Ainda garoto, conheci Fernando Fragoso como amigo de meu pai. Ao ser apresentado ao sorridente e elegante causídico, não fazia ideia da magnitude daquele Jurista. Generoso com os mais simples, e paciente com seus pares (mesmo os menos magnânimos), Fernando foi daqueles raros intelectuais que puseram em xeque a corriqueira desconfiança com o conceito de fidalguia. À exemplo de seu pai Heleno Cláudio, se tornou professor Titular de Direito Penal da Universidade Cândido Mendes e um dos maiores advogados do Direito das Liberdades no País.
A partir dos anos noventa passei a ter o deleite de conviver mais com Fernando e com seus filhos, exatamente pelo estreitamento dos laços fraternais do clã Fragoso com a minha família. A existência de clientes e projetos em comum, a vida na docência e a origem em comum da alma mater da Universidade do Estado da Guanabara/UERJ e do Colégio Santo Inácio, moldaram liames sólidos com os quais desfrutei da aliança entre as estirpes.
Anos mais tarde, para além da liderança de seu tradicional escritório de advocacia, e de transformar o aprendizado de seus alunos na rotina Universitária, Fernando decide redimir o Instituto dos Advogados Brasileiros que vivia uma crise duradoura. Tão bom de voto quanto de cultura jurídica, Fernando vence uma dura eleição e com dois mandatos saneia o IAB, inaugurando uma fase de prosperidade institucional da qual o sodalício tanto precisava.
Já em seu segundo período de gestão, Fernando forma uma diretoria com um corpo de grandes nomes do Direito (a exemplo de Bosísio, Dora Martins de Carvalho, Eros Roberto Grau), complementado com alguns profissionais menos renomados. Entre os menos experientes estava o meu nome (diretoria cultural) e, mesmo sem merecer tamanha honraria, lutei para não decepcionar quem abriu um leque de oportunidades que mudou minha história de vida.
Depois de quatro anos de abdicação de vida pessoal e profissional em prol de um projeto institucional-cultural, Fernando entregou a presidência do IAB tendo realizado a maior quantidade de palestras, congressos, e expansão do acervo bibliográfico na história da Casa de Cultura Jurídica. O mais incrível de tudo isso foi o fato de que tais proezas foram atingidas sem que ele perdesse duas de suas características como líder: a austeridade e o prestígio aos funcionários da casa.
Com Fernando aprendi tantas lições – e recebi tantos presentes – que em mais três vidas não conseguiria retribuir. Entre os exemplos que o vi praticar estavam os (cada vez mais) escassos hábitos de (a) criticar sem ofender, (b) delegar sem perder o controle, e (c) o de elogiar sem que o destinatário se entregasse ao canto da sereia, e perdesse a serenidade.
De tão generoso que foi, além de atualizar a obra de seu pai, deixou ao mundo dois dos maiores nomes da geração de criminalistas e professores de direito penal do país – Christiano e Rodrigo, com os quais tenho o orgulho de trabalhar e publicar. Ao me despedir de Fernando recordo as palavras do gênio de Itabira, para quem: “Amar o perdido deixa confundido este coração. Nada pode o olvido contra o sem sentido apelo do não. As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão. Mas as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão”[1].
Fernando segue em todos os que tiveram a sorte de lhe conhecer e com ele conviver.
______________________________________________________________________________
[1] ANDRADE, Carlos Drummond de. 1902-1987. Uma forma de saudade: Páginas de diário/organização Pedro Augusto Graña Drummond. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, p. 169.