O Deputado Federal Jair Bolsonaro é um fornecedor incansável de exemplos, por vezes caricaturais, da tensão que a liberdade de expressão e a inviolabilidade parlamentar estabelecem com outros elementos constitucionais, como a proteção à honra e a vedação do preconceito. O mais recente tem suscitado reações particularmente inflamadas, dentro e fora do Congresso Nacional.

O fato é dos mais lamentáveis: ocupando a Tribuna da Câmara para criticar a Comissão Nacional da Verdade e o Dia Nacional dos Direitos Humanos, S. Exa. decidiu requentar uma polêmica antiga e dizer que não estupraria a Deputada Maria do Rosário porque ela não mereceria. A fala já havia sido proferida em acalorada discussão entre os dois envolvidos, também nas dependências da Casa Legislativa, acerca da redução da maioridade penal, defendida por Bolsonaro. Na ocasião, o Deputado afirmou estar respondendo, de forma jocosa, à acusação de que seria um estuprador, vinda da interlocutora. Posteriormente, em entrevista a um jornal, reiterou a explicação e acrescentou o esclarecimento de que, caso fosse um estuprador, não escolheria a colega como vítima por razões estéticas. Difícil piorar.

O episódio atual levou quatro partidos a pedirem a cassação do mandato do Deputado, por quebra de decoro parlamentar. Em outro plano de responsabilização, o Ministério Público Federal acaba de oferecer denúncia perante o STF, alegando que a fala em questão seria uma forma de incitação ao estupro, banalizando o crime e dando a entender que determinadas mulheres poderiam merecer a violência. Todo esse imbróglio tem repercutido intensamente nas redes sociais, com inúmeras manifestações de apoio e repúdio a ambos os envolvidos. Correndo o risco de desagradar amigos queridos, e agradar outros tantos pelo motivo errado, o presente artigo sustenta que a hipótese não é de cassação do mandato parlamentar e tampouco de crime – salvo contra o bom senso e a elegância, insuscetíveis de condenação penal.

O Deputado Jair Bolsonaro representa bandeiras de que discordo, de uma forma agressiva que igualmente me desagrada. A bem da verdade, acho que ele presta um desserviço às próprias causas que defende, reduzindo a credibilidade que poderiam ter e criando uma barreira para o eventual convencimento de pessoas moderadas. É uma boa estratégia para criar e fidelizar um nicho eleitoral, mas contribui muito pouco para o debate público. A título de exemplo, retomando a origem do pronunciamento polêmico, tal postura raivosa estigmatizou a discussão quanto às propostas de redução da maioridade penal no Brasil, que ficaram associadas a um discurso ostensivamente contrário à proteção dos direitos humanos – ou à proteção dos direitos de determinados humanos, o que é rigorosamente a mesma coisa. Embora pessoalmente discorde da redução, não acho que o marco de dezoito anos seja uma cláusula pétrea e admita que muitos outros países, reconhecidamente comprometidos com os direitos fundamentais, fizeram a opção por idades menores. Esse seria um debate sério, não fosse a carnavalização do tema.

Feito o registro, o que me leva a defender a impossibilidade de responsabilização do Deputado é o respeito à Constituição, segundo a qual os membros do Congresso Nacional são “invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos” [1]. Trata-se da chamada imunidade material, que afasta a própria ilicitude das manifestações proferidas no exercício do mandato. A jurisprudência do STF protege tal imunidade com energia, especialmente em relação a discursos e falas proferidos no interior das Casas Legislativas. Mesmo em ambiente externo, porém, a relativização da imunidade é incomum, sendo reservada aos casos em que inexista qualquer conexão razoável entre a manifestação e o exercício da função pública[2].

O fundamento da imunidade material, presente nas constituições de diversos países [3], é inequívoco. Cuida-se de garantir que os parlamentares tenham liberdade quase irrestrita para vocalizar suas opiniões, e, com isso, desempenhar a função representativa para a qual foram eleitos. O risco de responsabilização, civil ou penal, poderia podar tal função e/ou abrir espaço para um indesejável controle de conteúdo por parte do Judiciário, especialmente perigoso em terreno tão sensível quanto a definição da fronteira entre grosseria e ilicitude.

