Thiago Ferreira Almeida

O Direito Internacional do Investimento se constitui como parte integrante do Direito Internacional Público e possui como objeto de estudo os investimentos transfronteiriços, ou seja, aqueles capitais que envolvem mais de uma jurisdição nacional. Dentre as principais espécies de capital, citam-se os investimentos estrangeiros diretos (IED), mais conhecidos pela sigla inglesa FDI (Foreign Direct Investment), os investimentos de portfólio, conhecidos por se configurarem como os de capital especulativo, as transferências unilaterais (em inglês, remittances) e os decorrentes de organizações internacionais de cooperação financeira ou de agências nacionais de fomento (conhecidos pelo termo de Ajuda Oficial ao Desenvolvimento ou, em inglês, Official Development Aid - ODA).
Dessa forma, salienta-se que os FDI apresentam grande representatividade nos fluxos internacionais de capital, a partir da segunda metade do século XX. Sua atuação, já no século XXI ultrapassa o entendimento de capitais privados e engloba os capitais das estatais (ao capital das estatais chinesas) e os Fundos Soberanos (Sovereign Wealth Funds - SWFs).
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Quanto aos SWFs, os países do Golfo Pérsico, como os Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Qatar, Omã, Kwait e Bahrein, assim como a China, Rússia e Cingapura, destacam-se pela proeminência de seus fundos soberanos no sistema financeiro global, em que 2/3 de todos os SWFs no mundo se encontram em economias emergentes.
Conforme dados do Sovereign Wealth Fund Institute, O Fundo Global de Pensão Governamental da Noruega possui o maior capital no mundo, no montante de 1,3 trilhões de dólares. À exceção do fundo soberano norueguês, a quase totalidade dos fundos soberanos com maiores ativos encontram-se no leste asiático (principalmente China) e nos países árabes.<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>
Já os recursos de ODA são característicos dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento, em que se destacam, no século XXI, a criação de novas instituições a partir da atuação dos emergentes, como o Novo Banco de Desenvolvimento (New Development Bank - NDB).
Frente ao novo contexto de maior participação das economias emergentes no sistema financeiro internacional, principalmente atuando como exportadoras de capital, grande parte da doutrina contemporânea do Direito Internacional do Investimento reconhece que o atual sistema de solução de controvérsias, constituído principalmente pelo modelo Investidor-Estado encontra-se em certa crise de legitimidade.
Essa redução da legitimidade é proveniente da pluralidade de decisões arbitrais ad hoc, desprovidas de jurisprudência consistente, pela denúncia de tratados bilaterais de investimento (conhecidos pela sigla inglesa Bilateral Investment Treaty - BIT) e pela denúncia de países-membros ao Centro Internacional para a Resolução de Conflitos sobre Investimentos (ICSID).
Ressalta-se que o Centro Internacional para a Resolução de Conflitos sobre Investimentos (International Centre for Settlement of Investment Disputes - ICSID) foi criado pela Convenção de Washington de 1965 e corresponde a uma das cinco organizações que compõem o Grupo Banco Mundial. Todavia, a grande maioria dos casos arbitrais foram constituídos somente a partir da década de 1980.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>
Conforme o Relatório Mundial de Investimentos da Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), de 2020, existem em vigor 2.654 acordos internacionais sobre investimento (acordos bilaterais e de livre comércio com disposições sobre investimentos). Contudo, as duas décadas dos século XXI demonstram forte decréscimo do número de assinatura de acordos, sendo inclusive que, no ano de 2019, ocorreram mais denúncias de instrumentos existentes (34) que novas assinaturas (22).
<blockquote class="jota-article__eye">A título de comparação, no ano de 1995 teve mais de 200 tratados assinados sobre investimento. Observa-se uma maior concentração de assinatura de tratados dessa temática na década de 1990, período este marcado pela disseminação de práticas neoliberais.</blockquote>
Interesse observar que o mesmo relatório demonstra um sistemático aumento de casos arbitrais sobre investimento a partir do século XXI. No ano de 2017, foram registrados mais de 80 casos. Entre 1987 a 2019, registram-se 1.023 casos arbitrais. O número de assinaturas de novos acordos de investimentos diminui enquanto o número de casos arbitrais aumenta.<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>
Dessa forma, é possível inferir que os conflitos sobre investimentos no atual modelo arbitral pode ser considerado como uma causa persististe a alterar o posicionamento dos países a se tornarem signatários dessas espécies de tratados sobre investimentos.
Frente ao presente contexto de perda de legitimidade do Direito Internacional do Investimento, observa-se a discussão de alternativas ao modelo de solução arbitral Investidor-Estado.
Os países da América Latina, historicamente partes de diversos tribunais arbitrais ad hoc, defendem um sistema alternativo. O Brasil, por exemplo, utiliza o modelo de solução arbitral Estado-Estado em seus Acordos de Cooperação e Facilitação de Investimento (ACFIs). Inclusive, o Acordo Mercosul-União Europeia também se restringe à utilização da solução arbitral Estado-Estado.
Acrescenta-se, dentre as possibilidades, a necessidade de se construir uma corte de apelação, como existente no Sistema de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC), a rever eventuais abusos e incoerências das decisões arbitrais. O Órgão de Apelação da OMC encontra-se definido no art. 17 do Entendimento Relativo às Regras e Procedimentos Solução de Controvérsias (Understanding on Rules and Procedures Governing the Settlement of Disputes - DSU). O Órgão de Apelação da OMC analisa exclusivamente questões de direito decididas pelos painéis, sendo formado por sete membros, dos quais três são selecionados para compor a análise de um caso em particular.<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>
Por fim, registra-se o debate sobre a proposta da União Europeia em criar um tribunal internacional específico para tratar do tema dos investimentos internacionais, que envolveria um tribunal de primeira instância e um órgão de apelação<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>.
Destarte, o contexto contemporâneo do Direito Internacional do Investimento, que se observa a crise de legitimidade pelo modelo de solução de conflitos via arbitragem Investidor-Estado, permite a proliferação do debate de alternativas provenientes dos países emergentes e desenvolvidos a promover as devidas reformas do seu sistema jurídico internacional.
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<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> SOVEREIGN WEALTH FUND INSTITUTE - SWFI. Top 95 Largest Sovereign Wealth Fund Rankings by Total Assets. Disponível em: https://www.swfinstitute.org/fund-rankings/sovereign-wealth-fund. Acesso em: 18 mar. 2021.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> INTERNATIONAL CENTRE FOR SETTLEMENT OF INVESTMENT DISPUTES - ICSID. About ICSID. Disponível em: Acesso em: https://icsid.worldbank.org/about. 22 mar. 2021.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT - UNCTAD. World Investment Report 2020. International production beyond the pandemic. United Nations, 2020. Disponível em: https://unctad.org/system/files/official-document/wir2020_en.pdf. Acesso em: 21 mar. 2021.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a>(WORLD TRADE ORGANIZATION - WTO. Appellate Body. Disponível em: https://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/appellate_body_e.htm. Acesso em 21 mar. 2021.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> COUNCIL OF THE EUROPEAN UNION. Negotiating directives for a Convention establishing a multilateral court for the settlement of investment disputes. Bruxelas, 20 de março de 2018. Disponível em: https://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-12981-2017-ADD-1-DCL-1/en/pdf. Acesso em: 24 mar. 2021.

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JOTA

Análise das alternativas contemporâneas

Crise de legitimidade do Direito internacional do investimento

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