Rafael Negreiros Dantas de Lima

Arianne Kwon Ieiri

Pedro Ribeiro Agustoni Feilke

A cidade de São Paulo vem passando por uma intensa polêmica em torno da revisão do seu Plano Diretor, em razão da sua realização durante a pandemia, implicando diversos entraves em seu procedimento participativo e um impasse com a sociedade civil.
A pandemia trouxe uma verdadeira inviabilidade momentânea na realização de um planejamento urbano para a década, tanto em termos materiais como formais. No primeiro aspecto, é pouco prudente para qualquer gestor urbano projetar como deve se orientar o desenvolvimento de uma cidade, se as trocas e relações urbanas no pós-pandemia ainda são uma incógnita.
<a href="https://conteudo.jota.info/poder-contato?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tracking_materias"><img class="size-medium wp-image-291207 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tracking-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>Não há elementos consolidados para se averiguar quais serão as dinâmicas de mobilidade, das relações de trabalho, de vivência dos espaços públicos, do comércio, portanto, qualquer atividade de planejamento feita de antemão tem grandes chances de se tornar defasada ou inútil. Este risco não é trivial, pois pode gerar grandes danos para a cidade, inclusive econômicos.
Este elemento, por si só, deveria trazer um cuidado do gestor e questionar qual a verdadeira necessidade de se fazer a revisão do Plano Diretor em momento tão conturbado. No caso paulista, a Defensoria Pública e o Ministério Público expediram recomendações para a Prefeitura, afirmando não haver risco de imputação de improbidade administrativa pelo adiamento da revisão. Um evento extraordinário, como a pandemia, retira nexo de causalidade entre o adiamento e a conduta do gestor, permitindo tal ação.
Entretanto, a Prefeitura de São Paulo preferiu seguir o procedimento de revisão que, além dos empecilhos inerentes à pandemia, traz inúmeros entraves formais. O primeiro deles é como garantir condições materiais mínimas para a igualdade participativa dos cidadãos durante a pandemia se os encontros presenciais representam um risco para a vida. Ainda que haja vacinação, é inviável que uma pessoa pertencente a um grupo de risco da Covid-19 se exponha em eventos participativos presenciais.
Em relação aos atos participativos eletrônicos ou virtuais, há a dificuldade de permitir a manifestação dos “excluídos digitais”. Segundo a Fundação Seade<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, cerca de 20% dos paulistas – cerca de 7,5 milhões de pessoas – declararam nunca ter acessado a internet; e, nos estratos de alta vulnerabilidade que possuem acesso à internet, apenas 42% (825 mil moradias) possui acesso aos recursos de banda larga fixa (Região Metropolitana de São Paulo), o que indica uma ampla exclusão eletrônica. Assim, a viabilização da participação de uma pessoa sem acesso à internet e do grupo de risco de contágio da covid-19 torna-se impraticável.
Mesmo diante dos problemas relatados, a Prefeitura de São Paulo, por meio de uma reunião do Comitê de Gestão da Secretaria de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), no dia 24 de março de 2021, lançou a Revisão do Plano Diretor de São Paulo – 2021, gerando uma sucessão equívocos.
O primeiro foi a apresentação do procedimento de revisão do plano diretor finalizado, desconsiderando que sua elaboração deve se dar com a efetiva participação da sociedade civil, em todas as etapas do processo – desde a elaboração até a definição dos mecanismos para a tomada de decisões. A primeira medida neste sentido seria propor o debate sobre o modelo participativo no Conselho Municipal de Política Urbana – CMPU.
Este órgão participativo, com dezenas de representantes da sociedade civil, ficou relegado a uma instância em que se comunicavam os atos da Prefeitura para a revisão ou tentando-se encaminhar votações sem o zelo por questões formais mínimas, o que foi gerando o adiamento dos debates e decisões.