Tais considerações parecem suficientes para tornar inviável o recebimento da denúncia oferecida contra o Deputado Bolsonaro, acima referida. Ainda mais por se tratar de declarações emitidas na Câmara dos Deputados, sendo a mais recente em plena Tribuna da Casa. É claro que se poderia argumentar com a inexistência de direitos absolutos e com a necessidade de ponderar a imunidade com outros elementos constitucionais. Em casos realmente extremos, essa linha de argumentação não poderia ser desconsiderada de plano. Não me parece, contudo, que seja esse o caso. Embora brutal, a fala do Deputado não defende que se cometam estupros e, aliás, foi proferida originalmente em contexto no qual defendia o recrudescimento da resposta penal para esse e outros crimes.

Ainda que se queira especular possíveis conteúdos subentendidos no discurso – como a sugestão de que algumas mulheres, por seu comportamento, poderiam merecer ou induzir a violência sexual –, seria pouco consistente pretender afastar a imunidade com base em inferências. A inviolabilidade parlamentar ficaria muito fragilizada caso se abrisse espaço para esse tipo de avaliação, dando margem a que juízos subjetivos possam desempenhar um papel determinante no cerceamento dos debates. A ânsia de responsabilizar determinado político, mesmo que motivada por um histórico conturbado, não justifica o custo elevado representado pelo enfraquecimento de importantes garantias institucionais.

A possível perda do mandato por decisão da própria Câmara dos Deputados suscita discussões mais complexas. A Constituição prevê a cassação por quebra do decoro parlamentar no seu art. 55, inciso II [4]. O § 1° do mesmo dispositivo trata genericamente da matéria, nos seguintes termos: “É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas”. Em tese, portanto, o abuso da imunidade material poderia ser um fundamento possível para um juízo político de cassação, uma espécie de repúdio da Casa Legislativa ao comportamento gravemente inapropriado de um dos seus integrantes.

Essa linha encontra paralelo, por exemplo, na Lei Fundamental alemã, que protege os discursos parlamentares e impede a responsabilização por órgãos diversos do próprio Parlamento [5]. Atribuir essa competência ao Poder Legislativo é uma forma de manter a questão interna corporis, depositando a responsabilidade de julgamento em pessoas que também foram escolhidas por voto popular e cuja recondução dependerá de novas eleições. Em tese, portanto, eventual perseguição estaria submetida a controle social, conectando toda a discussão ao processo político de definição e avaliação dos representantes eleitos.

Confirmando essa lógica, o STF tem sido plenamente deferente às decisões legislativas que concluíram pela quebra de decoro. No caso mais célebre, envolvendo o então Deputado José Dirceu, o Tribunal considerou viável a cassação do seu mandato por condutas praticadas no exercício de cargo no Poder Executivo – fora, portanto, da função parlamentar [6]. Por outro lado, no processo de cassação do então Senador Demóstenes Torres, chegou a ser suscitado o argumento de que mentir na Tribuna poderia justificar a perda do mandato, o que acabou se diluindo em outras imputações objetivamente mais graves. Na prática, esses e outros exemplos apontam que as Casas Legislativas dispõem de uma grande margem para preencher, politicamente, o conteúdo do conceito de decoro.

Ainda assim, talvez se pudesse cogitar da possibilidade de controle jurisdicional sobre possíveis desvios manifestos da Câmara ou do Senado, notadamente para evitar que blocos majoritários possam se livrar de opositores inconvenientes. A proteção das minorias parlamentares é condição indispensável para a autenticidade do sistema representativo e, por extensão, do regime democrático. O ponto tem sido enfatizado pelo STF, em diversas ocasiões e contextos, inclusive para garantir a instalação de comissões parlamentares de inquérito ameaçadas por tentativas de obstrução interna [7].

Como referido, contudo, o controle jurisdicional nessas matérias, sobretudo quantos aos juízos de cassação, tem sido e deve continuar a ser excepcional. No caso em exame, a eventual cassação do Deputado seria o ponto culminante de uma longa série de pronunciamentos extremados, não raro entremeados de impropérios. Não seria um contexto fácil para se alegar perseguição política e postular uma interferência do STF, em detrimento da autonomia legislativa. Apesar disso, há boas razões para sustentar que, à luz da Constituição, a Câmara dos Deputados não deve percorrer esse caminho. Três delas merecem destaque.

Em primeiro lugar, a praxe das Casas Legislativas brasileiras tem sido permissiva com essas hipóteses de abuso retórico. O próprio Deputado Bolsonaro já respondeu a outros procedimentos disciplinares por suposta quebra de decoro, sempre arquivados ou concluídos com absolvições sumárias. A fala atualmente em evidência não é pior do que a entrevista, amplamente divulgada, em que S. Exa. elogiou enfaticamente as condições degradantes do presídio de Pedrinhas, arrematada com um sonoro conjunto de palavrões. É claro que a Câmara pode mudar de postura e dar um basta em condutas dessa ordem, mas seria no mínimo prudente dar alguma advertência prévia.

