Com a publicação do Decreto nº 11.129, de 11 de julho de 2022, que regulamenta a Lei 12.846, de 1º de agosto de 2013 (Lei Anticorrupção) e revoga o Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, a relação dos parâmetros para a avaliação dos programas de integridade passou a incluir a execução de diligências apropriadas para a “realização e supervisão de patrocínios e doações” (art. 57, XIII, c). O decreto anterior, neste tema específico, previa apenas que as empresas deveriam ser transparentes quanto às doações para candidatos e partidos políticos (art. 42, XVI).
A antiga previsão perdeu eficácia quando, em 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.650, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, entendeu que era inconstitucional o dispositivo da Lei 9.096 (Lei dos Partidos Políticos), de 19 de setembro de 1995, que autorizava doações de empresas a candidatos e partidos políticos. Entre os fundamentos da decisão está o fato de que a participação de empresas e seu poder econômico no processo político desequilibraria a competição eleitoral e violaria a igualdade política entre os candidatos.
A proibição da participação de empresas no financiamento de campanhas foi mais uma medida de enfrentamento da corrupção no Brasil. Antes disso, casos envolvendo corrupção e doações dessa natureza a candidatos e partidos políticos eram recorrentes. No âmbito da Operação Lava Jato, por exemplo, laudos periciais da Polícia Federal reconheceram que somente uma das empresas investigadas na operação teria realizado o pagamento de R$ 292,5 milhões em doações eleitorais, com o objetivo de ocultar propina e outros pagamentos irregulares.
Já a participação de pessoas físicas no financiamento de campanhas foi mantida, tendo o STF decidido pela sua constitucionalidade, desde que observados os requisitos previstos na legislação eleitoral. Dessa forma, acionistas, administradores, empregados e outros colaboradores pessoas físicas contratados pelas empresas continuam autorizados a fazer doações e outras contribuições a candidatos e partidos políticos.
Nesse sentido, subsiste o risco de um colaborador vir a realizar pagamento de vantagem indevida, na forma de doação eleitoral, com o objetivo de obter algum benefício para as empresas a ele vinculadas. Como se sabe, a Lei Anticorrupção dispõe que a empresa pode ser responsabilizada por atos ilícitos cometidos em seu nome, interesse ou benefício, independentemente de sua ciência ou autorização (art. 2º).
Mesmo quando não há intenção de se praticar um ato ilícito, doações a campanhas eleitorais feitas por empresários podem levantar suspeitas de irregularidades, especialmente se estes ou suas empresas mantêm negócios com a administração pública. Nessas hipóteses, as autoridades podem entender também que se trata de uma doação indireta da empresa, o que poderia representar uma violação à proibição de doações eleitorais por pessoas jurídicas e gerar consequências reputacionais e econômicas para os envolvidos, ainda que havendo mera investigação pelas autoridades.
Assim, é recomendável que sejam adotados mecanismos apropriados para a prevenção dos riscos associados a doações e contribuições políticas. Além de vedar a realização de doações eleitorais da empresa a candidatos e partidos, é possível (e desejável, na maioria das vezes) estabelecer diretrizes específicas para iniciativas de seus colaboradores, sem que isso represente um cerceamento à liberdade de expressão, de organização e de participação política.
Entre essas ações está a possibilidade de as empresas exigirem, especialmente daqueles que ocupam cargos de nível hierárquico mais elevado, que informem previamente sobre a intenção de realizar doações a candidatos ou partidos políticos, que não utilizem roupas, mochilas ou outros acessórios com o logotipo da empresa em manifestações políticas, nem façam uso de quaisquer bens, direitos ou recursos da empresa para realizar doação ou qualquer ato em benefício de candidatos ou partidos políticos.
Em suma, apesar de doações de empresas a candidatos e partidos políticos serem vedadas, existe o risco de que colaboradores realizem, em nome próprio, doação eleitoral para acobertar pagamento de vantagem indevida ou usem bens, direitos ou recursos da empresa para beneficiar candidatos, causando embaraços que podem ser evitados com a adoção de diretrizes claras pelas empresas.