Ana Carolina Reis do Valle Monteiro

Leonardo Mesquita Zampolli

Inicialmente, impõe-se destacar que os interesses dos credores não são os únicos a serem afetados diante da crise do empresário devedor e que, para a superação da crise, a preservação da atividade empresarial é requisito essencial basilar que se orienta como fundamento precípuo na <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm">Lei 11.101/2005</a>.
Essa preservação da atividade empresarial, em benefício de todos os envolvidos, foi estruturada por meio de determinados sistemas, cujos principais são a recuperação e a falência.
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias"><img class="aligncenter cta-tributos size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/cta-jota-pro-tributos.png" width="688" height="688" /></a>
Diante de uma crise econômico-financeira temporária e reversível, permitiu-se ao empresário devedor, por meio do instituto da recuperação, negociar com os seus credores uma solução comum para a superação da crise que desafiava a atividade. A preservação da atividade empresarial viável sob a condução do empresário, orientada por um plano de recuperação judicial negociado com os credores, poderia resultar na maior satisfação de todos os interessados.
Todavia, passados 15 anos de vigência da lei, tais objetivos não foram alcançados de forma satisfatória. Em estudo realizado pelo Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre Insolvência da PUC-SP (NEPI), em parceria com a Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ)<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, foi demonstrado que, apesar de 72,1% dos planos de recuperação judicial terem sido aprovados pela Assembleia Geral de Credores, apenas 18,2% dos processos de recuperação judicial conseguiram ser encerrados sem a decretação da falência pelo cumprimento das obrigações vencidas nos dois primeiros anos, ainda que o plano mediano de pagamento das obrigações quirografárias seja de aproximadamente dez anos.
Diante dessas estatísticas frustrantes, o que se verificou no caso do Grupo OAS foi uma tentativa – bem-sucedida em termos meramente processuais – de reverter essa estatística, encerrando prematuramente uma recuperação judicial cujos pagamentos já não estão sendo cumpridos e tampouco comprovados pela recuperanda através dos Relatórios Mensais de Atividades (RMAs).
Consultado sobre um possível encerramento da recuperação judicial, o administrador judicial alertou o juízo<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> sobre a insuficiência de valores depositados para pagamento dos credores trabalhistas. Ainda, em se tratando de outras classes, mais de 45 credores distintos se manifestaram alegando o atraso ou não cumprimento das parcelas pela recuperanda.<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>
Não obstante, à revelia dos credores, a recuperação judicial do Grupo OAS teve o seu encerramento decretado em 3 de março de 2020 pelo referido Juízo da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo, tendo sido confirmado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em 10 de agosto de 2021.
Só que, em menos de cinco anos, conforme determina o prazo legal (art. 48, II, Lei nº 11.101/2005) a Coesa S.A., controladora do grupo, não apenas adquiriu diversas sociedades, dentre elas as requerentes, integrantes do Grupo OAS (hoje Grupo Metha), como ajuizou em 15 de outubro de 2021 pedido de recuperação judicial, em manifesta violação ao artigo acima mencionado, trazendo para a recuperação todos os créditos não pagos na recuperação judicial da OAS, que por força de Lei, in casu, extraconcursais, pois protegidos pela coisa julgada.
Conforme a relação de credores apresentada pelo Grupo Coesa<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a> em sua recuperação judicial, nada menos que 873 dos créditos listados são provenientes do passivo do Grupo OAS, que já estavam anteriormente sujeitos aos efeitos da recuperação judicial recentemente encerrada.
Vale ressaltar que a recuperação judicial do Grupo Coesa abarca sete sociedades distintas, sendo certo que uma delas se refere ao passivo recentemente adquirido do Grupo OAS. Além de outras inúmeras irregularidades que podem ser apontadas no caso, este breve artigo tem como principal objetivo trazer as ponderações acima apontadas, bem como questionar se houve, de fato, um encerramento prematuro da recuperação do Grupo OAS, ou se houve uma manobra solerte de um grupo de empresas para tentar não pagar seus credores, arrastando-os para a via crucis de uma nova recuperação judicial e todos os sacrifícios que tal processo lhes impõem.
Seja como for, a saída é simples, e o administrador judicial já indicado, assim como o Poder Judiciário, certamente farão o seu papel em separar os créditos evidentemente extraconcursais do bojo da errática lista de credores apresentada pelas recuperandas neste caso absolutamente atípico aparentemente eivado de ilegalidades.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> <a href="https://abj.org.br/cases/2a-fase-observatorio-da-insolvencia/">https://abj.org.br/cases/2a-fase-observatorio-da-insolvencia/</a>
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Recuperação Judicial do Grupo OAS, processo nº 1030812-77.2015.8.26.0100, fls. 69192/69194.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Recuperação Judicial do Grupo OAS, processo nº 1030812-77.2015.8.26.0100, fls. 69195.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Recuperação Judicial do Grupo Coesa, processo nº 1111746-12.2021.8.26.0100, fls. 786/892

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Recuperação judicial do Grupo Coesa abarca sete sociedades distintas, entre elas o passivo adquirido da OAS

Caso Coesa: manobra solerte ou encerramento prematuro da recuperação da OAS?

Recuperação judicial do Grupo Coesa abarca sete sociedades distintas, entre elas o passivo adquirido da OAS