Luiz Roberto Peroba

Bruno Lorette Corrêa

Matteus Borelli

Os contratos de parceria têm sido cada vez mais utilizados pelas empresas. 
Muitas vezes, porém, os contribuintes ficam em dúvida sobre o correto tratamento tributário a ser dado a esse instrumento, já que ele não conta com regras e uma regulamentação específica no direito civil.
Diante da relevância do tema, este artigo pretende analisar a viabilidade jurídica de utilização dessa modalidade contratual para verificar, ao final, os contornos fiscais aplicáveis a esse tipo de contrato.
Não é novidade que os últimos anos têm registrado uma crescente e contínuo 
aumento no grau de complexidade das atividades que são desenvolvidas pelas empresas que atuam no mundo da inovação.
A marca desse aumento de complexidade é a especialização, com participantes cada vez mais focados em atividades específicas dentro do seu nicho de atuação, visando agregar valor aos consumidores.
Esse ambiente inovador e de alta especialização exige, cada vez mais, que as empresas conjuguem esforços a fim de possibilitar a oferta de seus serviços e produtos e atender às demandas do mercado. Isso requer, muitas vezes, a congregação do know how adquirido em seus campos de atuação específicos, possibilitando a oferta conjunta de suas atividades.
Em certa medida, a realidade econômica sempre exigiu que as empresas se relacionassem para executarem suas atividades, o que leva à dúvida das empresas se deveriam utilizar os modelos típicos de contratação (com regras e requisitos próprios previstos na legislação civil), ou se poderiam se valer de contratos atípicos, isto é, que não possuem previsão e regulação específica na legislação civil.[1] 
Historicamente, a subcontratação e a constituição de novas sociedades com propósitos específicos se tornaram as formas mais comuns de contratação e conjugação de esforços entre as empresas. A escolha por esses modelos geralmente se dá porque são figuras contratuais reguladas pela legislação civil, o que é visto pelas empresas como garantia de maior segurança jurídica para essas relações.
Contudo, a tendência de mercados inovadores é a de evitar as possíveis relações de subordinação ou de fornecedor/cliente e diminuir ineficiências operacionais (que podem surgir a partir desses modelos contratuais típicos), assim como de possibilitar maior liberdade das empresas em definirem as cláusulas contratuais e as formas de participação em determinado negócio conjunto.
Justamente por isso, tem se tornado cada vez mais comum a realização de parcerias comerciais e empresariais, como forma de congregar expertise e recursos financeiros na busca de objetivos comuns fundados em interesses recíprocos, preservando os direitos decorrentes de cada participação e do que cada parte irá implementar no negócio decorrente da parceria.
O contrato de parceria, nesse contexto, é um dos principais modelos atípicos de contratação. Embora não haja regras e regulamentação próprias, o ordenamento jurídico pátrio confere a necessária segurança jurídica para os particulares firmem parcerias para desenvolvimento das suas atividades, haja vista que o artigo 425 do código civil é expresso no sentido de que “é lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código”.
Além disso, contratos de parceria observam a máxima do direito privado, derivado do princípio da legalidade, segundo a qual “o que não é proibido pela lei, é permitido”.
De fato, em decorrência dessa ausência de regulação específica e a ampla gama de alternativas que se revelam a partir dos contratos atípicos, essa forma de contratação acaba por propiciar uma grande diversidade na modelagem das relações negociais nos contratos de parceria.
É essa liberdade negocial das parcerias empresariais que fez com que esse modelo negocial passasse a ser cada vez mais procurado e efetivamente implementado por empresas que atuam em ramos inovadores da economia, desde a combinação empresarial para geração de créditos de carbono, até entre empresas de tecnologia para desenvolvimento de novas ferramentas e amplo oferecimento de seus produtos a nível nacional e global.
A nosso ver, embora não haja regras e regulamentação próprias, entendemos que o ordenamento jurídico pátrio confere a necessária segurança jurídica para os particulares firmem parcerias para desenvolvimento das suas atividades, o que se verifica pela própria regra do artigo 425 do Código Civil mencionada acima.
