Luciana Goulart Penteado

Victor Hanna

A 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina recentemente proferiu decisão unânime, negando indenização a passageiro de empresa aérea que alegou ter pertences subtraídos de sua bagagem, durante voo de Lisboa para Florianópolis, cujos valores somados ultrapassariam 3 mil reais. 
Segundo consta da decisão, no processo de check-in, o passageiro despachou sua bagagem sem declarar alguns itens considerados valiosos, como um anel e uma câmera fotográfica, deixando de preencher o respectivo formulário de transporte de bens. 
Em seu voto, o Relator ressaltou que a Agência Nacional de Aviação Civil orienta seus passageiros a carregarem bens de valor e objetos eletrônicos em suas malas de mão, mas, caso prefiram despachá-los com a bagagem, devem solicitar o formulário, preenchê-lo e declarar os itens no balcão de check-in. Ao final, concluiu que, caso estas regras sejam desrespeitadas, o transportador não responderá civilmente por eventuais danos.
Afinal, faz-se necessária a declaração de bens despachados para eventual ressarcimento em caso de extravio de bagagem?
Nesse ponto, surge uma batalha acirrada entre as companhias aéreas e os passageiros lesados perante o Judiciário, visto que, no campo da comprovação de danos, as companhias utilizam como argumento de defesa principalmente a alegação de que, caso o passageiro não declare os itens constantes de sua bagagem, torna-se impossível aferir e, muito menos, presumir o que nela constava, tornando-se ainda mais difícil a sua localização em caso de eventual extravio.
De acordo com o artigo 734 do Código Civil, é de responsabilidade do transportador o zelo pela bagagem e, portanto, cabe a ele responder pelos danos causados às pessoas e bagagens transportadas. Por outro lado, o artigo 927 do mesmo diploma legal é claro ao prever que os danos devem ser reparados apenas e tão somente se decorrentes de ato ilícito, argumento este também muito utilizado nas teses de defesa apresentadas pelas companhias aéreas.
É importante esclarecer que uma bagagem será considerada extraviada quando não for entregue em seu ponto de destino, devendo ser encontrada e devolvida pela empresa dentro do período máximo de 30 dias em voos domésticos e 21 dias em voos internacionais.
Nesses casos, a ANAC recomenda, em seu Guia de Orientação ao Passageiro, que este procure a empresa aérea ainda na sala de desembarque e preencha um Registro de Irregularidade de Bagagem - o RIB, como meio de formalizar uma reclamação.
Cumpre consignar que este documento é uma garantia ao passageiro, tornando-se prova irrefutável de que, após ser lesado, registrou alguma reclamação referente ao transporte de sua bagagem. Sem este documento não há como a companhia aérea ter conhecimento de que houve algum problema durante o transporte do passageiro e de sua bagagem.
Nos casos em que o prazo legal para a devolução da bagagem for ultrapassado, será devida indenização ao passageiro, cabendo a ele demonstrar e provar o seu dano efetivo, para que a reparação material possa ser realizada.
Para tanto, a Convenção de Varsóvia, da qual o Brasil é signatário, estabelece o limite de US$ 20 por quilo de bagagem extraviada em caso de voos internacionais e R$ 4.200,00 equivalentes a 1.131 DES (Direitos Especiais de Saque), em caso de voos domésticos.
Além disso, deve-se levar em consideração que, muitas vezes, os bens constantes de uma bagagem extraviada são de alta estima, ou até mesmo indispensáveis à vida do passageiro, o que pode causar angústia, sentimento de dor ou até risco à sua integridade física.
Por outro lado, cumpre destacar que o pedido de indenização por danos morais - que se tornou muito comum nos requerimentos dos passageiros - tem sido muito mais e vulgarmente utilizado como subterfúgio para a obtenção de vantagem indevida, ou seja, como compensação de meros aborrecimentos, do que legitimamente utilizado para a reparação de transtornos e consternações realmente experimentados.
Aqui, é importante esclarecer que, ao contrário do que ocorre com o dano material, no qual há a exigência de prova efetiva do prejuízo sofrido, com relação aos danos morais, apenas havendo a violação do direito de receber a bagagem intacta e no local de destino, já resta caracterizada a necessidade de reparação.
Após vasta análise da jurisprudência, destaca-se que a decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que entendeu pela necessidade da declaração de bens, é isolada e não representa o entendimento majoritário do Poder Judiciário. Apesar disso, significa uma importante decisão para as companhias aéreas, já que a necessidade de declaração de bens despachados provavelmente reduziria o número de ações das quais figuram como parte e que envolvem a discussão de tal matéria.
Importante deixar claro que o Poder Judiciário, em suas mais diversas esferas, tem se mostrado favorável ao direito do passageiro de ressarcimento por danos materiais e/ou morais sofridos em tais situações. Mas mesmo que esteja configurada a relação de consumo e mesmo diante de todas as benesses previstas no Código de Defesa do Consumidor, é fundamental a observância de algumas medidas cautelosas por parte do consumidor/passageiro, especialmente no que diz respeito à declaração de bens despachados, que poderá ser muito útil em caso de extravio de bagagem como meio de prova dos danos experimentados.
Em meio a tantas controvérsias, muitos se questionam se vale a pena a utilização das vias judiciais para dirimir questões provenientes do extravio de bagagem. Independentemente do livre convencimento dos Magistrados, certo é que o consumidor/passageiro deve analisar de forma criteriosa a sua situação específica, no intuito de pleitear eventual reparação de forma justa, ou seja, em patamar o mais próximo possível do dano suportado.
E diante desse cenário, cabe a nós, operadores do direito, a missão de informar e orientar adequadamente os nossos clientes, de modo a conscientizá-los acerca das provas necessárias e dos efeitos advindos do ajuizamento de uma ação judicial para obterem a reparação pretendida.

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JOTA

Decisão é isolada e não representa o entendimento majoritário do Poder Judiciário

TJSC muda posição sobre ressarcimento de bens despachados

Decisão é isolada e não representa o entendimento majoritário do Poder Judiciário