Em segundo lugar, a fala do Deputado foi proferida na tribuna da Casa Legislativa, em discurso oficial, o que intensifica a incidência da imunidade material e, por conseguinte, aumenta substancialmente o ônus argumentativo que teria de ser enfrentado para eventual cassação. Ainda que a inviolabilidade possa ser atenuada em face de juízo autônomo da própria Casa, seria uma incoerência normativa deixar de considerar a sua incidência também nesse domínio. Ademais, a alegada agressão verbal foi dirigida a outro parlamentar e não a um agente externo, o que também reforça a necessidade de proteção.

As pessoas que se candidatam a um cargo eletivo e se engajam em processos de deliberação pública, sobretudo no âmbito do Parlamento, devem estar dispostas a aceitar níveis mais elevados de crítica e excesso verbal. A resposta primária deve ser, justamente, a contraposição de discursos. Para além dessas considerações relacionadas aos sujeitos envolvidos, o debate parlamentar demanda proteção por si mesmo, pelo que representa em termos de concretização da democracia representativa. Isso conduz ao terceiro elemento a ser considerado, mais abstrato.

Parlamentares são eleitos para tomar decisões em nome da coletividade, o que envolve uma série de dificuldades na identificação e transferência de expectativas. Na tentativa de aprimorar o mecanismo, muitos países adotam o sistema proporcional, de modo a que as Casas Legislativas, no todo ou em parte, sejam compostas por representantes das diferentes correntes socialmente expressivas, dando lugar a participação de maiorias e minorias. Essa configuração visa a permitir que o debate político seja, tanto quanto possível, um espelho da sociedade. Espelho, não photoshop.

Vale dizer: o Deputado Bolsonaro não é um artefato isolado, como demonstram os mais de quinhentos mil votos que lhe tornaram o campeão das urnas no Rio de Janeiro – e que certamente se multiplicariam em uma eleição nacional. Ele representa um segmento expressivo da população nacional, de perfil mais conservador ou simplesmente afinado com um discurso ácido de indignação. Embora nem todos os eleitores de Bolsonaro concordem com seus arroubos retóricos, todos quiseram vê-lo eleito e participando da política – inclusive e sobretudo para defender os argumentos que serviram como pano de fundo para o pronunciamento ora em exame. Quando ele fala sobre esses assuntos, um amplo conjunto de pessoas se sente representada, preservando o seu compromisso com os canais institucionais de decisão e tornando mais legítimas as decisões resultantes.

Ao mesmo tempo, as pessoas que pensam de forma diferente têm a chance de criticar aqueles pontos de vista e até de refletir sobre as causas de escalada do pensamento conservador e da pirotecnia agressiva. A exposição a críticas e objeções pode ajudar a diluir radicalismos ou, pelo menos, a evitar que eles busquem formas extremadas de expressão [8]. É com base nessa lógica que a maioria dos países, incluindo alguns com passado sombrio, admite o funcionamento e manifestações públicas de partidos de extrema direita, ainda quando flertem perigosamente com discursos autoritários [9]. É no espaço público que essas ideias devem se colocar e ser objeto de contraponto; empurrá-las para um gueto qualquer não fará com que desapareçam, mas reduziria a sua visibilidade e as desobrigaria de responder publicamente por suas inconsistências.

Por tudo isso, cassar o mandato do Deputado Jair Bolsonaro seria ruim para a oxigenação do debate público. Sem idealizações, é evidente que inexiste qualquer diálogo real entre ele e a Deputada Maria do Rosário ou o Deputado Jean Willys, para mencionar os contendores mais frequentes. Diálogo pressupõe um mínimo de disposição, pelo menos em um dos lados, para se deixar convencer pelos argumentos do outro. O embate verbal que eles estabelecem não é propriamente uma deliberação entre interlocutores, e sim uma vitrine para as ideias que representam [10]. Eles falam, sobretudo, com quem já pensa parecido. No entanto, por intermédio deles e dos demais parlamentares, a sociedade é exposta a si mesma, no que tem de bom e de ruim. Com empenho e energia, é possível retirar bons frutos até de eventos insólitos como a fala de Bolsonaro: a repercussão do caso ampliou, ao menos momentaneamente, o alcance do debate sobre o machismo e a violência contra as mulheres, ainda presentes na realidade brasileira. Com um pouco de sorte, pode estimular uns tantos eleitores a repensarem seus critérios.

