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Como funciona o porte de armas no Brasil e o as propostas sobre o tema para 2022

Normas sobre armas foram flexibilizadas pelo governo Bolsonaro. Outros candidatos sinalizaram que pretendem rever o tema

armas de fogo
Crédito: Unsplash

O porte e a posse de armas foram facilitados no Brasil desde 2019, com o início do governo do presidente da República Jair Bolsonaro. O atual chefe do Executivo já defendia essas facilidades, como bandeira, desde sua atuação como deputado federal. Neste texto, você será informado sobre como funciona o porte de armas no Brasil e o que alguns dos pré-candidatos à Presidência da República já disseram sobre o assunto.

Começou ainda no primeiro ano de governo Bolsonaro a flexibilização das exigências para vendas de armas a civis. Ainda em 2019, Bolsonaro editou decretos presidenciais que flexibilizaram exigências para o porte e a posse de arma por pessoas físicas, o que aumentou as vendas de armas de fogo para a população civil.

Até março deste ano, o governo Bolsonaro já tinha publicado 15 decretos presidenciais, 19 portarias, e duas resoluções que afrouxaram as regras de acesso civil a armamentos.

Ficou mais fácil principalmente a posse de armas, que é o registro concedido pela Polícia Federal em que a pessoa física ganha direito à aquisição e manutenção de arma em residência ou estabelecimento comercial. Esse registro não permite o uso do armamento em deslocamentos fora dos locais autorizados.

Mas essas medidas de Bolsonaro também facilitaram o porte de arma, tipo de registro que permite às pessoas andarem armadas na rua, transportando armamentos e munição em veículos. Esse é o caso principalmente de seguranças privados, mas também de milhares de colecionadores, atiradores desportivos e caçadores (CACs).

Com os decretos de Bolsonaro, deixou de ser exigido na prática que as pessoas comprovem “efetiva necessidade” para ganhar o registro de porte ou posse de arma.

Também foi triplicada a quantidade de armas que pessoas físicas podem deter em sua propriedade – cada pessoa pode deter até seis armas; antes, eram duas no máximo.

Essa permissão, para compra de até seis armas, foi suspensa por decisão da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), a pedido de partidos de oposição a Bolsonaro, mas a Suprema Corte ainda precisa concluir julgamentos que podem anular ou validar normas publicadas por Bolsonaro sobre o comércio de armas.

O registro de porte ou posse de arma, aliás, também teve ampliado o período de validade. Passou a precisar de renovação somente após um prazo de 10 anos – anteriormente era preciso renová-lo a cada cinco anos.

Ainda é responsabilidade do Exército definir quais armas possuem uso restrito para militares ou policiais e quais podem ser compradas por civis. Mas as medidas bolsonaristas permitiram que qualquer cidadão compre até um fuzil, arma anteriormente restrita a policiais e militares.

Cadastros de armas

É o Exército quem administra o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma) e autoriza a compra de armas ou munições por forças policiais do país. O Sigma é um banco de dados que registra todas as armas na posse de militares e policiais, até no uso privado.

O Exército também fiscaliza o registro de porte de arma para colecionadores de armas, atiradores esportivos e caçadores (CACs), categoria que teve acesso às armas bastante facilitado pelo governo Bolsonaro. Antes das medidas bolsonaristas, o atirador desportivo era classificado em três níveis. No nível mais graduado, de participante de campeonatos, o atirador podia comprar até 16 armas por ano.

Com os decretos, acabou a divisão por nível e qualquer atirador pode comprar até 60 armas, das quais 30 podem ser fuzis de uso restrito, e 180 mil munições por ano. Já os caçadores podem comprar até 30 armas, das quais 15 de uso restrito, e 6 mil balas.

Por ser a categoria com acesso mais fácil às armas e por ter sido facilitado que civis sejam classificados como CACs, esse tipo de credencial passou a ser mais usado por organizações criminosas para conseguir armamentos, de acordo com investigações da Polícia Federal.

A Polícia Federal é o principal órgão de fiscalização de armas utilizadas por civis. A atuação da PF foi expandida pelo Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003), promulgado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa norma buscou restringir o acesso de civis às armas.

Embora na prática não seja mais exigida a “efetiva necessidade” para compra de arma, para adquirir uma arma o civil ainda precisa comprovar que não possui antecedentes criminais ou que não responde a processo criminais ou inquéritos policiais; precisa mostrar ocupação lícita; precisa apresentar residência certa; precisa demonstrar capacidade técnica (aprovado em teste de tiro); precisa provar aptidão psicológica e necessita ter idade mínima de 25 anos.

Contexto

A fabricação e a comercialização de armas começaram a ser reguladas no Brasil por um decreto de 1934, durante o governo de Getúlio Vargas. Essa norma tratava apenas de militares. Só no começo dos anos 80 foi editada uma portaria para controlar a aquisição e o registro de armas por civis.

Em 1997, a Lei 9.437 criou o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), administrado pela Polícia Federal, que serve de cadastro para as armas possuídas por civis. Essa norma também passou a impor novas exigências para a concessão do porte de arma, tais como a comprovação de idoneidade, de comportamento social produtivo, de efetiva necessidade, de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo. Por essa lei foi criado o crime de porte e posse ilegal de arma.

