Fabricio Trindade de Sousa

A Imagem de um atleta profissional pode ser por ele cedida ou explorada mediante ajuste contratual de natureza civil e com a fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo, conforme expressamente disposto na Lei Pelé (9.615/98). Recente alteração promovida pela Lei 13.155 de 2015 inseriu um limitador para a remuneração ajustada entre clube e atleta pela cessão de uso da imagem, estipulando o valor máximo de 40% da remuneração total paga ao atleta. O desejo do legislador era coibir a fraude, terminou por incentivá-la. 
 A fraude que se pretendia combater é aquela consubstanciada na adoção do contrato de cessão ou alienação do uso da imagem do atleta como forma de remuneração paga sem a incidência dos tributos e direitos trabalhistas. Em síntese e, hipoteticamente, era negociado um salário de R$100.000,00, entretanto, R$40.000,00 era registrado como salário efetivo, com a inserção no contrato especial de trabalho e na carteira de trabalho e R$60.000,00 reais eram pagos a título de direito de imagem, mediante um contrato de cessão de uso de imagem, não raro subscrito por uma pessoa jurídica de propriedade do atleta. O clube reduzia custo e o atleta auferia uma remuneração mensal maior, uma vez que o valor pago pelo direito de imagem sofria uma incidência tributária inferior à do salário. O ganho do atleta na remuneração mensal líquida superior era mitigado com a perda da apuração de seus direitos trabalhistas sobre o efetivo valor recebido. Inúmeras foram e ainda são as ações trabalhistas que discutem o tema. Já atuei em alguns casos e no mais emblemático, que envolveu um ex-jogador com passagens na seleção brasileira, nas três renovações de contrato que teve com o mesmo clube, o salário permanecia o mesmo, mas os valores pagos a título de direito de imagem cresceram substancialmente, sem que a utilização de sua imagem tivesse o mesmo incremento. 
A prática é comum entre os clubes redundando na falsa impressão de que agiu bem o legislador ao fixar a limitação para os valores negociados a título de direito de imagem. Agiu mal, não apenas deixando de atacar o problema, com medidas fiscalizatórias mais eficazes, como também e, principalmente, instigando a utilização de tais contratos como instrumento de fraude. 
A primeira fragilidade reside na ausência de critério para se alcançar o montante de 40% como padrão lícito de pagamento do direito de imagem. É certo que atletas com grande apelo junto ao público são contratados mesmo que não estejam em excelentes condições técnicas e/ou físicas, mas geram enorme retorno para o clube. O maior exemplo recente no Brasil envolveu o ex-jogador Ronaldo “fenômeno” quando retornou ao país e jogou pelo Corinthians. Não posso afirmar, mas não é forçoso presumir que se na época vigorasse o limite atualmente vigente, a contratação não teria sido efetivada, por não ser interessante para o atleta.
Por sua vez, atletas com pouca expressão ou baixo retorno midiático, ou ainda jovens recém profissionalizados, desconhecidos dos torcedores, poderão ser prejudicados em seus direitos trabalhistas, uma vez que clubes mal-intencionados poderão valer-se do argumento de que respeitaram a limitação fixada em lei para negociar contratos fraudulentos, cujo objeto da cessão do uso da imagem não acontece, na prática, na proporção dos valores negociados. Ocorre que a prova de tal desproporção será uma tarefa árdua para os atletas, considerando que o legislador afirmou que até 40% do salário não há fraude na contratação da alienação do direito de imagem do atleta. Em outras palavras e, ilustrativamente, um clube que deseja pagar um salário de R$9.800,00 (nove mil e oitocentos reais para um atleta) poderá valer-se da garantia legal para criar uma fraude, pagando R$7.000,00 como salário e R$2.800,00 como direito de imagem, independente da utilização da imagem do atleta, ou até mesmo a sua utilização esporádica,  em eventuais vídeos institucionais, por exemplo, sem que isso seja caracterizado como um ato ilícito.
O combate aos possíveis contratos fraudulentos deve ser feito com a fiscalização constante dos clubes, mediante avaliação minuciosa de Auditores do Trabalho. Ocorre que tal estratégia pressupõe a qualificação prévia dos auditores para o exame de contratos de atletas profissionais, inexistindo notícia de tal iniciativa pelo Ministério do Trabalho. Não se está aqui negando a existência de fraudes em contratos de cessão do uso da imagem, mas tal realidade além de não ser universal, ou seja, há vários contratos lícito, não pode mitigar ou impedir que atletas bem sucedidos aufiram ganhos proporcionais à fama que conquistaram, ainda que tais ganhos sejam superiores aos salários que recebem. 
O problema, portanto, não reside no montante dos valores pagos, mas sim na real alienação da imagem do atleta como fator obrigatório para a realização de um ajuste a tal título. A fraude está na ocultação do salário, que devem ser duramente combatida, não nos valores ajustados. A legislação vigente ignora tal realidade e incentiva a utilização fraudulenta da cessão da imagem de atletas profissionais. Demanda reforma, urgente.

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JOTA

A fraude está na ocultação do salário, que devem ser duramente combatida, não nos valores ajustados

Direito em jogo – Direito de imagem: limitação imposta pela Lei Pelé, incentivo à fraude

A fraude está na ocultação do salário, que devem ser duramente combatida, não nos valores ajustados