="_ftnref7">[6]</a>, gerando a seguinte decisão:
Decisão: O tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta, para declarar inconstitucionais os arts. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), vencidos, em parte, os ministros Roberto Barroso (relator), Luiz Fux (presidente), Nunes Marques e Gilmar Mendes. Por maioria, julgou improcedente a ação no tocante ao art. 844, § 2º, da CLT, declarando-o constitucional, vencidos os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Redigirá o acórdão o ministro Alexandre de Moraes. Plenário, 20.10.2021 (Sessão realizada por videoconferência - Resolução 672/2020/STF)<a href="#_ftn8" name="_ftnref8">[7]</a>.
Para Flávia Maia e Luiz Orlando Carneiro, como os ministros não modularam a decisão, vale a interpretação de que os artigos sempre foram inconstitucionais, considerando dessa forma, como se não tivessem sido validados no ordenamento jurídico brasileiro<a href="#_ftn9" name="_ftnref9">[8]</a>.
Luiz Colussi, presidente da Associação Nacional de Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), declarou ser a decisão extremamente importante, por permitir ao trabalhador ter um amplo acesso à justiça, como assegurado na Constituição Federal<a href="#_ftn10" name="_ftnref10">[9]</a>.
Entrementes, como fica a resposta à pergunta objeto deste artigo: “Os advogados das empresas, após o julgamento da ADI 5.766 pelo STF, terão que devolver os honorários advocatícios sucumbenciais recebidos nas ações trabalhistas?”.
A pergunta foi respondida por Daniela Crepaldi<a href="#_ftn11" name="_ftnref11">[10]</a>, a qual corroboro, no sentido da interpretação de que os honorários advocatícios consistem em verbas alimentares, não cabendo, portanto, devolução, na forma do disposto no § 14 do artigo 85 do CPC, que dispõe: “Art. 85 (...) § 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial".
Face ainda a aplicação do Princípio da Boa-Fé Processual que está intimamente ligado ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e, conforme explica Carlos Henrique Bezerra Leite, decerto que um dos objetivos fundamentais da República, trazido no inciso I do artigo 3º da Constituição Federal, é “construir uma sociedade livre, justa e solidária”.<a href="#_ftn12" name="_ftnref12">[11]</a>
Portanto, aponta o doutrinador o Princípio da Boa-Fé Processual que decorre do desdobramento do Princípio da Boa-Fé objetiva do Código Civil, que impõe aos litigantes uma conduta ética e de respeito mútuo, visando a uma prestação jurisdicional de modo célere, adequado, tempestivo e justo. Assim, reforça-se a tese da “não devolução” considerando a aplicação desse dispositivo<a href="#_ftn13" name="_ftnref13">[12]</a>.
Já para Fabiano Coelho, caberia sim a devolução através de uma Ação Rescisória contra o advogado, considerando o trânsito em julgado da ação e a publicação da decisão do STF, ainda que seja um crédito de natureza alimentar do advogado, mas por ser uma verba alimentar do trabalhador, que teve dedução de verba processual (o honorário advocatício)<a href="#_ftn14" name="_ftnref14">[13]</a>.
Interessante ponto foi o trazido por Élisson Miessa, que comparou analogicamente a situação com o parágrafo 3º do artigo 6º, da Lei 4.725/65<a href="#_ftn15" name="_ftnref15">[14]</a>, que entende pela não devolução<a href="#_ftn16" name="_ftnref16">[15]</a>.
Em arremate, o ideal seria que o Supremo Tribunal Federal tivesse feito a modulação à decisão. Nos resta aguardar, por ora, a publicação do acordão ou a possibilidade de embargos declaratórios para se chegar a uma posição consolidada.
<div id="sdr-inbound-form-artigos-impacto-nas-instituicoes-8c5227dd4ede3347a6c6" role="main"></div>
<script type="text/javascript" src="https://d335luupugsy2.cloudfront.net/js/rdstation-forms/stable/rdstation-forms.min.js"></script> 
<script type="text/javascript"> new RDStationForms('sdr-inbound-form-artigos-impacto-nas-instituicoes-8c5227dd4ede3347a6c6', 'UA-53687336-1').createForm();</script>
<hr />
&nbsp;
