Fabio de Almeida Braga

“Nenhuma ‘revolução’ puramente processual é suscetível, 
por si só, de produzir na estrutura jurídico-social, modificações definitivas.” 
(José Carlos Barbosa Moreira)
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A atividade jurisdicional dá ao juiz, basicamente, o monopólio do exercício do poder de decidir, representando o Estado na resolução de conflitos de interesse qualificados por pretensões resistidas, levados ao conhecimento do Poder Judiciário. 
O exercício do poder de decidir traz, assim, a ideia inicial e formalista de que a sua realização como ato de autoridade estará legitimada à medida em que forem sendo cumpridos todos os preceitos listados pela legislação processual, em respeito reverencial ao iter do receituário processual, garantindo-se, desse modo, a legalidade das ordens e medidas emanadas pelo órgão judicante.
Esse poder de decidir encerra, doutrinariamente, a classificação dos poderes afetos ao juiz em poderes jurisdicionais e poderes de polícia, sendo que, dentre os primeiros se encontram os relativos à formação e ao regular desenvolvimento do processo, à instrução processual e à resolução da lide, enquanto dentre os segundos, os poderes de polícia, encontram-se aqueles relativos à ordem e ao equilíbrio entre os litigantes. 
Essa classificação doutrinária é objetiva e era calcada essencialmente na positividade da legislação processual civil que vigorou até o recente advento da Lei 13.105/2015, e, por isso, não contempla uma terceira categoria de poderes, os discricionários.
Com a entrada em vigor do novo ordenamento processual civil, os poderes, deveres e responsabilidades do juiz, até então contemplados entre os artigos 125 e 133 do Código de 1973, passaram a estar ampliados para abarcar também certos atos de claro teor discricionário, cuja decretação e garantia de execução ficam a critério do próprio juiz exator. Talvez caiba aqui a lembrança de que essa discricionariedade estará sempre limitada pelos lindes da norma jurídica que asseguram aos atores processuais a prevalência de seus direitos e garantias fundamentais, conforme ditados pelo ordenamento constitucional, sob pena de a discricionariedade desbordar para o odioso terreno da arbitrariedade.
Exemplo dessa discricionariedade vem estampado no inciso IV do artigo 139 da nova lei civil adjetiva, segundo o qual, “O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe (...) determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais, sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.”.
A regra contida na parte final do inciso IV transcrito traz possibilidades processuais não previstas nas regras anteriores, abrindo espaço para a decretação de medidas destinadas a dar verdadeira eficácia ao processo de execução de natureza pecuniária.
Essa nova norma outorga ao órgão judicante o poder-dever de atuar em prol da efetividade processual, passando também a buscar a garantia dos aspectos práticos da providência jurisdicional reclamada contra o devedor que não tenha satisfeito a obrigação certa, líquida e exigível consubstanciada em um título executivo levado ao juízo da execução.
Em termos práticos, passou o juiz a não mais estar jungido a medidas até então tipificadamente constantes da lei processual. Com isso, passou a sua discricionariedade determinar, ex officio ou sob provocação, medidas atípicas, desde que justificadas pelo cumprimento pleno da ordem que torna concreto ao credor alcançar o objeto da prestação pedida na ação executiva: o efetivo recebimento do crédito insatisfeito voluntariamente pelo devedor executado.
A nova regra contida no inciso IV acima transcrito vem atender a premente necessidade de se pôr cobro à prática instaurada pelo devedor contumaz no dia-a-dia das relações de crédito de evitar a qualquer custo a satisfação de sua obrigação de pagar a dívida constituída, valendo-se de ardis e mecanismos de blindagem de bens, direitos e ativos financeiros para dificultar e inviabilizar, diretamente, a atuação jurisdicional e, indiretamente, os justos esforços do credor na recuperação de seu crédito. 
Nada obstante, há que se aplicar a nova regra processual com a devida parcimônia, haja vista o dever de o juiz pautar os seus atos decisórios por critérios que não deem azo ao surgimento de medidas de exceção contrárias aos direitos fundamentais do executado, como no caso da impossibilidade de adoção de medidas de privação de sua liberdade física.
