Eduardo Caminati Anders

Marcio Carvalho Silveira Bueno

Guilherme Teno Castilho Misale

Julia Raquel Haddad

<p align="justify">Recentemente, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (“CADE”) proferiu decisão envolvendo a temática do controle externo comum no regime de franquias, a qual se faz digna de nota em virtude do delineamento que foi explicitado sobre uma importante questão. Na ocasião a seguir descrita, avaliou-se, em suma, se, para fins da notificação de atos de concentração, uma rede franqueada, sem vínculos societários com o franqueador, pode ser considerada como parte integrante do grupo econômico do franqueador, de sorte a se contabilizar o faturamento da rede franqueada no faturamento total do grupo econômico do franqueador<a href="#sdfootnote1sym" name="sdfootnote1anc">1</a>.</p>
<p align="justify">Trata-se de decisão proferida em sede do Ato de Concentração nº 08700.000395/2019-83, que versou sobre a aquisição, por parte da Sonic 2503 Participações Ltda., das ações de emissão da Mustang 25 Participações S.A. (holding controladora do Grupo Chilli Beans), então detidas por GIF IV Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia (entidade integrante do Grupo Gávea)<a href="#sdfootnote2sym" name="sdfootnote2anc">2</a>.</p>
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</ul>
<p align="justify">No Ato de Concentração em referência, a análise da Superintendência-Geral do CADE (“SG/CADE”) pautou-se na caracterização da figura do controle comum externo do franqueador perante o franqueado por meio de simples contrato de franquia firmado entre as partes, e, com isso, na consequente configuração de um grupo econômico único, em atenção ao disposto no artigo 4º, parágrafo 1º, inciso I, da Resolução CADE nº 02/2012.</p>
<p align="justify">Pois bem, a SG/CADE iniciou sua análise a partir do exame dos tipos de franquia existentes, segmentando-os, essencialmente, em dois modelos distintos: (i) franquias tradicionais e (ii) franquias de negócio formatado (“<em>business format franchising</em>” ou <em>“uniform business franchising”</em>).</p>
<p align="justify">Conforme parecer da SG, no modelo de franquia tradicional, o franqueador concede ao franqueado o uso de sua marca e a venda dos produtos ou prestação dos serviços por ele desenvolvidos, comumente exigindo, em contrapartida, a exclusividade dos franqueados. Neste modelo, os franqueados não estão adstritos a normas rígidas de gestão do negócio estabelecidas pelo franqueador e, como resultado, dispõem de maior autonomia na condução do negócio.</p>
<p align="justify">No modelo de franquia de negócio formatado, por sua vez, além de conceder a marca e os produtos ou serviços ao franqueado, o franqueador também fornece o sistema de administração e operação do negócio, estabelecendo regras rígidas em relação à condução do negócio e aos procedimentos internos a serem adotados, restando, ao final, pouca liberdade ao franqueado para gerir a franquia. Neste modelo, o franqueador transfere, ao franqueado, técnicas que devem ser utilizadas para a produção ou venda do produto, ou para a prestação do serviço, com o respectivo suporte técnico e sob a condição de que tais técnicas sejam observadas de maneira incondicional.</p>
<p align="justify">Dito isso, segundo a SG, para se verificar a concretização do controle externo comum do franqueador perante o franqueado, é necessário considerar quais variáveis econômicas são objeto de decisão pelo franqueador e, de modo correlacionado, a relevância de tais variáveis na condução do negócio. A SG pontuou, com base em precedentes do CADE<a href="#sdfootnote3sym" name="sdfootnote3anc">3</a>, as seguintes circunstâncias que são passíveis de caracterização da figura do controle externo comum: (a) atuação como entidade única, incluindo a definição de estratégias de negócio, principais variáveis econômicas e questões mercadologicamente relevantes; e, (b) existência de relação de subordinação e dependência das empresas, incluindo poder de decisão sobre as atividades de outrem ou o controle unitário.</p>
<p align="justify">Em face desse pano de fundo, à luz do caso concreto, a SG entendeu que as franquias Chilli Beans estariam obrigadas contratualmente a observar rígidas regras de gestão e operação de sistema do franqueador, destoando-se do modelo de franquia tradicional. A SG pontuou que, apesar de a rede franqueada Chilli Beans dispor de certa autonomia e responsabilidade própria no tocante às atividades do negócio (principalmente atividades acessórias, como a contratação de funcionários e o pagamento de impostos e outras despesas do negócio), a oferta de produtos e a parte comercial como um todo estaria completamente vinculada às diretrizes estabelecidas pelo franqueador, estando a atividade-fim dos franqueados sob controle do franqueador.</p>
