Bianca Xavier

O Conselho Pleno do Conselho de Contribuintes do Estado do Rio de Janeiro, por maioria de votos, cancelou as multas decorrentes da não apresentação de arquivos magnéticos, desde que o contribuinte não tenha sido intimado para cumprir tal obrigação acessória.<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>
A decisão se baseia na aplicação da regra interpretativa denominada abolitio criminis, ou seja, a maioria dos conselheiros entendeu que a infração prevista na legislação de ICMS de 1996 que previa multa pela mera não entrega dos arquivos magnéticos foi excluída pela legislação superveniente, qual seja, a Lei 6.357 de 2012.
Acrescente-se, ainda, que o Código Tributário Nacional, especificamente o artigo 106, inciso II, prevê que deve ser aplicada a lei menos severa que disponha sobre penalidades ou que afaste a infração tributária propriamente dita, retroagindo os efeitos da lei nova sobre fatos pretéritos, o que se convencionou chamar de retroatividade benigna.
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Em outras palavras, ainda que os contribuintes tenham deixado de apresentar os arquivos magnéticos antes da lei modificativa de 2012, e, portanto, ainda que tenham praticado a infração quando não havia qualquer dúvida quanto aplicação da multa prevista lei, ainda assim, a multa deverá ser cancelada pois com a edição da nova lei restou afastado o caráter lesivo da conduta, sendo pouco razoável que alguém responda penalmente por uma conduta que o ordenamento jurídico não reconhece sua ilicitude.
Nesse contexto, a nova lei se aplica a todos os processos pendentes de julgamento.
A lógica da retroatividade benigna aplicável às infrações tributárias pode ser melhor entendida se utilizarmos exemplos do Direito Penal.
Imaginemos que uma determinada pessoa tenha traído sua esposa em 2004. Segundo o Código Penal, vigente à época da conduta praticada, essa pessoa estaria sujeita a pena de detenção de 15 dias a seis meses.
Ocorre que em 2005 a lei 11.106 deixou de caracterizar como crime o adultério. Dessa forma, é possível afirmar que o ordenamento jurídico não considera um ato penalmente relevante a traição matrimonial, sendo, contudo, um ilícito civil.
Se o ordenamento jurídico afasta o potencial ofensivo decorrente da traição matrimonial, qual sentido teria a condenação nos dias de hoje de pessoas que praticaram o crime antes de 2005? Se a conduta não é mais considerada grave, e, portanto, se tornou atípica, deve-se absolver os réus que respondem processos por esse crime, bem como, cassar a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
A mesma lógica pode ser aplicada, com temperamentos, às infrações tributárias. Se o descumprimento de determinada obrigação acessória não é mais impactante para a administração tributária, e, portanto, a multa decorrente desse descumprimento foi excluída ou reduzida, deverá ser aplicada a nova norma imediatamente as situações ainda pendentes de julgamento, adequando, por conseguinte, a nova sanção a conduta do contribuinte.
Nesse cenário, o que foi debatido no tribunal administrativo é a legalidade da cobrança de multa por descumprimento de obrigação acessória, sem a prévia intimação do contribuinte para praticar o ato omisso, partindo da comparação do texto da legislação atual com o texto anterior.
Essa discussão, vale ressaltar, está calcada na interpretação da legislação do Estado do Rio de Janeiro, pois a imposição de penalidade pressupõe a tipicidade desenhada pelo legislador.
No que se refere à imposição de multas, a Lei 2.657 de 1996 dedicou o capítulo XII, notadamente os artigos 57 a 71, para disciplinar a mora e as penalidades decorrentes do não pagamento do ICMS e das obrigações acessórias previstas em lei.
O artigo 59, na sua redação original, fixava as multas pelo não pagamento de obrigação acessória e da obrigação principal podendo variar, a depender da situação fática, nos percentuais de 30% a 120% do valor do imposto devido. Dentre as multas previstas havia expressa menção de aplicação de sanção pecuniária para os contribuintes que não mantivessem seus arquivos digitais.
