Guilherme Teno Castilho Misale

Pedro Simões

O dia 9 de dezembro marca o Dia Internacional contra a Corrupção. A data foi assim declarada pela ONU no contexto da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, assinada pelo Brasil e diversos outros países em 9 de dezembro de 2003, no México. No Brasil, no ensejo do simbolismo da data, o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) realizou uma série de eventos entre os dias 6 e 7 em Brasília, reunindo autoridades de órgãos de controle e de defesa do Estado, bem como representantes de organismos internacionais e da sociedade civil.
Datas como as do dia 9 fortalecem oportunidades para refletir criticamente a respeito das ações implementadas na sociedade civil à luz de metas e compromissos estabelecidos. Neste momento, é igualmente válida a prestação de contas, destacando o que foi atingido e as ações executadas para tanto, bem como aquilo que se pretende atingir e as estratégias para o futuro. Aprender com os erros e com os acertos é uma atitude valiosa: a transformação começa do autoconhecimento.
Da mesma forma que os atos de corrupção se sofisticam ininterruptamente, com novas tecnologias e modus operandi, é essencial que haja políticas públicas orientadas por uma visão criativa, objetiva e orgânica, com o objetivo de formatar estratégias efetivas para combater o problema sistêmico da corrupção. A corrupção traz grandes prejuízos para o bem-estar econômico, aumentando a concentração de poder econômico de agentes que atuam na ilicitude. Sob um enfoque amplo, estima-se que, no mundo, anualmente cerca de US$ 1 trilhão seja pago em subornos e cerca de US$ 2,6 trilhões sejam roubados dos cofres públicos, uma soma que representaria mais de 5% do PIB global, de acordo com estudos do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Em nosso país, verificam-se problemas estruturais em diversos setores atrelados à corrupção. A título de exemplo, as políticas públicas relativas à saúde e à educação têm sido severamente impactadas – a isso se somam casos dentro desses próprios setores que mostram o aspecto generalizado da corrupção, como os escândalos das próteses no SUS e suspeitas de fraudes e desvios de recursos do FIES, para listar apenas alguns.
A corrupção facilita que maus prestadores de serviços públicos permaneçam “no poder”, além de facilitar que certa casta política se replique e perpetue, elegendo sempre aqueles que manterão os “esquemas” funcionando – desde o financiamento irregular de suas campanhas. Entes públicos e entes privados devem ser responsabilizados, à luz do devido processo legal, se confirmada a participação em práticas envolvendo corrupção. A fiscalização e a responsabilização têm um caráter econômico, de fato, mas também moral: denotam o compromisso da sociedade em rechaçar a forma corrupta de realizar negócios e políticas públicas.
Em geral, as leis brasileiras do universo de combate à corrupção têm acenado para um viés mais rígido em termos de penalidades, especialmente diante de um movimento que busca reforçar a dissuasão. Sabe-se, porém, que o aumento da pena é menos efetivo que a certeza da condenação – ainda que a condenação não seja tão grave. A corrupção, ainda que seja um grande mal em nosso país, não é crime que autoriza procedimentos “criativos”: apenas com o respeito das garantias individuais a punição se torna legítima – – e não apenas no vértice compensatório.
Paulatinamente, estímulos para a construção de um ambiente mais íntegro e transparente, arejando a “cultura” da integridade e do compliance, estão sendo desenvolvidos. Trata-se, a nosso ver, de abordagem desejável e digna de atenção, pois pode colaborar para gerar o mesmo resultado de diminuição da corrupção sem os altos custos envolvidos nos processos punitivos.
Nessa interface, o programa de compliance surge como uma medida producente, mas apenas efetiva se o compliance for realista, orgânico e perene, como parte integrante (e viva) da cultura corporativa. Isso implica dizer que o compliance que se limita a códigos (im)postos e treinamentos padronizados sem sensibilização são fórmulas inócuas para o intuito de auxiliar na prevenção e no combate à corrupção. Compliance é, antes de tudo, uma varredura da organização, autoconhecimento dos riscos, das exposições e das vulnerabilidades. De forma complementar, tem-se a conscientização e o treinamento efetivo para a operacionalização de um sistema robusto e articulado, no qual os indivíduos da própria empresa, ao internalizem o espírito da verdadeira conformidade, contribuem para a autovigilância, evitando desvios de conduta (ou facilitando a pronta identificação e resposta para a irregularidade). Nunca é demais lembrar que, no ecossistema da conformidade, o suporte genuíno da alta administração é componente crucial para que a “cultura” do compliance permeie e dite o tom do comportamento empresarial.
Colateralmente, uma variável que ganha relevo nessa agenda de “melhores práticas de conformidade” diz respeito às medidas de sensibilização acerca dos malefícios da corrupção e, nessa esteira, de ações de empoderamento para atuação ética, comprometidas com o ambiente de licitude, do “certo a se fazer”, visando extirpar qualquer potencial vestígio de corrupção. Sorrateira por natureza, e impulsionada por uma força estrutural, as estratégias para o enfrentamento da corrupção devem ser articuladas sob diversas facetas holisticamente consideradas.
Nos últimos tempos o Brasil assistiu a um sem número de operações e episódios que escancarou camadas sórdidas da corrupção. O fortalecimento da transparência e da prestação de contas são medidas oportunas para embutir senso de fiscalização e controle (até porque, como se afirma, “a luz do sol seria o melhor detergente”), porém estão longe de serem as únicas. A comunicação é uma arma fortíssima contra a corrupção, gerando sensibilização na sociedade civil. Campanhas e concursos que visam estimular propostas e ideias para a gestação de um ambiente saudável tendem a ser mecanismos igualmente válidos para trazer luz ao tema e delinear reflexões propositivas. Instrumentos legais investigativos utilizados com coerência e proporcionalidade e a coordenação entre as autoridades competentes também refletem eixos de atuação necessários dentro dessa lógica. Em suma, precisamos de ações concretas e não de discursos vazios.
Para acompanhar e, mais que isso, superar o ritmo crescente e difuso da corrupção, é imperativo que as iniciativas sejam ainda mais inteligentes e coordenadas. Um ambiente isento de corrupção é inegavelmente mais saudável e estimulante para a economia do país, na mesma medida que o é para a competitividade da indústria, atração de investimentos, progresso econômico e social etc. Como parte da educação social, deve-se ter incrustada a premissa de que “a corrupção não compensa” e deve ser combatida com rigor, não obstante o peso político ou econômico da instituição ou dos agentes eventualmente nela implicados.
Ora, a corrupção corrói a democracia e coloca em xeque a credibilidade das instituições, gerando ambientes de poderes desvirtuados, minando, inclusive, o senso de justiça. Na igualdade de um Estado Democrático de Direito não há espaço para a economia de compadrio, relações de patrimonialismo e favorecimentos escusos. É na antessala da corrupção que se camuflam tais comportamentos anômalos. Ao fim, a luta contra a corrupção é a luta pela democracia republicana!

gavel on money

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Dia Internacional contra a Corrupção

O que falta para o Brasil