É claro que a imunidade parlamentar pode ocasionar arbitrariedades e excessos, como ilustra o caso de que se trata. Esse é o efeito colateral da livre circulação de ideias no Parlamento. Mas não se deve colocar um asterisco em tal liberdade por conta de abusos pontuais no seu exercício. A Constituição que protege da truculência é a mesma que atribui ao povo, antes de a qualquer outro agente, a prerrogativa de cassar a voz oficial de agentes eleitos que demonstrem desapreço pelos valores constitucionais ou percam a mão na defesa dos seus pontos de vista.

* Professor de Direito Constitucional do UNICEUB. Mestre e Doutor em Direito Público pela UERJ.

[1] - CF/88, art. 53, caput.

[2] - STF, Inq 2.036, Rel. Min. Carlos Britto: “A inviolabilidade (imunidade material) não se restringe ao âmbito espacial da Casa a que pertence o parlamentar, acompanhando-o muro a fora ou externa corporis, mas com uma ressalva: sua atuação tem que se enquadrar nos marcos de um comportamento que se constitua em expressão do múnus parlamentar, ou num prolongamento natural desse mister. Assim, não pode ser um predicamento intuitu personae, mas rigorosamente intuitu funcionae, alojando-se no campo mais estreito, determinável e formal das relações institucionais públicas, seja diretamente, seja por natural desdobramento; e nunca nas inumeráveis e abertas e coloquiais interações que permeiam o dia-a-dia da sociedade civil. No caso, ficou evidenciado que o acusado agiu exclusivamente na condição de jornalista -- como produtor e apresentador do programa de televisão --, sem que de suas declarações pudesse se extrair qualquer relação com o seu mandato parlamentar”.

[3] - A título de exemplo, previsões semelhantes constam das Constituições de Estados Unidos, Alemanha, México, Argentina e Espanha, dentre muitas outras.

[4] - CF/88, art. 55: “Perderá o mandato o Deputado ou o Senador: II- cujo procedimento for incompatível com o decoro parlamentar“.

[5] - Lei Fundamental, art. 46 (I): “Um parlamentar não poderá, em nenhum momento, ser submetido à via judicial ou disciplinar, nem responsabilizado de outra forma fora do Parlamento Federal, em virtude de voto dado ou opinião emitida no Parlamento ou numa das suas comissões. Esta disposição não terá aplicação no caso de injúria difamante“.

[6] - STF, MS 25.579, Rel. originário Min. Sepúlveda Pertence, Rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barnosa: “2. Na qualidade de guarda da Constituição, o Supremo Tribunal Federal tem a elevada responsabilidade de decidir acerca da juridicidade da ação dos demais Poderes do Estado. No exercício desse mister, deve esta Corte ter sempre em perspectiva a regra de auto-contenção que lhe impede de invadir a esfera reservada à decisão política dos dois outros Poderes, bem como o dever de não se demitir do importantíssimo encargo que a Constituição lhe atribui de garantir o acesso à jurisdição de todos aqueles cujos direitos individuais tenham sido lesados ou se achem ameaçados de lesão. À luz deste último imperativo, cumpre a esta Corte conhecer de impetração na qual se discute se os atos ministeriais do parlamentar licenciado se submetem à jurisdição censória da respectiva câmara legislativa, pois a matéria tem manifestamente estatura constitucional, e não interna corporis. Mandado de segurança conhecido. 3. O membro do Congresso Nacional que se licencia do mandato para investir-se no cargo de Ministro de Estado não perde os laços que o unem, organicamente, ao Parlamento (CF, art. 56, I). Conseqüentemente, continua a subsistir em seu favor a garantia constitucional da prerrogativa de foro em matéria penal (INQ-QO 777-3/TO, rel. min. Moreira Alves, DJ 01.10.1993), bem como a faculdade de optar pela remuneração do mandato (CF, art. 56, § 3º). Da mesma forma, ainda que licenciado, cumpre-lhe guardar estrita observância às vedações e incompatibilidades inerentes ao estatuto constitucional do congressista, assim como às exigências ético-jurídicas que a Constituição (CF, art. 55, § 1º) e os regimentos internos das casas legislativas estabelecem como elementos caracterizadores do decoro parlamentar. 4. Não obstante, o princípio da separação e independência dos poderes e os mecanismos de interferência recíproca que lhe são inerentes impedem, em princípio, que a Câmara a que pertença o parlamentar o submeta, quando licenciado nas condições supramencionadas, a processo de perda do mandato, em virtude de atos por ele praticados que tenham estrita vinculação com a função exercida no Poder Executivo (CF, art. 87, parágrafo único, incisos I, II, III e IV), uma vez que a Constituição prevê modalidade específica de responsabilização política para os membros do Poder Executivo (CF, arts. 85, 86 e 102, I, c). 5. Na hipótese dos autos, contudo, embora afastado do exercício do mandato parlamentar, o Impetrante foi acusado de haver usado de sua influência para levantar fundos junto a bancos "com a finalidade de pagar parlamentares para que, na Câmara dos Deputados, votassem projetos em favor do Governo" (Representação nº 38/2005, formulada pelo PTB). Tal imputação se adequa, em tese, ao que preceituado no art. 4º, inciso IV do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados que qualifica como suscetíveis de acarretar a perda do mandato os atos e procedimentos levados a efeito no intuito de "fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento dos trabalhos legislativos para alterar o resultado de deliberação".