Já a partir de 2003, o governo Lula impulsionou discussões sobre a proibição da venda de armas. Ainda em julho daquele ano, Lula apresentou uma mensagem presidencial ao Congresso em que pedia prioridade na votação de projetos sobre o comércio e o porte de armas.

Nasceu nesse ambiente, em dezembro de 2003, o Estatuto do Desarmamento, aprovado no Congresso como a mais ampla política de controle de armas da história do Brasil. A aprovação do estatuto também estipulou que fosse realizado o primeiro referendo desde a redemocratização, que convocou a população para decidir se deveria ser proibido o comércio de armas em território nacional.

Realizado em 23 de outubro de 2005, o referendo decidiu que o comércio de armas continuaria permitido no Brasil, pois a maioria da população votante (63,94% dos votos válidos) assim desejou. O referendo questionava apenas um artigo do Estatuto do Desarmamento, que tratava do comércio de armas.

Eleições 2022: O que os possíveis candidatos à presidência já disseram sobre o porte de armas

O que Jair Bolsonaro já disse sobre o assunto

Depois de promover diversas ações que facilitaram o acesso de civis a armas e munições, Bolsonaro deu diversas declarações em que defendeu que “quanto mais pessoas tiverem armadas, melhor”, mas não prometeu nenhuma nova medida específica em um eventual segundo governo.

“Quanto mais pessoas estiverem armadas, melhor. Todas as ditaduras são precedidas de uma campanha de desarmamento. Nosso governo não quer saber de campanha do desarmamento”, disse o presidente em junho do ano passado.

“Todo mundo tem que comprar fuzil, pô. Povo armado jamais será escravizado”, afirmou em agosto de 2021.

O que Lula já disse sobre armas

Ao falar das medidas bolsonaristas que facilitaram da compra de armas, Lula retrucou que, se eleito, vai “desarmar” o país e fazer com que “pessoas devolvam essas armas”, sem especificar quais medidas poderia adotar.

“Nós aprovamos o Estatuto do Desarmamento. Veja a diferença entre eu e o Bolsonaro. Ele não quer dar arma pro favelado nem pro trabalhador, ele quer dar arma pros milicianos, pros fazendeiros. Ele quer dar arma pras pessoas atirarem em sem-terra, em quilombolas, pra matarem Marielle. Podem saber: se o PT voltar no governo, a gente vai fazer com que as pessoas devolvam essas armas. Vamos desarmar esse país. Quem tem que ter armas são as Forças Armadas e as polícias militares”, disse o petista em entrevista à TV 247, em fevereiro do ano passado.

O que Ciro Gomes já disse sobre armas

O presidenciável do PDT, Ciro Gomes, também já prometeu que, se eleito, vai tirar armas do controle de civis.

“Se um dia eu for presidente desse país, arma na rua será apreendida se não tiver na mão da polícia, com a devida autorização. Aliás, como eu já fiz no Ceará […] Todas as armas serão recolhidas e será dado um prazo para quem quiser recolher voluntariamente”, afirmou, em outubro do ano passado, garantindo ainda a indenização aos proprietários legais.

O que João Doria já disse sobre armas

O presidenciável do PSDB, João Doria, também já defendeu maior restrição de armas às civis. Ele também criticou as medidas bolsonaristas que facilitaram a venda de armas. Para Doria, elas só serviram para fortalecer criminosos.

“As facilidades criadas pelo governo federal serviram, na prática, para fortalecer o arsenal da bandidagem e dificultar a investigação e a punição dos criminosos”, afirmou Doria em artigo de fevereiro deste ano.

“O Estatuto do Desarmamento pode receber aperfeiçoamentos para atender casos específicos, como o de produtores rurais de áreas remotas ou sem o devido atendimento das forças do Estado”, acrescentou.

O que Simone Tebet já disse sobre armas

A presidenciável do PMDB, Simone Tebet, já defendeu a aprovação de um projeto de lei que facilitava o acesso da população rural às armas. Também já defendeu o porte de arma para colecionadores, atiradores desportivos e caçadores (CACs). Mas ela sofreu ameaças depois de pedir mais discussão sobre um projeto de lei (PL 3.723/2019), que facilitaria ainda mais o porte de armas para CACs. Tebet diz que é contra “liberar geral”.

“CACs podem e devem portar armas, mas esta Casa e a Câmara não podem aproveitar um projeto como esse e tentar liberar geral. E quero lembrar que nós não vamos admitir, nem vamos nos curvar a qualquer tipo de ameaça. Quero dizer para quem está nos ouvindo que nós mulheres não chegamos aqui pedindo licença para ninguém. Então, se acharem que, por ameaças veladas, anônimas, por e-mails, vão impedir a nossa voz e a nossa consciência, estão muitíssimo enganados “, afirmou em março deste ano.

O que Eduardo Leite já disse sobre armas

“Acho que a regulamentação que a gente tem e teve até o Bolsonaro, que se mantém ainda com alguma restrição, deve ser mantida. As armas não devem ser de acesso livre para todos. Há que se ter restrições”, disse Eduardo Leite em entrevista ao ND Notícias em novembro do ano passado.