Luiz Paulo Pieruccetti

Jorge Soares

Esta semana (28/06) o Tribunal Superior do Trabalho – TST promoveu uma importante audiência pública para discutir se a exigência de apresentação de antecedentes criminais gera dano moral ao candidato a uma vaga de emprego
A audiência pública em questão fomentou o debate e poderá contribuir para a formação de opinião dos Ministros que integram a Seção Especializada de Dissídios Individuais I (SDI-I) a respeito do terma, que é objeto de dois processos submetidos ao rito dos recursos de revista repetitivos previsto na Lei 13.015/2014.
Isto significa dizer que o julgamento desses dois casos terá o condão de pacificar o entendimento da Justiça do Trabalho sobre esta matéria que, na verdade, não compreende apenas a questão dos antecedentes criminais, mas que também engloba a verificação de restrição junto aos serviços de proteção ao crédito ou, ainda, tudo aquilo que se denominou no meio empresarial como background checking, uma vez que os princípios em discussão são basicamente os mesmos, como ficará adiante demonstrado.
Os defensores da proibição de qualquer tipo de verificação em relação aos antecedentes dos candidatos a emprego baseiam seu entendimento, em síntese, (i) na vedação constitucional quanto a qualquer tipo de discriminação (art. 5º, caput); (ii) na Lei 9.029/1995[1]; (iii) violação ao princípio constitucional da legalidade estrita (art. 5º, II, CF/88); (iv) princípio constitucional da intimidade (art. 5º, X, CF/88) e; (v) princípio dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88).
Explica-se.
Se um candidato, inserido no cadastro de proteção ao crédito ou com antecedentes criminais, é desclassificado à vaga para qual havia postulado em razão do não cumprimento destas obrigações, este candidato acabará sofrendo uma dupla penalidade, pois é justamente o novo emprego que possibilitará a sua regularização financeira (e, assim, a eliminação da inclusão de seu nome no cadastro de restrição ao crédito) ou a sua ressocialização (em caso de candidato com antecedentes criminais).
Aqueles que advogam pela impossibilidade de se fazer esse background checking defendem a ideia de que o uso dos antecedentes criminais deve ficar restrito à instrução do processo criminal e às hipóteses previstas em lei. Neste sentido, qualquer consulta aos antecedentes criminais ou aos órgãos de proteção ao crédito acarretariam a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem dos candidatos, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
De outro lado, aqueles que defendem a inexistência de dano moral em razão do backgroung checking o fazem, em resumo, sob os seguintes fundamentos: (i) não há violação à intimidade do candidato, uma vez que as consultas são públicas; (ii) direito à obtenção de certidões (art. 5º, XXXiV, da CF/88); (iii) direito à informação (art. 5º XIV, CF/88); (iv) direito à segurança e proteção de suas atividades como empresário e em relação aos clientes da empresa e; (v) poder diretivo do empregador.
Parece-nos que efetivamente a simples consulta, seja do cadastro do proteção ao crédito ou mesmo de antecedentes criminais, não tem o poder de gerar indenização por danos morais porque de fato não haveria violação à intimidade, na medida em que as informações consultadas são públicas e de livre acesso.
Aqui é importante lembrar que quase todos os concursos para preenchimento de vagas nos públicos (uma espécie, por que não dizer, de processo seletivo), exigem a apresentação da certidão de antecedentes criminais por todos os candidatos.
Uma pessoa candidata ao cargo de juiz deve apresentar sua certidão de antecedentes criminais, sendo inclusive um requisito eliminatório do concurso. Em assim sendo, se um candidato que for eliminado do concurso, exatamente por ter possuir criminais, deve ser indenizado por danos morais?
Mas não é só.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), através da sua Resolução nº 156/2012, atuando dentro da esfera da administração pública, proibiu a designação para a função de confiança, ou nomeação para cargo em comissão, de pessoa que tenha praticado crimes contra a administração pública; crimes hediondos; crimes praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando; crimes eleitorais, etc. (art. 1º da Resolução 156).