Do ponto de vista fiscal, considerando a relevância dos institutos de direito civil para interpretação da lei tributária[2], bem como a característica do Direito Tributário enquanto direito de “sobreposição”, entendemos que existem ótimos argumentos contra eventual desconsideração ou reclassificação de relações jurídicas estabelecidas sob um contrato de parceria, dada a possibilidade jurídica de celebração desses tipos de contratos à luz do direito privado.
Esse raciocínio nos conduz a afirmar, por exemplo, que é plenamente defensável que o resultado da parceria firmada entre dois ou mais contribuintes seja reconhecido, para fins de tributação, na exata proporção do quinhão que cabe a cada uma dessas empresas como produto da parceria, e não que uma empresa teria de reconhecer esse resultado integralmente, e que as demais estariam lhe prestando algum tipo de serviço ou vendendo-lhe um determinado bem.
Corroborando essa nossa percepção, vale mencionar, também como exemplo, que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/carf">Carf</a>), ao analisar contratos de parceria entre corretores autônomos e imobiliária, concluiu que os valores recebidos pelas pessoas físicas nas operações de venda não se caracterizam como receita da pessoa jurídica para fins de tributação pelo IRPJ e CSLL.[3]
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por sua vez, também já concluiu pelo cancelamento da cobrança de contribuição previdenciária por entender que a criação de animais para engorda em regime de parceira não se inclui no conceito de comercialização.[4]
Em ambos os casos, a figura da parceria comercial foi respeitada como meio de contratação válida, a qual, desde que observadas as regras de direito privado aplicáveis, produziam efeitos perante terceiros, inclusive as autoridades fiscais, que deveriam interpretar a lei tributária a partir dos contornos decorrentes de tais contratos.
Tais exemplos são relevantes, pois deles se percebe que, embora os tribunais ainda não tenham se debruçado sobre casos de parcerias no contexto específico de implementação em atividades inovadoras, o Judiciário já vem reconhecendo a validade e a viabilidade da realização de parcerias nas atividades tradicionais, resguardando seus efeitos fiscais quando confrontados com tentativas de desvirtuamento da natureza dessa figura contratual.
Para o contribuinte interessado em adotar o modelo contratual de parceria, portanto, diante da possibilidade jurídica e tributária de adotá-lo, resta-nos ressaltar a importância de estruturação dos seus contratos e modelos de negócio em observância às regras gerais de direito civil, atribuindo os direitos e obrigações necessários às partes.
Outro ponto importante é a segregação das atividades, custos, despesas e receitas auferidas pelos contribuintes em parceria, tanto em contrato quanto contabilmente, garantindo a perfeita individualização para identificação da quantia atribuível a cada um dos participantes do contrato de parceria, o que também tem consequências fiscais.
Por fim, vale a advertência de que o direito tributário não deve ser obstáculo para o surgimento de novas formas de contratação entre particulares, notadamente no atual contexto de crescente progresso tecnológico, em que a flexibilidade e a liberdade das partes são determinantes para criação de soluções inovadoras e exponenciais.
Por isso, no tema sob análise, é que se conclui que a validade dos contratos de parceria deve ser consagrada, de forma que as autoridades fiscais devem respeitar essa forma legítima de contratação entre as empresas e não usem, indevidamente, a atipicidade dos contratos de parceria como pretexto para novas autuações.
<hr />
[1] AZEVEDO, Álvaro Villaça, Teoria Geral dos Contratos Típicos e Atípicos. São Paulo: Atas, 2002. p.132.
[2] Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
[3] CARF, Acórdão nº 1302-005.824, Processo nº 18470.720343/2010-01, julgado em 19/10/2021.Publicado em 12/11/2021.
[4] STJ: EDcl no AgRg no REsp nº 475.042/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 27/9/2005. Publicado em 21/11/2005.

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JOTA

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