Alvaro de Azevedo Gonzaga

Preliminarmente assentamos que o Exame de Ordem é uma prova necessária, uma avaliação que poderia ser refletida, ser aplicada em outras áreas inclusive, mas que merece a devida reflexão dos pares de cada profissão. Posto isso, defender a realização de tal prova não implica em deixar de criticar seus problemas, erros ou contradições.
Aqui buscamos apontar falhas na última aplicação da 1ª Fase do XXIII Exame de Ordem que merece atenção e, também, críticas. O fato: A prova cobrou apenas 8 questões de Ética, em vez de 10 questões, como ocorre desde de 2013, sendo que antes disso, eram cobradas 12 questões.
Ao eleger Ética como a principal disciplina da 1ª Fase, a OAB cobrava um grande domínio da área para os seus futuros quadros. A necessidade de priorizar Ética nessa etapa da seleção incentivava os candidatos a estudarem essa parte do currículo, área tantas vezes secundarizada em algumas faculdades e, até mesmo, pelos alunos durante a graduação.
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Os temas priorizados pela banca da OAB/FGV costumam ser acertados no que se espera da profissão de um advogado, como Direitos e Deveres do Advogado e Infrações Disciplinares, a fim de verificar se este sabe o que pode fazer; publicidade, incompatibilidade e impedimento com a advocacia (quando pode atuar e quando jamais poderá fazê-lo).
Hodiernamente o debate sobre ética permeia matizes em vários âmbitos. No debate político, por exemplo, exige-se ética. Na sociedade como um todo, a ética é necessária para assentar a democracia tão querida e necessária em nosso país. A OAB, sem aqui querer embargar sua postura (pois tal tema mereceria extensa análise), lança diversos manifestos pela ética em várias esferas, em especial na política. Talvez esse seja o momento em que a OAB mais pediu ética em toda sua história fora de seus muros, mas nesta prova, dentro de seus muros, reduziu a ética em uma postura paradoxal ao que se posiciona; em um adágio popular: “Faça o que eu digo, mas não o que eu faço”, mostra que temos uma preocupante situação dentro da instituição.
Se a mudança se mantiver para as próximas edições, o recado da Ordem para os futuros advogados é que a Ética agora, é menos importante do que era antes. Soa absurdo, mas é o que simboliza tal atitude! As seccionais irão receber advogados que conhecem menos as suas atribuições e prerrogativas. E mais, vem se cobrando a postura ética dos advogados diante da profissão e para com a sociedade, e como se mostra, parece que caminhamos com essa atitude em rumos inversos do que se espera.
Além da questão teórico-político, que a mim parece a mais grave, a mudança prejudicou objetivamente muitos candidatos. A Anpac (Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos), que reúne diversos cursos preparatórios, avalia que o XXIII Exame de Ordem deve bater recorde de reprovações: estima-se que mais de 80% do total de 115 mil inscritos não conseguiram a classificação para a 2ª Fase. O preocupante é que tal dado possa ser dessa monta por causa dessas alterações, isso porque a maior concentração dos candidatos varia suas notas entre 38 e 42 pontos segundo o relatório OAB em Números.
Ainda não recebi da presidência da OAB Federal nenhuma manifestação a respeito do motivo da redução de sua ética. Foi apresentada apenas uma nota da Comissão do Exame de Ordem, estritamente legalista, no sentido que a redução da ética na OAB está de acordo com o edital. Isso porque o item “3.4.1.1” diz que “A prova objetiva conterá, no mínimo, 15% (quinze por cento) de questões versando sobre Estatuto da Advocacia e da OAB e seu Regulamento Geral, Código de Ética e Disciplina, Direitos Humanos e Filosofia do Direito.”
Tal percentual foi respeitado. Porém, a alteração ter acontecido sem um aviso prévio, e ter reduzido em 20% as questões de Ética Profissional (de 10 para 8 questões), prejudicou muitos candidatos que estudam e se preparam pela proporcionalidade das questões que habitualmente são aplicadas. Num processo que envolve tantas pessoas, apresentar uma mudança desse porte sem aviso prévio, nos leva a questionar a transparência da seleção. Isso porque alunos que, em condições normais, teriam se classificado para a 2ª Fase, foram reprovados. Essa é uma situação desarrazoada e muito grave.
Se a questão fosse meramente editalícia e não buscássemos ser razoáveis, as próximas provas poderiam cobrar 10 questões de filosofia, 1 de Direitos Humanos e 1 de Ética Profissional. Embora seja professor de Filosofia, penso que tal matéria deveria ser cobrada de outra maneira no Exame.
Como mencionado no início do texto, defendo a obrigatoriedade do Exame. Porém, rejeito ideias e o senso comum que diz que só alunos despreparados não passam, que a prova é fácil ou que quem é reprovado não tem condição de ser advogado.  O Exame de Ordem tem se tornado cada vez mais exigente, mais complexo e, mesmo aqueles formados nas melhores e mais tradicionais faculdades, mudam sua rotina de estudos para a prova.
Por isso, frente a um desafio desse porte, os alunos elaboram um planejamento de estudos voltados para a prova, sem eventuais surpresas na sua elaboração. Alguns focam em determinadas disciplinas, estudam, proporcionalmente, menos outras matérias, focam na parte mais teórica ou nas processuais, priorizam a matéria da 2ª Fase. Mas tudo dentro de um padrão que vem sendo elaborado e que se espera da prova da OAB, consolidado desde 2013, e que se por ventura viesse a ser alterado, que fosse mediante aviso prévio para que assim os candidatos pudessem se preparar.
São várias as abordagens de estudo. Porém, qualquer um que se prepara para a 1ª Fase, foca em Ética, e com isso a OAB conseguia o que esperava: ter novos advogados conhecedores do regramento ético-profissional. Contudo, ao reduzir o número de questões de ética, além de gerar insegurança sobre as futuras provas e o número de questões, a OAB gera, uma crise em sua própria prova.
A mudança não foi apenas em ética, foi em Direito Ambiental também. Eram duas questões e agora apenas uma. Fica aqui mais uma instabilidade no exame a ser apontada.
Certo estou que a redução de questões de ética mostra uma tomada de posição paradoxal da OAB. Não bastasse isso, a ausência de transparência prejudicou diretamente todos os candidatos, mesmo aqueles que conseguiram a aprovação na 1ª Fase. A prova foi criada para selecionar os bacharéis aptos a exercerem a advocacia, não para ganhar a pecha de uma prova “pegadinha”, recheada de “surpresas” e que não cumpre com o seu objetivo precípuo; o de selecionar advogados éticos.

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JOTA

Ou a aplicação prática do adágio façam o que eu digo, mas não o que eu faço

Cadê a ética da OAB?

Ou a aplicação prática do adágio façam o que eu digo, mas não o que eu faço