Jean Paul Prates

No futuro, a desastrada operação de venda do braço da aviação civil da Embraer à norte-americana Boeing será estudada como exemplo pronto e acabado dos deletérios resultados da leviandade liberal.
Anunciada em 2017 como “o maior negócio da indústria aeronáutica brasileira”, a operação privava o Brasil da capacidade de disputar o mercado altamente lucrativo — e grande gerador de empregos qualificados — da fabricação de aeronaves para a aviação civil regional.
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Essa mutilação da infraestrutura nacional não foi barrada pelos nossos órgão de controle, mas está sendo revertida pela decisão unilateral da Boeing, que anunciou o cancelamento do negócio, no final de abril, sob a frágil argumentação de que a empresa nacional teria faltado com obrigações contratuais para executar a separação da linha de aviões regionais adquirida pela ex-gigante norte-americana.
A  Embraer retruca e cobra que a Boeing pague o preço da compra: US$ 4,2 bilhões (cerca de R$ 23 bilhões).
A verdade é que a Boeing pretendeu engolir a lucrativa linha de fabricação de aeronaves regionais da Embraer quando já não podia sequer mastigar o que tinha em seu prato.
A Boeing está à beira da insolvência. Boa parte dessa situação se deve ao fracasso de seu modelo de avião 737 Max, uma aposta infeliz da empresa, cuja fabricação foi suspensa após dois acidentes aéreos com mais de 300 vítimas fatais.
Com o 737 Max proibido de voar, as encomendas à Boeing despencaram e as desistências aumentaram. No último mês de janeiro, a empresa não recebeu uma encomenda sequer, fato inédito desde 1962.
<blockquote class="jota-article__eye">A paralisia do setor aéreo decorrente da pandemia do coronavírus é, para a Boeing, apenas o coice após a queda.</blockquote>
O desmanche do negócio Embraer-Boeing não é mais um imbróglio em um negócio desastrado desde a origem — e estou entre os que denunciaram seu caráter lesivo aos interesses brasileiros desde o início.
Não era preciso bola de cristal, bastava uma análise criteriosa e desapaixonada do setor de infraestrutura, da indústria aeronáutica e do setor de aviação para perceber o que uma decisão monocrática do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) não teve a capacidade de barrar: a entrega de uma empresa estratégica para o Brasil feria profundamente os interesses do país.
E foi com essa certeza que recorri ao CADE, solicitando uma manifestação do pleno daquele conselho, e apresentei um requerimento à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado para que encampasse esse pleito.
<blockquote class="jota-article__eye">É lamentável que agora tenhamos que enfrentar as consequências de um desastre totalmente previsível, resultado da imprudência e da voracidade liberal em entregar segmentos fundamentais da infraestrutura nacional a interesses externos.</blockquote>
A Embraer custou muito dinheiro ao Estado brasileiro para ser construída. Foi uma estatal de aviação, posteriormente privatizada e agora vendida na bacia das almas à sua principal concorrente.
Apresentei um projeto de lei tornando obrigatório que transações com essa dimensão estratégica devam ser referendadas pelo plenário do Conselho Administrativo de Defesa Econômica e não por decisões de um único conselheiro.
Meu companheiro de bancada, senador Jaques Wagner (PT-BA), é autor de projeto autorizando o governo federal a adquirir o controle acionário da Embraer, iniciativa que conta com todo o meu apoio e empenho.
Não se pode impedir o desejo entreguista, mas Estado e legislação existem para impedir que essas vontades se materializem. Se há uma lição a ser retirada dessa cadeia de equívocos é a urgência em amadurecer nossas instituições de controle para que operações de fusões e aquisições dessa natureza sejam submetidas a rigorosa regulação.

embraer

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JOTA

A entrega de uma empresa estratégica para o Brasil feria profundamente os interesses do país

Caso Embraer alerta para urgência de amadurecimento das instituições de controle

A entrega de uma empresa estratégica para o Brasil feria profundamente os interesses do país