<p align="justify">Nesse passo, a conclusão da SG foi no sentido de que o modelo de “business format franchising”, identificado no caso em apreço, se assemelha, em tese, à figura do controle comum externo, uma vez que as características inerentes a este modelo poderiam ser semelhantes àquelas de uma entidade única, para além de poder ter a aptidão de evidenciar forte relação de subordinação entre o franqueador e sua rede franqueada. É válido destacar, no entanto, que a mera adoção do modelo de franquia de negócio formatado, por si só, não é suficiente para a caracterização da figura do controle externo comum, sendo necessário que as características enunciadas anteriormente estejam presentes.</p>
<p align="justify">De acordo com a SG, sob a ótica concorrencial, todas as variáveis economicamente sensíveis relacionadas às questões mercadologicamente relevantes seriam ditadas pelo franqueador, e, portanto, o franqueador e a rede franqueada atuariam como uma entidade única, dentro do modelo de “business format franchising”, consoante mencionado acima. Consequentemente, ainda que por via contratual e organizado sob a forma de franquia, segundo conclusão da SG, haveria efetivo controle externo comum do franqueador perante os franqueados. Sendo assim, a SG entendeu que os faturamentos do grupo franqueador e da rede franqueada deveriam ser considerados em conjunto para avaliar se o ato de concentração seria passível de notificação quando do cotejamento do critério de faturamento.</p>
<p align="justify">Outrossim, quanto aos efeitos decorrentes da operação e seus aspectos materiais no tocante ao mérito, cumpre destacar, sucintamente, que, em precedentes do CADE envolvendo franquias<a href="#sdfootnote4sym" name="sdfootnote4anc">4</a>, as participações de mercado do franqueador e da rede franqueada costumam ser consideradas em conjunto, uma vez que, sob a ótica da demanda, são considerados como uma entidade única. De toda maneira, diante do Ato de Concentração em tela, tendo em vista que a operação não ensejou sobreposição horizontal nem integração vertical, a realização de uma análise mercadológica aprofundada restou dispensada. A SG entendeu que, por parte da demanda, não existiria rivalidade entre franqueados da rede Chilli Beans, sendo que a concorrência ocorreria apenas com os demais players do mercado. Como resultado, não foram vislumbrados efeitos concorrencialmente deletérios, o que justificou a aprovação do Ato de Concentração sem restrições.</p>
<p align="justify">Em breve síntese, trata-se de importante precedente sob a égide da Lei nº 12.529/2011 para sinalizar o atual entendimento da SG/CADE no que atine à temática do controle externo comum envolvendo franquias, em particular no que diz respeito ao aspecto formal de contabilização de faturamento, contribuindo para a orientação dos administrados.</p>
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<div id="sdfootnote1">
<p align="justify"><a href="#sdfootnote1anc" name="sdfootnote1sym">1</a> Conforme leitura combinada dos artigos 88 e 90 da Lei nº 12.529/2011, realiza-se um ato de concentração quando : I – duas ou mais empresas anteriormente independentes se fundem; II – uma ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas; III – uma ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou IV – duas ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture. Assumindo a produção de efeitos no território brasileiro, um ato de concentração é de notificação obrigatória ao CADE caso preencha os critérios de faturamento (dupla trava), a saber: (i) pelo menos um dos grupos econômicos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no país, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 750 milhões; e (ii) pelo menos um outro grupo econômico envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no país, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 75 milhões (valores atualizados de acordo com a Portaria Interministerial nº 994/2012).</p>
</div>
<div id="sdfootnote2">
<p align="justify"><a href="#sdfootnote2anc" name="sdfootnote2sym">2</a> Ato de Concentração notificado ao CADE em 17/01/2019 e aprovado sem restrições em 06/03/2019, conforme despacho publicado no Diário Oficial da União.</p>
</div>
<div id="sdfootnote3">
<p align="justify"><a href="#sdfootnote3anc" name="sdfootnote3sym">3</a> Por exemplo, Atos de Concentração nº 08700.004957/2013-72 (Requerentes: Monsanto do Brasil Ltda. e Bayer S.A.), 08700.006238/2015-58 (Requerentes: PricewaterhouseCoopers Contadores Públicos Ltda. e PwC Strategy&amp; do Brasil Consultoria Empresarial Ltda.) e 08700.002105/2018-55 (Requerentes: Unilever NV e Unilever PLC).</p>
</div>
<div id="sdfootnote4">
<p align="justify"><a href="#sdfootnote4anc" name="sdfootnote4sym">4</a> Por exemplo, Atos de Concentração nº 08700.000606/2015-54 (Requerentes: BK Brasil Operação e Assessoria a Restaurantes, Good Food RS Comércio de Alimentos S.A. e King Food Co Comércio de Alimentos S.A.) e 08012.014539/2007-01 (Requerentes: Totvs S.A. e Inteligência Organizacional Serviços, Sistemas e Tecnologia em Software Ltda.).</p>
</div>


Cade

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Franquias e o controle externo comum do ponto de vista concorrencial

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