Gabriel de Britto Silva

A <a href="https://www.youtube.com/watch?v=aMl54-kqphE">campanha publicitária</a> de 70 anos da Volkswagen no Brasil trouxe "à vida" a cantora Elis Regina e expôs a realização de dueto entre ela a sua filha Maria Rita através do uso da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/inteligencia-artificial">inteligência artificial</a>. O objetivo foi unir o passado com o presente e fazer link com o futuro. Irrecusável que é publicidade que tocou o coração de todos e foi emocionante.
De todo modo, a emoção veio na mesma proporção do desconforto. Tal fato permite reflexões sobre questões de natureza ética, já que se está diante de pessoa humana falecida e que não pode reivindicar o uso da própria imagem. Não sabemos sequer se Elis, se viva fosse, autorizaria a imagem, ainda mais para fabricante de automóveis e para fins estritamente comerciais.
Não se trata de qualquer crítica à brilhante e genial campanha, mas a utilização de ocorrido como abertura de um sério e profundo debate sobre os limites do uso da IA. Certamente essa publicidade vai ser objeto de discussão nas faculdades, no meio jurídico, na área médica e psicológica e junto aos sociólogos e antropólogos. Necessário destacar também que caberá ao órgão regulador que rege a publicidade no país estabelecer diretrizes para o uso deste tipo de tecnologia.
Importante esclarecer que o direito de imagem protege a personalidade física da pessoa, como traços pessoais, corpo, atitudes, gestos, entre outros, enquanto o direito autoral protege a obra criada pela pessoa. E o que se transmite aos herdeiros é apenas o direito autoral. O direito de imagem e as questões éticas envolvidas não são transmitidas aos herdeiros. Cabem a eles apenas gerir o legado criado em vida pelo artista. E existem deveres morais, éticos e sociais com os falecidos, ainda mais tratando-se de artistas.
Não é porque a IA possibilita trazer pessoas falecidas "à vida" que os vivos devem necessariamente fazê-lo. Recriação de imagem de falecidos em condições absolutamente novas e inéditas é algo que merece atenção, estudo multidisciplinar e fixação de normativas legais.
A população não parece estar pronta para esse avanço tecnológico tão abrupto e profundo consubstanciado nesse deslocamento de espaço e de circunstância de falecidos, o que pode ser gerador de desconforto, perturbação e de mistura entre ficção e realidade para alguns, principalmente crianças e vulneráveis.
A tecnologia não traz as pessoas falecidas de volta. O algoritmo sequer está a saber que assim está atuando de forma aparente. Cabem aos vivos que operam as máquinas serem regulados pelos vivos que recebem a consequência dessa operação, sob pena dos efeitos serem mais imprevisíveis do que a mais avançada tecnologia pode supor.

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JOTA

Emoção que vem na mesma proporção do desconforto

Elis Regina, IA e o limite do uso da imagem dos falecidos

Campanha publicitária da Volkswagen trouxe Elis Regina de volta "à vida" com o uso da inteligência artificial (IA)