Isabela Maria Rosal Santos

Em junho de 2020, durante a crise epidêmica da Covid-19, o Senado votou e apresentou à Câmara dos Deputados, onde ainda aguarda apreciação, o chamado Projeto da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Esse movimento político decorre de reivindicações oriundas da propagação de notícias falsas nas redes sociais, onde todos os usuários podem ser criadores de conteúdo, e que geram preocupações ainda mais significativas em anos eleitorais.
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>Dentro desse cenário surgem duas questões: (i) qual deve ser o formato da regulação de conteúdo em plataformas online; e (ii) quem deve ser responsável pela fiscalização do conteúdo das publicações, as próprias plataformas, um sistema de multiholders ou o próprio Estado.
Desde a eleição americana de 2016, é latente a percepção de que os discursos sobre fake news podem ser direcionados a depender do fim pretendido pelo locutor. Trump seguiu até o fim de seu mandato estratégia digna de George Orwell com seu Ministério da Verdade do clássico “1984”, intitulando como falsa qualquer notícia negativa sobre sua gestão, principalmente aquelas veiculadas pela mídia tradicional<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>, ao passo em que transformava sua conta no Twitter em veículo de publicação oficial do governo<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
Tal estratégia exemplifica esforço por atores do capitalismo digital para fortalecer as mídias não tradicionais, garantindo cliques para os sítios dispostos a financiá-las, fortalecendo a comunicação com o público relacionado a, nesse caso, o candidato político.
<blockquote class="jota-article__eye">As plataformas, em resposta, passaram a agir de maneira a moderar e coibir a disseminação de notícias falsas, autorregulando o conteúdo postado em suas redes.</blockquote>
A moderação realizada pelas companhias culminou, inclusive, na exclusão da conta do ex-presidente norte-americano no Twitter<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
Trump, para garantir o sucesso da sua estratégia a partir da disseminação de desinformação, ainda quando em exercício, reagia buscando alguma forma de legislação que reduzisse o espaço de atuação das empresas sobre o conteúdo pessoal postado por cada usuário.
Baseado em uma suposta liberdade de expressão e dando protagonismo ao Estado como regulador das atividades empresariais, defendia posição que significava clara distorção do intuito inicial de haver uma regulação acerca dos conteúdos disseminados via internet.
A bandeira pela regulação por sobre o conteúdo disseminado nas plataformas digitais em verdade adveio da pressão da sociedade civil para combater a desinformação em massa, que foi intensificada no contexto de crise da Covid-19 em que autoridades disseminaram notícias que poderiam trazer consequências desastrosas para a própria população.
É necessária, portanto, a normatização, para que as sociedades deixem de estar a mercê de informações que não possuam qualquer lastro na realidade.
Outro fator que corrobora a necessidade de adoção de alguma forma de regulação das redes é a existência de legislações específicas que já cobram isso em alguns países. Enquanto a União Europeia adotou um sistema de autorregulação, países-membros podem adotar estratégias distintas, como foi a opção alemã<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>.
O Parlamento Alemão aprovou norma que estabeleceu um sistema de respostas, baseado em transparência, para solucionar reclamações sobre conteúdos potencialmente lesivos.
Dessa forma, teria papel no controle do conteúdo, principalmente, o usuário e a plataforma, cabendo ao Estado subsidiariamente multar empresas que descumprem as regras.
Entretanto, essa regulação incisiva em definir diversas obrigações às empresas atuantes no ambiente digital, também foi criticada, inclusive pela insegurança da atuação esperada das companhias em definir qual conteúdo é nocivo<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a>.
Ou seja, existe grande pressão para respostas institucionalizadas para a propagação de notícias falsas, mas ainda não há consenso algum sobre o melhor modelo a ser adotado.
Ainda, existem perguntas que a comparação internacional não conseguiu alcançar, é o caso da regulação do conteúdo de conversas do WhatsApp, aplicativo de mensagens instantâneas e grande disseminador de notícias falsas<a href="#_ftn7" name="_ftnref7">[7]</a>.
No Brasil, em maio de 2020, começou o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de bloqueio desse aplicativo a partir de decisões judiciais, o que pode trazer delimitações sobre a temática.
Além disso, nacionalmente existem regras de conduta ética da profissão de jornalismo<a href="#_ftn8" name="_ftnref8">[8]</a>, o que limita a atuação de profissionais da disseminação de informações falsas. Cabe agora acompanhar o desenvolvimento do Projeto de Lei a ser votado e o conteúdo de decisões judiciais sobre o tema para compreender quais serão os caminhos adotados pelo ordenamento brasileiro para impedir a propagação de notícias falsas, definindo o papel de cada agente.
Espera-se das autoridades resoluções que cheguem antes de 2022, e contribuam para um ano eleitoral justo e contando com uma população consciente e verdadeiramente informada, bem como segurança jurídica para que os mais diversos candidatos possam se colocar no debate publico.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Disponível em: &lt;<a href="https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/05/26/senado-vota-pl-das-fake-news-na-proxima-semana-avisa-davi">https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/05/26/senado-vota-pl-das-fake-news-na-proxima-semana-avisa-davi</a>&gt;. Acesso em 29 de maio de 2020.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> BENKLER, Yochai; FARIS, Robert; ROBERTS, Hal. Network propaganda: manipulation, disinformation, and radicalization in American politics. Nova Iorque, NY. Oxford University Press, 2018. Pp. 4-5.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Disponível em: &lt;<a href="https://veja.abril.com.br/mundo/suprema-corte-dos-eua-proibe-trump-de-bloquear-opositores-no-twitter/">https://veja.abril.com.br/mundo/suprema-corte-dos-eua-proibe-trump-de-bloquear-opositores-no-twitter/</a>&gt;. Acesso em 29 de maio de 2020.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Disponível em: &lt; <a href="https://brasil.elpais.com/tecnologia/2021-01-09/twitter-suspende-permanentemente-a-conta-de-trump.html">https://brasil.elpais.com/tecnologia/2021-01-09/twitter-suspende-permanentemente-a-conta-de-trump.html</a>&gt;. Acesso em 03 de abril de 2021.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> TOFFOLI, José A. D. Fake news, desinformação e liberdade de expressão. In: Fake news e regulação. coordenadores Georges Abboud, Nelson Nery Jr. e Ricardo Campos. - 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> SCHULZ, Wolfgang. Regulating Intermediaries to Protect Privacy Online – the Case of the German NetzDG. HIIG Discussion Paper Series, v. 1, n. 1, p. 15, 2018, p. 8–9.
<a href="#_ftnref7" name="_ftn7">[7]</a> Sobre o assunto, participação do criador de conteúdo, Felipe Neto, no programa Roda Viva. Disponível em: &lt;https://www.youtube.com/watch?v=KQ1CQqNveac&gt;. Acesso em 29 de maio de 2020.
<a href="#_ftnref8" name="_ftn8">[8]</a> ABBOUD, Georges; CAMPOS, Ricardo. A autorregulação regulada como modelo do Direito proceduralizado  Regulação de redes sociais e proceduralização. In: Fake news e regulação. coordenadores Georges Abboud, Nelson Nery Jr. e Ricardo Campos. - 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020.

Redes sociais

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JOTA

Medidas contribuem para um ano eleitoral justo e com uma população consciente e verdadeiramente informada?

Desinformação e moderação de conteúdo em redes sociais

Medidas contribuem para um ano eleitoral justo e com uma população consciente e verdadeiramente informada?