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[1]</a> Decreto-Lei 5.452/43. Disponível em: <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm">http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm</a>. Acesso em 25 out 2021.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[2]</a> DELGADO, Mauricio Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n.º 13.467/2017 - 2.ª ed. rev. atual. e ampl. - São Paulo: LTr, 2018, p. 363.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[3]</a> LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho – 18 ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 903.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[4]</a> LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho – 18 ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 903.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[5]</a> NAHAS, Thereza; PEREIRA, Leone; MIZIARA, Raphael. CLT Comparada Urgente. – 2 ed. Revista e atualizada – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. p. 526
<a href="#_ftnref7" name="_ftn7">[6]</a> Disponível em: <a href="http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=475159&amp;ori=1">http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=475159&amp;ori=1</a>. Acesso 25 out 2021.
<a href="#_ftnref8" name="_ftn8">[7]</a> Disponível em: <a href="http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5250582">http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5250582</a>. Acesso 25 out 2021.
<a href="#_ftnref9" name="_ftn9">[8]</a> MAIA, Flávia e CARNEIRO, Luiz Orlando. STF afasta artigos da reforma trabalhista que alteram acesso a justiça gratuita. Disponível em: <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-afasta-artigos-da-reforma-trabalhista-que-alteram-acesso-a-justica-gratuita-20102021">https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-afasta-artigos-da-reforma-trabalhista-que-alteram-acesso-a-justica-gratuita-20102021</a>. Acesso 25 out 2021.
<a href="#_ftnref10" name="_ftn10">[9]</a> Disponível em: <a href="https://www.anamatra.org.br/imprensa/noticias/31494-adi-5766-beneficiario-da-justica-gratuita-vencido-nao-precisara-arcar-com-os-honorarios-de-sucumbencia">https://www.anamatra.org.br/imprensa/noticias/31494-adi-5766-beneficiario-da-justica-gratuita-vencido-nao-precisara-arcar-com-os-honorarios-de-sucumbencia</a>. Acesso 26 out 2021.
<a href="#_ftnref11" name="_ftn11">[10]</a> CREPALDI, Daniela. Projeto Trabalho em Debate. Publicado no instagram @danielacrepaldi_ do dia 27 de outubro de 2021.
<a href="#_ftnref12" name="_ftn12">[11]</a> LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho – 18 ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 104.
<a href="#_ftnref13" name="_ftn13">[12]</a> LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho – 18 ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 104.
<a href="#_ftnref14" name="_ftn14">[13]</a> COELHO, Fabiano; MIESSA, Élisson; SOUZA JUNIOR, Antonio Humberto. Trabalho Notável. Decisão do STF sobre os honorários advocatícios e periciais nos casos de justiça gratuita. Disponível em: <a href="https://www.youtube.com/watch?v=XofZws0ECsI">https://www.youtube.com/watch?v=XofZws0ECsI</a>. Acesso 27 out 2021.
<a href="#_ftnref15" name="_ftn15">[14]</a> Disponível em: <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l4725.htm">http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l4725.htm</a>. Acesso 27 out 2021.
<a href="#_ftnref16" name="_ftn16">[15]</a> COELHO, Fabiano; MIESSA, Élisson; SOUZA JUNIOR, Antonio Humberto. Trabalho Notável. Decisão do STF sobre os honorários advocatícios e periciais nos casos de justiça gratuita. Disponível em: <a href="https://www.youtube.com/watch?v=XofZws0ECsI">https://www.youtube.com/watch?v=XofZws0ECsI</a>. Acesso 27 out 2021.

honorários sucumbenciais

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

STF concluiu julgamento da ADI 5766, mas ainda não modulou decisão

Advogados terão que devolver honorários sucumbenciais das ações trabalhistas?

Os advogados das empresas, após o julgamento da ADI 5766 pelo STF, terão que devolver os honorários sucumbenciais nas ações trabalhistas?