Dirce Maria Lobo Marchioni

Guilherme Lobo Marchioni

No novo governo, o combate à fome deve ser assunto prioritário. Alimentação adequada é um direito fundamental contemplado constitucionalmente que se encontra hoje seriamente ameaçado no Brasil. Buscar soluções à insegurança alimentar do nosso povo é crucial à agenda do governo federal por representar ao mesmo tempo o cumprimento de promessas de campanha e a realização do objetivo da República de reduzir desigualdades.
A administração federal empossada precisa ser incessantemente recordada que seu plano de governo, apresentado ao <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/tse">TSE</a>, afirma a urgência no enfrentamento da fome e garantia dos direitos à segurança alimentar e nutricional. A preocupação é essencial no país que, após sair do mapa da fome da ONU em 2014, retorna a um triste cenário em que 33 milhões de pessoas vivem em insegurança alimentar grave, ou seja, não possuem acesso regular a alimentos e convivem com a fome como resultado da falta de comida a todos os moradores de um domicílio.
Os alarmantes dados são do Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar, divulgado em junho de 2022 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar. A pesquisa ilustra que o adensamento da fome nos últimos anos é resultado da piora no cenário econômico e do acirramento das desigualdades sociais aprofundadas pela pandemia da Covid-19.
O direito à alimentação, na forma prevista pelo artigo 6º da <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm">Constituição Federal</a>, compõe rol de direitos sociais e corresponde a um direito fundamental da ordem democrática que exige prestações positivas pelo Estado, tendo em mente a implementação de igualdade social e, no caso específico, o direito de alimentar-se de forma digna com satisfação das próprias necessidades por meio de esforços próprios.
Falamos do direito humano à alimentação adequada, consistente no acesso físico e econômico universalizado a alimentos e recursos, como emprego ou terra, para garantir subsistência de modo contínuo, tal como proclama a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, ao dispor que todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar alimentação a si e à sua família.
Assim, não basta ter comida na mesa, é direito dos brasileiros uma alimentação adequada e, para tanto, nos termos da Lei 11.346/2006, deve o poder público, com a participação da sociedade civil, adotar políticas e ações necessárias a promover e garantir segurança alimentar e nutricional da população, ou seja, o acesso regular e permanente a alimentos em qualidade e em quantidade suficiente, tendo como diretriz práticas alimentares promotoras da saúde com respeito à diversidade cultural e sustentabilidade social.
A insegurança alimentar precisa ser combatida a partir de políticas públicas eficientes, orçamento apropriado e vontade política na implementação das ações que visem assegurar a um só tempo o direito à alimentação adequada e a dignidade da pessoa humana dos cidadãos brasileiros, em atenção aos fundamentos constitucionais do Estado democrático de Direito.
A redução da crise alimentar a ser trabalhada pelo governo Lula que se inicia em 2023 passa não apenas pelas necessárias ações de assistência social, mas também por políticas de fortalecimento da produção agrícola, por estratégias de produção, comercialização e acesso ao alimento de forma sustentável; pelo estímulo de práticas alimentares saudáveis; e, inclusive, pelo fomento de conhecimento e acesso à informação, ou seja, a transformação para um sistema alimentar justo e sustentável.
Tais políticas devem envolver a equidade no acesso à terra e recursos socioeconômicos aos pequenos produtores, atendendo populações vulneráveis e aqueles com menos recursos financeiros. Também devem estar orientadas para o incentivo às relações positivas entre áreas urbanas, periurbanas e rurais; lidar com mudanças climáticas, incluindo a regulação do uso de agrotóxicos, o desmatamento e o modo de produção de alimentos; e abranger providências para que essas políticas sejam cumpridas e que seu monitoramento seja contínuo e transparente.
Devemos ter em mente que a fome não é natural nem aceitável, tem caráter estrutural e multicausal, natureza política e econômica, e impacta a vida social. Todos os atores sociais devem ser chamados a participar desta agenda, e cabe às pesquisas e à ciência apoiar o encontro de soluções tendentes a impedir o retrocesso à insegurança alimentar e hábeis a enfrentar as estruturas que mantêm a desigualdade social. Exemplo destas iniciativas é o desenvolvimento de Programa de Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia do CNPq, como o INCT Combate à Fome, cujo foco é contribuir com estratégias e políticas públicas para a realização do direito à alimentação adequada através da conjugação de abordagens transdisciplinares e apoio de inteligência artificial.
A fome voltou ao país, e é imprescindível que o Estado atenda aos mais necessitados, oferecendo políticas públicas humanitárias, gerando oportunidades, revitalizando programas sociais, e visando o fortalecimento da educação e a criação de empregos
Em discurso de posse, o presidente Lula afirmou que é missão do seu governo que, cada brasileiro possa tomar café, almoçar e jantar. É o que se espera de uma administração pública compromissada com a justiça social e inclusão, e comprometida com providências orientadas a promover segurança alimentar e enfrentamento da fome e da desigualdade, e é o que deve ser cobrado do novo governo federal rumo a uma reconstrução e transformação do Brasil.

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JOTA

Todos os atores sociais devem ser chamados a participar desta agenda

Erradicação da fome deve ser prioridade para o governo Lula

A fome voltou ao Brasil, e é imprescindível que o Estado atenda aos mais necessitados, oferecendo políticas públicas humanitárias