Rodolfo Viana Pereira

A cada eleição, várias polêmicas jurídicas. Atuar em Direito Eleitoral é estar disposto a enfrentar emoções fortes. Preferir 220 Volts a 110. Montanha russa a rowing boats. Se me fosse pedido para escolher algumas polêmicas de estimação para este ano de 2016, sem dúvida elegeria, dentre elas, a seguinte: é possível impugnar o registro de candidatura daquele candidato que se filiou há menos de um ano das eleições (porém a mais de seis meses do pleito) a partido político que determina, em seu estatuto, prazo mínimo de um ano de filiação para concorrer?
Segundo o art. 14, §3º, inciso V da Constituição da República, a filiação partidária é condição de elegibilidade, podendo ser regulada por lei ordinária.
A legislação que regula este assunto sofreu importante modificação recente. Pelo menos desde 1995, todo candidato que quisesse concorrer às eleições deveria estar filiado a partido político em um prazo mínimo de 01 ano, segundo a redação primeva do artigo 9º da Lei 9504/97 e do artigo 18 da Lei 9096/95.
Em setembro de 2015, a Lei 13.165 alterou o artigo 9º da Lei das Eleições, reduzindo o prazo mínimo de filiação partidária para seis meses antes das eleições.
“Art. 9º. Para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de, pelo menos, um ano antes do pleito, e estar com a filiação deferida pelo partido no mínimo seis meses antes da data da eleição.” (Destacamos)
É interessante lembrar que não houve qualquer alteração no artigo 20 da Lei dos Partidos Políticos que determina expressamente:
“Art. 20. É facultado ao partido político estabelecer, em seu estatuto, prazos de filiação partidária superiores aos previstos nesta Lei, com vistas a candidatura a cargos eletivos.
Parágrafo único. Os prazos de filiação partidária, fixados no estatuto do partido, com vistas a candidatura a cargos eletivos, não podem ser alterados no ano da eleição.” (Destacamos)
Em razão deste enquadramento, há três conclusões iniciais a que se chega: 1) O prazo mínimo de filiação partidária para concorrer às eleições é de seis meses; 2) Os partidos políticos, em razão da sua autonomia interna e das pertinentes delegações constitucional e legislativa, continuam podendo fixar período maior de maturação interna dos filiados para fins de disputa eleitoral; e 3) Os partidos políticos estão impedidos legalmente de realizar alterações estatutárias nos prazos de filiação partidária nos anos eleitorais.
A questão é polêmica, sobretudo porque alguns partidos políticos fixam tradicionalmente em seus estatutos prazo mínimo de um ano de filiação para que o candidato possa disputar as eleições. Parte destes partidos não alterou seus estatutos em 2015 para compatibilizar o texto com o novo prazo previsto na lei, o que torna a questão ainda mais grave.
Ou seja, neste exato momento, existem vários casos concretos de candidatos que, em prazo inferior a um ano e superior a seis meses, filiaram-se a partidos cujos estatutos preveem prazo mínimo de um ano para se habilitarem à disputa eleitoral, dando margem, portanto, a questionamentos sobre viabilidade legal das candidaturas.
Se há polêmica, que seja, pois, insuflada: a posição aqui sustentada é de que tais esses candidatos devem ter seu registro indeferido. Isso porque, como delimitado, a filiação partidária é constitucionalmente regulada, é condição de elegibilidade detalhada em lei. Por sua vez, a legislação infraconstitucional, apesar de estabelecer prazo mínimo, garante plena autonomia às agremiações para, querendo, prever prazo maior de filiação para fins de disputa.
Como consequência, não tendo o partido mudado seu estatuto até 31 de dezembro 2015, as regras pertinentes à filiação partidária não poderão ser modificadas em 2016, como definido em lei. Em relação a esses partidos, os candidatos que se filiaram a partir de 03 de outubro de 2016 não preenchem condição obrigatória de validade para registro de suas candidaturas nas eleições municipais deste ano.
Polêmica boa é polêmica que se desdobra. E é o caso desta. Afinal, ainda resta uma relevante questão a ser enfrentada: a legitimidade ativa para impugnar o registro deste candidato é ampla ou restrita? Por outras palavras, todo candidato, partido político e Ministério Público tem legitimidade para a impugnação ou apenas os filiados ao próprio partido político?
Apesar de a questão comportar certa polêmica, a legitimidade para impugnar a candidatura deve ser, a nosso ver, a mais ampla possível. Condição de elegibilidade, ainda que definida no estatuto, como permite a lei, é requisito constitucional de validade do registro.
A questão não se limita, portanto, à esfera de interesse interna corporis das agremiações partidárias, mas diz respeito aos pressupostos de constituição da validade da disputa eleitoral como um todo.
Na medida em que o conjunto dos concorrentes e o aproveitamento dos votos compõem o quadro de representação pós-eleição, surge para todos os atores eleitorais o interesse em extirpar da disputa aqueles que não preenchem as regras exigíveis para a habilitação à candidatura, caracterizando, pois, nítido direito subjetivo. Isto é, a eliminação de concorrente, sobretudo de outro partido ou coligação, aumenta a probabilidade de sucesso eleitoral do impugnante, seja ele um candidato, partido ou coligação.
Ademais, o exercido do direito ao sufrágio passivo alinha-se, incontinenti, ao direito de voto, representando, em seu conjunto, a realização concreta de direitos fundamentais. Desse modo, sustentar que é possível registrar o candidato que não preenche condição de elegibilidade – com impactos diretos no pleito – implica atentar contra a própria fórmula da democracia representativa e a lógica sistêmica protetiva dos direitos políticos fundamentais.
Nessa linha, a única forma de garantir o respeito à adequação do quadro de concorrentes – e possíveis eleitos –, preservando a integridade eleitoral, é permitir amplo controle jurídico sobre as candidaturas. Controle esse que deverá ultrapassar o restrito ambiente interno partido, a partir da possibilidade de provocação de qualquer um dos legitimados ativos próprios da AIRC (Ação de Impugnação de Registro de Candidatura), previstos no art. 3º da Lei Complementar 64/90, quais sejam, qualquer candidato, partido político, Coligação e representante do Ministério Público.

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JOTA

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