Com a implementação do SPED e a modernização das obrigações acessórias se tornou necessária a criação de novos tipos penais para refletir essa nova realidade.
Em 2008 a Lei 5.356 de 2008 alterou as penalidades para refletir a nova dinâmica fiscal, aplicando percentuais escalonados de multa equivalente a 0,25% a 1,5% sobre os valores das operações realizadas quando não forem entregues os arquivos magnéticos
O escalonamento trazido pela Lei 5.356 de 2008 estava ligado diretamente ao valor das saídas dos contribuintes, quando maior o valor das saídas, maior o percentual de multa aplicável.
Em 2012, a Lei 6.357 de 2012 novamente alterou a sistemática das penalidades da Lei 2.657 de 1996, realizando uma verdadeira revisão de todas as penalidades do ICMS, além de organizar melhor as condutas a serem penalizadas e, no tocante a infração decorrente da não entrega de informações e declarações, passou dosar a penalidade nos percentuais de 0,25% a 1% de acordo com o número de intimações recebidas pelo contribuinte até o cumprimento da obrigação.
Se o contribuinte cumprir a obrigação antes da intimação, receberá multa de 1.000 UFIR, caso cumpra após a 1ª intimação será aplicada multa no percentual de 0,25%, e assim os percentuais irão subir de acordo com a 2ª e 3ª intimações chegando ao patamar máximo de 1%.
O Conselho de Contribuintes majoritariamente decidiu que só haverá penalidade se houver intimação do contribuinte para a realização da entrega dos arquivos magnéticos em razão da legislação atualmente vigente. Sem intimação estamos diante de um ato atípico, e, por consequência, sem penalidade.
Essa intepretação está alinhada, inclusive, com a nova forma de relacionamento que se deseja estabelecer entre o contribuinte e a administração tributária. A administração pública deve orientar e apontar os erros cometidos pelos contribuintes, atuando de forma pedagógica e escalonada, punindo aqueles que deliberadamente não cumprem suas obrigações e guiando os contribuintes que, por erro ou desconhecimento, não cumprem as exigências tributárias principais e acessórias.
Aliás, o projeto de lei que deu azo ao novo texto legal foi claro na exposição de motivos sobre essa nova forma de relacionamento entre o contribuinte e o fisco. No item 02 da justificativa do projeto de lei afastou-se a premissa de que a lei tributária deve adotar como pressuposto que o contribuinte é sonegador por excelência.
Aponta a justificativa em sentido diametralmente oposto, ou seja, que as sanções devem ser desenhadas tomando como base atender ao contribuinte comum, que se presume bem intencionado, traduzindo tal premissa na fixação de multas essencialmente educativas e minimamente punitivas, permitindo-se, sempre, a autorregularização.<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Disponível em: &lt;<a href="http://www.fazenda.rj.gov.br/sefaz/content/conn/UCMServer/uuid/dDocName%3aWCC42000011866">http://www.fazenda.rj.gov.br/sefaz/content/conn/UCMServer/uuid/dDocName%3aWCC42000011866</a>&gt;.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Disponível em: &lt;<a href="http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/scpro1115.nsf/1061f759d97a6b24832566ec0018d832/0dd6164a0a1ccc2b83257abf005e31ec?OpenDocument">http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/scpro1115.nsf/1061f759d97a6b24832566ec0018d832/0dd6164a0a1ccc2b83257abf005e31ec?OpenDocument</a>&gt;.

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JOTA

Conselho de Contribuintes do Rio de Janeiro cancelou multas pela não apresentação de arquivos magnéticos

Cancelamento de multa pelo não envio de documentos fiscais

O Conselho Pleno do Conselho de Contribuintes do Rio de Janeiro cancelou multa aplicada pela não apresentação de arquivos magnéticos.