Carmen Silvia Lima de Arruda

Já esperávamos novos rumos para o direito público. Adentramos o século 21 em plena revolução tecnológica, a 4a Revolução, modificando a maneira como vivemos e nos relacionamos. Caracterizada pela velocidade, volume e variedade de informações trocadas no ambiente digital (três “Vs”), atingimos a realidade do Big Data, onde conectividade e integração tornaram-se a tônica.  Para inserir-se nesta nova era, em que a gestão da informação é primordial, o governo foi obrigado a se modernizar. A pandemia mundial da Covid-19 provocou uma aceleração exponencial nas mudanças, em um processo sem precedentes, sem espaço para ineficiência, sem volta, rumo ao e-governo, exigindo a atualização dos dispositivos regulando o governo digital.
No Brasil, a digitalização havia começado pelos setores financeiros, fiscal e eleitoral, no final do século 20. Nas primeiras pesquisas comparativas conduzidas pela ONU, em 2001, o país aparecia bem ranqueado no mapa da digitalização mundial. No entanto, a corrida se acirrou, outros países evoluíram e, graças à deficiência da digitalização nas áreas sociais, o Brasil perdeu importantes posições.
Nestes anos, percebeu-se o esforço legislativo para acompanhar as mudanças dos tempos. Impulsionado pelo movimento internacional, o Brasil, conhecido como um país legiferante, promulgou um verdadeiro aluvião de leis visando a modernização do arcabouço jurídico, para imprimir maior eficiência ao setor público.
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Com um fio condutor da boa governança, a motivação, participação popular e acesso à informação ganharam destaque, começando pelas alterações da Lei 13.655/2018.  Acrescentando  dez artigos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, endereçados ao administrador, controlador e juiz na interpretação de normas de gestão pública, com conceitos modernos como consequencialismo, proporcionalidade, razoabilidade e equidade, inaugurando uma nova era para o direito público.
No mesmo ano de 2018, inspirada pela legislação europeia, adveio a Lei Geral de Proteção de Dados, Lei 13.709/2018, em vigor desde 18 de setembro de 2020.  O reconhecimento oficial da importância da gestão e proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais como corolário das garantias fundamentais de liberdade e privacidade para o desenvolvimento da personalidade humana.
Outras leis se seguiram, como a Lei das Agências Reguladoras, Lei 13.848/2019, com expressa previsão de utilização do meio eletrônico para divulgação de forma a permitir controle e transparência; o Novo Marco do Saneamento Básico, Lei 14.026/2020, com a pretensão de universalizar a entrega água potável a 99% da população e coleta e tratamento de esgoto a 90% da população brasileira até 2033, igualmente regida pelo princípio da transparência.
Mais recentemente, em 2021, foi aprovada pelo Congresso Nacional o texto da nova Lei das Licitações e Contratos, pendente de sanção presidencial. Traz modernização e digitalização nos procedimentos licitatórios, não apenas para melhoria do planejamento da execução orçamentária e desempenho do serviço público, mas também com reflexos na economia, dado que as contratações do  governo movimentam 15% do PIB brasileiro.
Concomitantemente, emendas constitucionais com foco na governança e transparência foram aprovadas, como a EC108/2020, sobre a disponibilização dos dados contábeis pelos entes federados; ainda em andamento a proposta reforma administrativa - PEC32/2020, com novos princípios da Administração Pública, dentre eles, a transparência.
De outro lado, impôs-se ao administrador público a concretização dos direitos e garantias fundamentais, a entrega do serviço à população, comando constitucional agora expresso no parágrafo 10 do art. 165 da CF/88. Para tanto, não bastam os comandos genéricos das leis, mas efetiva implantação das mudanças, em um esforço conjunto dos estados e municípios, para assimilação das novas regras. Em outras palavras, passar do plano das leis, da concepção da regra geral, para a prática: transformar em realidade a norma legal voltada para a melhoria do cotidiano da população.
Dar concretude à norma legal é a tarefa do administrador público, especialmente daquele mais próximo do cidadão. Não há tempo a perder.
<blockquote class="jota-article__eye">O novo paradigma de governo digital não pode ficar limitado à esfera federal, devendo espraiar-se pelos demais entes, estaduais, distrital e municipais, proporcionando qualidade, eficiência, rapidez, transparência e controle.</blockquote>
A integração dos dados produzidos nas mais diversas relações do Estado com o particular é fundamental para a gestão eficiente. A boa governança exige procedimentos mais simples, desburocratizados e transparentes. Não a substituição da burocracia física pela burocracia digital, com confusão e opacidade de dados, terreno fértil para corrupção.
A prioridade na digitalização de dados relativos aos serviços sociais, em especial à saúde e à educação, se faz evidente diante da persistência do estado de pandemia causada por vírus que não dá trégua. A exemplo do aprimoramento das plataformas digitais do governo para compras públicas, outras plataformas devem ser desenvolvidas, necessárias para o controle de leitos, das vacinas, assim como para permitir o retorno das atividades escolares, ainda que forma remota, com distribuição de canais e equipamentos de acesso digital à população mais carente.
Já podemos vislumbrar, com esse arsenal de leis recém-editadas, novos horizontes de desenvolvimento do setor público, em comunhão com o privado e a sociedade, demandando estudo e dedicação para seu melhor aproveitamento. O maior desafio do Estado brasileiro no século 21 é sua digitalização integral e tempestiva, viabilizada pelas alterações legislativas, que além de propiciar oportunidade de vultuosos investimentos, se traduzirá em benefício concretos para a população, ainda carente de serviços mais básicos de assistência, deficiências que agravam a desigualdade social.
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O episódio 50 do podcast Sem Precedentes faz uma análise da decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal nesta semana e que pode acelerar a aplicação de vacinas contra a Covid-19. Ouça:
https://www.youtube.com/watch?v=b9z7dDRHnrg
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a><a href="about:blank">https://publicadministration.un.org/egovkb/Portals/egovkb/Documents/un/English.pdf</a>
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> <a href="about:blank">https://www.un.org/development/desa/publications/publication/2020-united-nations-e-government-survey</a>

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JOTA

Pandemia contribuiu para a aceleração exponencial de mudanças, sem espaço para ineficiência, rumo ao e-governo

Novos rumos para o direito público

Direito público: a pandemia contribuiu para a aceleração exponencial das mudanças, sem espaço para ineficiência, sem volta, rumo ao e-governo