Certo é que qualquer medida de caráter indutivo e coercitivo, destinada a assegurar o cumprimento de decisão judicial em ação de prestação pecuniária, será atípica e deverá encontrar ensejo no concerto processual somente após a execução de medidas ordinárias de cumprimento da ordem de cobrança e pagamento. Exemplo disso se dá quando o devedor executado oculta-se ou dificulta a identificação de seus ativos, através de mecanismos de blindagem patrimonial, frustrando a expectativa de recuperação do crédito perseguido em juízo.
O processo só será eficaz se, dentre os fatores de que se pode valer o exequente para a identificação do patrimônio do devedor, puderem ser utilizados elementos que, material e coercitivamente, garantam uma atitude de cumprimento e satisfação da obrigação por parte do devedor, devendo, em qualquer caso, existir uma proporcionalidade entre a situação processual concreta e a medida constritiva que se puser em curso. Assim, como limite objetivo a ser observado pelo juízo está a regra do artigo 805 do novo Código de Processo Civil, segundo a qual “quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.”.
Eis neste ponto mais outra novidade processual trazida pela atual lei processual. Como parágrafo único ao citado artigo 805, o legislador fez inserir no texto legal a previsão de que “ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados.”.
A novidade deste dispositivo contido no parágrafo único do artigo 805, quando em comparação com o artigo 620 da lei processual revogada, está no acréscimo da regra de que, ao opor-se à concretização da ordem executiva que julga ser onerosa a ponto de ser mais gravosa, assume o devedor executado o dever de indicar medidas que a substituam com maior grau de efetividade no sentido de conduzirem à concretização do cumprimento da obrigação pecuniária. Em outros termos, neste caso terá o devedor executado assumido o encargo de propor e cumprir medidas alternativas que sejam, a um só tempo, mais eficazes e menos onerosas. 
De qualquer forma, o que se vê a toda evidência é que a norma processual tem por meta promover a satisfação da tutela da jurisdição já concedida, seja mediante a aplicação de medidas calcadas no artigo 139, IV, seja por alternativa oferecida pelo próprio devedor que se opuser à alegada onerosidade de execução inicialmente proposta pelo credor e materializada pelo juízo da execução, com a grande vantagem de que, neste caso, a proporcionalidade e a razoabilidade da medida ao final resultante em satisfação da obrigação pecuniária terão sido respeitadas. Assim, não poderá o devedor valer-se do potencial argumento de ausência de respeito a suas prerrogativas e garantias de defesa como fundamento para alegações de aparente atentado a seus direitos fundamentais de executado, diminuindo-se, destarte, o risco de o próprio processo ser usado como base de apoio para a infindável sucessão de atos de eternização processual e de esquiva do dever de pagamento.
Em conclusão, parece-nos que a aplicação do artigo 139, IV, do atual código processual civil, com a determinação pelo juízo da execução de medidas que garantam a eficácia da ordem que conduz, direta ou indiretamente, à conclusão de que a obrigação seja paga, deve ser considerada em situações em que os seguintes elementos estejam reconhecidamente demonstrados nos autos da execução:
<ul>
<li>o processo de execução deve ter permanecido em tramitação por período excessivo e irrazoável sem qualquer proveito concreto na direção de que o pagamento tenha sido sequer parcialmente realizado;</li>
<li>tenha o credor exequente requerido e cumprido todas as medidas executivas ordinariamente cabíveis para a espécie sem qualquer utilidade concreta alcançada;</li>
<li>esteja caracterizada continuada inércia do executado em promover atos que indiquem perspectiva de pagamento, inclusive indicação de bens à penhora ou proposta de pagamento e</li>
<li>haja sido documentado evidente descumprimento de ordens judiciais destinadas à satisfação da dívida, além da presença comprovada de atos de proteção indevida ou mesmo de evidente busca de ocultação de patrimônio do devedor, em claro movimento tendente à caracterização das hipóteses de fraude à execução.</li>
</ul>

Law concept

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JOTA

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