Ricardo Medina Salla

Os Dispute Boards parecem mesmo fervilhar na cena brasileira. O Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República, visando ao desenvolvimento de boas práticas regulatórias para solução de controvérsias na gestão de contratos de infraestrutura, propôs a adoção de cláusula com previsão de instalação dos comitês. E por mais que a redação do dispositivo proposto ainda mereça módicos aperfeiçoamentos, é inegável que a ferramenta passa, finalmente, a ser considerada para uso em escala nacional.
As notícias são alvissareiras, mas despertam atenção. Nos recentes eventos promovidos pelo CAM-CCBC (São Paulo Arbitration Week) o assunto seguiu a palpitar debates. E quanto mais se falava do tema, mais se ponderava sobre a dificuldade cultural que parece se impor à implantação, de uma vez por todas, dos Dispute Boards nas obras brasileiras.
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Já o penúltimo Congresso do Instituto Brasileiro de Direito da Construção – IBDiC, o debate sobre os Dispute Boards quase que monopolizou os painéis do evento, o que só fez revelar três realidades: a inquestionável relevância desses instrumentos para o desenvolvimento da infraestrutura e o crescimento quase que repentino do interesse dos agentes públicos e privados sobre o tema e a grande repercussão dos Dispute Boards em vista dos últimos desdobramentos da nova jurisprudência e legislação.
E não era sem tempo. Quanto à primeira realidade, não há muito o que se discutir. Não é de hoje que os Dispute Boards são venerados pela indústria da construção, sobretudo a internacional, e com bastante razão. Das entidades mais reputadas aos principais guias de melhores práticas, a adoção dos Dispute Boards vem sendo recomendada há mais de 20 anos. Isso se deve, sem dúvida, aos excelentes resultados que a ferramenta traz ao saneamento de pendências de empreendimentos e obras de média e alta complexidade.
Já a segunda realidade talvez tenha a ver com a terceira. O interesse pelos Dispute Boards parece ter crescido quando o mecanismo passou a ter maior visibilidade na ordem jurídica brasileira. Tanto a sua inserção em novos contratos da Administração Pública, quanto os recentes esforços legislativos (Lei Paulistana 16.873/18, Projeto de Lei Porto-Alegrense 098/018, PL 9883/18 da Câmara dos Deputados e PL 206/2018 do Senado) parecem ter alçado o mecanismo ao nível de destaque que ele merece ter.
Se esse crescente entusiasmo com os Dispute Boards deve ser comemorado (e tem mesmo de ser), os entusiastas devem também, agora, empenhar-se com afinco para evitar que o mecanismo possa ser mal compreendido pelo judiciário e órgãos de controle. Lembre-se a epopeia por que passou a arbitragem até que a lei 9.307/96 fosse constitucionalmente reconhecida em 2001.  Lembre-se, ainda, dos caminhos pedregosos por onde tivemos de caminhar até que o STJ, e, finalmente, a lei 13.129/2015 pudesse confirmar a arbitrabilidade de controvérsias atinentes a contratos administrativos.
Não fosse a transpiração dos arbitralistas, o Brasil não seria hoje a potência mundial no uso da arbitragem que é. Os Dispute Boards, hoje, se encontram ainda em seu nascedouro, e precisam de muito apoio e carinho para amadurecer e prosperar no país. Os perigos rondam.
É uma grande felicidade enxergar magistrados afetos aos meios alternativos de solução de controvérsias, e, mais ainda, dispostos a estudá-los para, em suas sentenças e acórdãos, fazê-los valer. Apenas com decisões judiciais sensatas, como foi a do Desembargador Torres de Carvalho, é que os Dispute Boards, assim como um dia ocorreu com a arbitragem, poderão se consolidar como método inequivocamente idôneo para a solução de conflitos. Eis as palavras do Relator, que cassou a liminar que suspendia os efeitos da decisão proferida pelos membros do Dispute Board do Metrô (Voto nº AI-6.090/18, TJSP):
“(...) nada obsta o deferimento da tutela antecipatória, sem que isso represente desprestígio ao relevante instituto do 'dispute board'; mas a interferência judicial deve dar-se com moderação e em casos que fujam à normalidade, para que a resolução amigável não ser torne uma fase sem sentido ou eficácia ou que a vinda a juízo não represente mais que inconformismo com uma decisão fundamentada e, ao seu modo, correta. O edital e o contrato devem ser respeitados, salvo específico motivo aqui não demonstrado”.
Lendo o voto acima, Leonardo Toledo, advogado que atuou no processo, como que numa epifania de Arquimedes lançou o novo brocardo, que vimos aqui reproduzir: “in dubio pro Dispute Boards”. De fato, esta nova máxima deve prevalecer. Afinal, se há algum lugar de onde a fumaça do bom direito pode emanar, esse lugar é o Board, que se compõe por profissionais de grande senioridade, imparciais, diligentes, assíduos à obra, conhecedores do contrato e das dificuldades vividas no empreendimento. Sem dúvida, mais que um juízo de urgência em sede cautelar, os membros do Board têm conhecimento aprofundado sobre a controvérsia, sendo deles, portanto, a fonte mais fidedigna da provável justiça.
Por outro lado, decisões temerárias (tanto de tribunais judiciais quanto de tribunais de contas), que demonstram simples desconhecimento dos julgadores em relação ao mecanismo, podem colocar em grave risco a sobrevivência dos Dispute Boards.
Pode-se dizer que os Dispute Boards são hoje uma realidade no Brasil, mas ainda com tenra musculatura. Sigamos firmes nos esforços para fazê-lo ser o que a arbitragem é hoje no Brasil.

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JOTA

Hoje, se encontram em seu nascedouro, e precisam de apoio para amadurecer e prosperar no país. Os perigos rondam

Dispute boards: uma realidade a ser fortalecida

Hoje, se encontram em seu nascedouro, e precisam de apoio para amadurecer e prosperar no país. Os perigos rondam