Isaias Coelho
Pesquisador sênior do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV. Foi chefe do Departamento de Política Tributária do FMI e secretário-adjunto da Receita Federal
Tributação é importante para o desenvolvimento. O sistema tributário dá o tom e a direção da economia. No caso brasileiro, a estrutura tributária é disfuncional, ineficiente, injusta; reprime a atividade econômica, portanto é entrave ao crescimento e à criação de novos empregos com melhores salários.
Nesse sentido é bem-vinda a proposta da Câmara de Deputados, sob relatoria do Deputado Luiz Carlos Hauly, de unificar impostos e simplificá-los, sem aumento da carga tributária. Em muitos pontos a proposta necessita de reparos, mas nada que não possa ser ajustado--com exceção da CPMF.
A CPMF entraria pela porta dos fundos, travestida de IOF amplo com o nome duvidoso de CONFINS. Segundo a proposta, a receita da CPMF permitiria cobrir o buraco que surgiria com a redução da contribuição previdenciária.
Na verdade, não há buraco a cobrir. Quando se unificam impostos sem aumentar a carga, a arrecadação do novo imposto é igual à do imposto eliminado. A alíquota do novo imposto obtém-se facilmente dividindo a receita que se arrecadava com os impostos antigos pela nova base tributária.
Reformas tributárias que não aumentam a carga são reformas da qualidade: elimina-se um imposto ruim para colocar no seu lugar um imposto melhor. Nessa perspectiva é difícil entender a proposta de restaurar a CPMF: ela é tributo da pior qualidade, pior do que qualquer outro imposto existente no Brasil. A CPMF incide em cascata, é regressiva e causa desintermediação financeira (pagamentos fora da rede bancária) e informalidade (caixa dois, evasão fiscal). Há muitos estudos documentando os efeitos nocivos da CPMF.
Somente nove países têm CPMF[1]. Entre eles, nenhum país desenvolvido, nem nenhum país com mercado de capitais sofisticado como o do Brasil. Quando havia CPMF no Brasil, os detentores de elevados recursos financeiros estavam (por lei!) livres dela, já que abrigados em “contas de investimento” geridas pelo bancos. Os de menores recursos eram deixados na chuva.
É difícil entender de onde o deputado tirou a ideia da CPMF já que sua proposta não precisa dela. A CPMF não tem nenhum papel a desempenhar numa reforma tributária modernizadora.
Ah, ia esquecendo! A CPMF é também cobrada pelo Exército Islâmico nos territórios por ele ocupados. Só que o EI, aparentemente com um pouco mais de conhecimento econômico, limita a incidência às pessoas físicas, poupando as movimentações financeiras das empresas.
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[1] Argentina, Bolívia, Colômbia, Honduras, Peru, República Dominicana, Sri Lanka, Vanuatu e Venezuela. O imposto argentino expira em 2019 e os de Bolívia e Colômbia em 2021.