[7] - STF, MS 26.441, Rel. Min. Celso de Mello: “Mandado de segurança - questões preliminares rejeitadas - pretendida incognoscibilidade da ação mandamental, porque de natureza "interna corporis" o ato impugnado - possibilidade de controle jurisdicional dos atos de caráter político, sempre que suscitada questão de índole constitucional - o mandado de segurança como processo documental e a noção de direito líquido e certo - necessidade de prova pré-constituída - configuração, na espécie, da liquidez dos fatos subjacentes à pretensão mandamental - comissão parlamentar de inquérito - direito de oposição - prerrogativa das minorias parlamentares - expressão do postulado democrático - direito impregnado de estatura constitucional - instauração de inquérito parlamentar e composição da respectiva cpi - impossibilidade de a maioria parlamentar frustrar, no âmbito de qualquer das casas do congresso nacional, o exercício, pelas minorias legislativas, do direito constitucional à investigação parlamentar (CF, art. 58, § 3º) - mandado de segurança concedido. o estatuto constitucional das minorias parlamentares: a participação ativa, no congresso nacional, dos grupos minoritários, a quem assiste o direito de fiscalizar o exercício do poder”.

[8] - Afirmando que a deliberação fora do espaço público tende a promover a polarização de interesses, pela natural aproximação de pessoas com ideias e inclinações semelhantes, que tendem a se reforçar mutuamente e desconsiderar a diversidade, v. Cass Sunstein, Designing democracies, 2001, pp. 7 e 14 e ss.

[9] - O caso mais célebre envolveu o pedido de que o Tribunal Constitucional alemão declarasse a inconstitucionalidade do NPD – Nationaldemokratische Partei Deutschlands, associado à extrema direita e defensor aberto da superação da ordem constitucional vigente. O caso restou inadmitido por defeitos processuais (Tribunal Constitucional, 2 BvB 1/01; 2 BvB 2/01; e 2 BvB 3/01, decisão de 18 de março de 2003), mas acabou abrindo caminho para a continuidade do funcionamento do partido. Em ocasiões posteriores, o Tribunal proferiu decisões acerca de pedidos para a proibição de passeatas organizadas pelo partido, a maior parte delas denegatória. Atualmente, encontra-se pendente de julgamento novo pedido de banimento da agremiação.

[10] - Dieter Grimm, Die Zukunf der Verfassung, 1991, pp. 357-358: “O ponto de partida é a percepção de que as decisões políticas mais do que produzidas no Parlamento, são nele apresentadas. Tal apresentação não se converte, contudo, em simples ritual, antes atua de volta na formação da opinião pública e, por outro lado, também na formação da vontade estatal, em caráter prospectivo. No Parlamento a maioria não está mais sob si mesma, tendo de expor e justificar publicamente seus propósitos, deixar que sejam comparados às alternativas propostas pelas minorias e afastar a crítica destas. O processo parlamentar possibilita assim a transparência da conduta governamental – a qual, por sua vez, é condição prévia para a crítica e o controle públicos continuados, a produção de ideias e a comunicação de interesses – e, sobretudo, abre oportunidades de participação para grupos que não dispõe de acesso institucionalizado ou informal ao poder. (...) Nessa função, apesar de todas as suas deficiências, o Parlamento ainda se apresenta, nos dias de hoje, como insubstituível por qualquer outra instituição”. (Tradução livre)

Bolsonaro e a Constituição

A crônica de um amor não correspondido