No que diz respeito à esfera privada, o CNJ, nesta mesma Resolução vedou “a manutenção, aditamento ou prorrogação de contrato de prestação de serviços com empresa que tenha entre seus empregados colocados à disposição dos Tribunais para o exercício de funções de chefia, pessoas que incidam na vedação dos arts. 1º e 2º, devendo tal condição constar expressamente dos editais de licitação.” (art. 4º, da Resolução 156)
Ora, como uma empresa que possui contrato de prestação de serviços com os Tribunais pode cumprir a exigência imposta pelo CNJ senão através da consulta de antecedentes criminais dos candidatos que serão alocados para prestar serviços a estes mesmos Tribunais?
Não nos parece razoável que o empregador ordinário, que o empresário que arrisca o seu investimento, seja apenado com a obrigação de pagar indenização por dano moral em razão de proceder o background checking,  enquanto que o Estado não apenas exige a consulta (no caso do concurso público para juiz), como também impõe essa obrigação para terceiro (no caso da Resolução 156 do CNJ). não sofra qualquer tipo de penalidade.
Isto sim, nos parece um verdadeiro tratamento discriminatório.
A verdade é que a simples exigência pelo empregador seja da certidão de antecedentes criminais, seja da consulta de restrição ao crédito, por si só, não pode ter o condão de gerar a indenização por dano moral.
Imaginemos uma empresa que, de modo claro e indiscriminado, solicita a que todos os candidatos para o preenchimento de suas vagas apresentem, previamente, seu certificado de antecedentes criminais. Imaginemos, ainda, que esta mesma empresa, trata as informações e os documentos obtidos, com a mais estrita confidencialidade.  Indagamos: onde está o dano moral?
É necessário que haja a comprovação, por parte do empregado, que a atitude do empregador o expôs publicamente e de forma negativa, bem como se mostrou desarrazoada e suficiente para gerar direito à indenização por dano moral. Se isso não ocorreu, não houve dano moral.
Para se analisar se o background checking é cabível, deve existir uma compatibilidade com as responsabilidades e atribuições do cargo a ser preenchido pelo candidato em questão.
A título de exemplo, nos parece razoável que se pretenda evitar que uma pessoa condenada por tráfico de drogas ocupe o cargo de juiz em uma vara criminal. Logo, a exigência da certidão de antecedentes criminais, inclusive como requisito eliminatório do concurso, é compatível com a responsabilidade e atribuição do cargo.
Da mesma forma, nos parece razoável e compatível com a função, a verificação de antecedentes criminais de um candidato a uma vaga para cuidar de idoso, ou criança; Neste cenário, entendemos que a creche, ou mesmo o empregador doméstico, tem elementos para descartar a contratação de alguém que tenha tido problemas criminais de maus tratos. No mesmo exemplo, talvez a eliminação do mesmo candidato, para uma vaga de operador de telemarketing não se justifique.
Também parece ser compatível com o exercício da função, a verificação junto ao serviço de proteção ao crédito de uma pessoa que postula uma vaga para operador de caixa bancário, por exemplo. Entretanto, a mesma checagem, para um operador de máquinas se mostre desnecessária.
Em conclusão, esperamos que os Ministros do Tribunal Superior do Trabalho sejam cautelosos e ponderados na formação de seu entendimento, e que este seja baseado em princípios, não em determinações binárias do tipo “pode, ou não pode”. O empresariado brasileiro já sofre dificuldades diversas na gestão de sua mão de obra. Abusos devem ser castigados, mas o estabelecimento de mais uma “proibição indiscriminada”, pode dificultar ainda mais a diminuição do desemprego no Brasil.
Importante não perder de vista um elemento fundamental de toda relação de emprego: a confiança recíproca. Exatamente para garantir a confiança recíproca entre empresa e empregado que entendemos que o background checking, realizado de maneira aberta, porém confidencial e respeitosa, é algo que resguarda o interesse de ambas as partes. Algo a ser aprimorado, mas não eliminado por si só.
[1] Art. 1o – É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.

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JOTA

Se candidato é desclassificado à vaga por antecedentes criminais, este acabará sofrendo dupla penalidade

Checagem de antecedentes gera dano moral?

Se candidato é desclassificado à vaga por antecedentes criminais, este acabará sofrendo dupla penalidade