Assim, o modelo colocado pela Prefeitura – sem contribuição da sociedade civil – previa estudos diagnósticos, mediante a consolidação dos dados da municipalidade pela contratação de um estudo técnico. A participação social ocorreria por um modelo híbrido com a previsão de ações presenciais e digitais, havendo uma plataforma digital exclusiva para acompanhar todo o procedimento (planodiretorsp.prefeitura.sp.gov.br).
Essa última carece de transparência e publicidade em relação aos atos da revisão do Plano Diretor. Possui cronograma desatualizado e não há indicação de como os eventos poderão dialogar com o aperfeiçoamento do estudo, como as propostas da sociedade serão inseridas na proposta de revisão, qual é a quantidade de audiências públicas ou de oficinas ou a data de sua realização.
Em nenhum momento foi esclarecido como será garantida a efetiva participação de pessoas que não possuem acesso às plataformas digitais e se a etapa participativa vai ser realizada integralmente durante o período de pandemia.
Até o momento, estão ocorrendo reuniões temáticas desprovidas de estudo diagnóstico completo (suspenso por decisão judicial), o que é preocupante, pois a participação social não se efetiva com o simples oferecimento dos canais de debate, mas pela viabilização da efetiva tomada de decisão pelos cidadãos. Sem que haja a disponibilização dos estudos sobre como a cidade se desenvolveu nos últimos anos, não há informação suficiente para que as pessoas possam se manifestar e contribuir para o produto final do processo decisório.
Em outra via, o Município produziu uma enquete online, questionada pela fragilidade em sua base de dados, ausência de controle da amostra de respondentes, não identificação do bairro dos respondentes, má formulação das perguntas e respostas sem correlação com a revisão do Plano Diretor<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
Como se observa, há um relevante déficit participativo na revisão do Plano Diretor da cidade de São Paulo, oriundo de diversos vícios na condução do processo por parte da gestão municipal e que deve ser sanado. A participação social é elemento indispensável para a concretização do planejamento urbano via Plano Diretor, de modo que sua formulação com tamanhos vícios não pode ser considerada um procedimento saudável para definir os rumos da cidade para os próximos anos.
A primeira iniciativa que se espera é a repactuação com a sociedade, indicando-se como grupos mais vulneráveis podem ter poder de manifestação dentro de um contexto pandêmico. A produção de amplo acesso à informação, com possibilidade de contribuição social na formulação dos estudos, a exemplo do que vem sendo feito por diversas entidades por meio do Fórum SP 21<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a> , também é essencial. Somente neste caminho é que se pode garantir um acúmulo de debates que permita a distribuição equitativa do poder de influência na decisão dos rumos da cidade.
<div id="" role=""></div>
<script type=""text/javascript"" src=""https://d335luupugsy2.cloudfront.net/js/rdstation-forms/stable/rdstation-forms.min.js""></script> 
<script type=""text/javascript""> new RDStationForms('sdr-inbound-form-artigos-impacto-nas-instituicoes-8c5227dd4ede3347a6c6', 'UA-53687336-1').createForm();</script> 
------------------------------
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> https://www.seade.gov.br/produtos2/midia/2020/07/Cetic_produto01_7ago.pdf . Acesso em 11/05/2021
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> <a href="https://exame.com/blog/impacto-social/jogo-dos-sete-erros-participacao-na-revisao-do-plano-diretor-de-sao-paulo/">https://exame.com/blog/impacto-social/jogo-dos-sete-erros-participacao-na-revisao-do-plano-diretor-de-sao-paulo/</a>
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> <a href="https://sites.usp.br/forumsp21/">O Fórum SP 21 - Fórum SP 21 (usp.br)</a>

guilherme-stecanella-SaVlzqe9068-unsplash

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

As inviabilidades materiais e formais de produzir participação social em período pandêmico

Atropelos participativos na revisão do Plano Diretor de São Paulo

As inviabilidades materiais e formais de produzir participação social em período pandêmico