Ricardo Capucio

Compartilhar ao invés de concentrar. Economizar, reutilizar, gerar autonomia financeira. Uma nova lógica econômica e social vem apontando para o esgotamento de antigos modelos de geração de emprego, de renda e prestação de serviços baseados, muitas vezes, na dinâmica das grandes corporações. Estamos no meio de uma transição. É natural, portanto, que certos símbolos tradicionais e padrões de comportamento permaneçam em nosso imaginário e causem um sentimento de confusão e desconfiança em relação ao novo. Porém, é importante observar que a cada dia mais regras estão sendo colocadas em xeque e isso pode ser muito positivo. 
A crença no potencial dessa nova dinâmica econômica tem feito alguns empresários brasileiros ficarem atentos a um setor que está em alta, mas ainda é pouco explorado: as fintechs. Pessoalmente, me deparei com o tema ao acompanhar, como advogado da área de direito regulatório, a nova legislação de meios de pagamentos que estava surgindo no Brasil em 2013. As novas regras diziam respeito a um universo de vastas possibilidades. Ali comecei a entender que uma grande transformação, na verdade uma revolução, estava acontecendo no setor de meios de pagamentos.
Promulgada em 9 de outubro de 2013, a Lei 12.865 possibilitaria a inclusão financeira de boa parte da população que ainda só usava dinheiro em espécie. A partir dessa norma, qualquer cidadão brasileiro poderia usufruir das facilidades “bancárias” ao ter acesso a instituições e arranjos de pagamentos com uma gama variada de serviços – contas de pagamentos, cartões de crédito, débito e pré-pago; transferir ou receber recursos eletronicamente; pagar contas usando o seu telefone celular e sem, necessariamente, precisar ter uma conta-corrente em um banco. 
A legislação ainda viabilizou a difusão dos serviços a mais instituições ampliando o leque e garantindo maior oferta. Trouxe grandes inovações dentre as quais destaco o acolhimento de novos players, incentivando a necessária competição no setor e permitindo que não só as grandes corporações estivessem inseridas nos arranjos de pagamento. Se hoje as fintechs representam uma nova e alentadora possibilidade de inclusão financeira no Brasil, é, em grande parte, graças à Lei 12.865.
Quem lida com o direito sabe que a tecnologia e a inovação sempre chegam primeiro ao mercado e depois, a reboque, a sua regulação. No setor de pagamentos isso não foi diferente. Apesar de ser um segmento extremamente regulado, na ocasião do advento do novo marco regulatório já existiam centenas de iniciativas acontecendo à margem do arcabouço jurídico existente, e alguns grandes cases. Assim, a promulgação da norma, que buscou ser moderna e acolhedora, teve como efeito principal permitir a inclusão e o aparecimento de milhares de novos empreendimentos que, com base em um novo patamar de segurança jurídica, conseguiram atrair capital e novos talentos. 
Nessa época, ao mesmo tempo em que acompanhava a gestação da lei, um grande amigo, o empreendedor, Ricardo Drummond, me convidou para desenharmos um projeto que dialogasse com as fintechs, algo voltado para os micro e pequenos empreendedores. Gostei da ideia e quis me aprofundar no assunto entendendo melhor a realidade dos pequenos empreendedores. Mergulhamos de cabeça no projeto e fomos selecionados para o Curso de Inovação e Empreendedorismo da Universidade de Stanford (primeira turma brasileira no curso). Isso fez toda a diferença. Ao longo dos estudos pudemos refinar a ideia a fim de construir o futuro empreendimento com base em uma metodologia que tinha o usuário e seus problemas como o foco.
Quando fui a campo entrevistar os pequenos empreendedores para entender melhor as suas necessidades percebi uma carência enorme e a necessidade que eles tinham de serem incluídos financeiramente. Existiam milhões de microempreendedores ávidos a organizarem suas atividades de maneira que pudessem crescer. Também descobrimos que, quanto menor era a empresa, mais carente era o empreendedor. Ou seja, tinha mais necessidade de uma solução de profissionalização que o ajudasse a dar fôlego ao seu negócio. 
Diante dessa realidade e considerando meu backgrond como advogado regulatório, me chamou a atenção o fato de termos toda uma legislação própria para os microempreendedores individuais e que tal legislação era extremamente moderna e baseada em um mecanismo simples e eficiente (algo raro nos padrões burocrático do Brasil). Ao estudá-la descobri que era uma legislação muito benéfica aos pequenos e que trazia uma série de vantagens diretas e indiretas, como a redução dos tributos e as contrapartidas que as empresas inseridas no Simples Nacional tinham de oferecer aos MEIs. Me impressionou perceber que existia um conjunto de fatores favoráveis ao crescimento e desenvolvimento deste segmento econômico e entendi que eles representavam o futuro, mas que existia a necessidade de auxílio em algumas questões. A partir daí tomei a decisão de me dedicar integralmente ao tema.
De lá pra cá, muitas mudanças ocorreram. Felizmente as fintechs ganharam os holofotes, e algumas delas, de fato, conquistaram um lugar ao sol e o respaldo de investidores de peso. Além de ser um setor que representa a inovação, as fintechs, hoje, são sinônimos de eficiência, de empatia com o cliente e redistribuição de poder. As primeiras iniciativas se consolidaram nos Estados Unidos e Inglaterra por volta de 2011. No Brasil o movimento começou a ganhar força nos últimos dois anos e atualmente o país conta com centenas de iniciativas que contemplam oito grandes categorias. É importante, inclusive, entender um pouco sobre cada uma delas para termos ideia da dimensão das fintechs brasileiras (1). Elas atuam nas seguintes áreas:
Pagamento: empresas que oferecem serviços de pagamento para consumidores e organizações. Engloba soluções de pagamentos online para e-commerce, depósitos diretos, mobile wallet, gateways de pagamentos, etc.
Gerenciamento financeiro: focada em gerenciamento financeiro para pessoa física (personal finance management) ou empresas. Oferece ferramentas para controle de despesas, gestão de orçamentos, gestão fiscal e otimização de recompensas dos cartões de crédito (milhas).
Empréstimos e negociação de dívidas: as empresas oferecem novas maneiras de conseguir empréstimos ou renegociar dívidas com taxas de juros diferenciadas, tanto para pessoa física como pessoa jurídica. 
Investimentos: propostas de novas formas de investir o seu dinheiro ou analisar e gerenciar aplicações já realizadas por meio de algorítimos e crowdsource.
Funding: é um serviço que permite investimentos coletivos para novos produtos, serviços ou causas sociais. Por meio do equity crowdsourcing empresas podem levantar recursos em troca de capital próprio. 
Seguros: marketplace de corretoras de seguro que oferecem, entre outros serviços, comparação de valores, análise e simulações online para o perfil do segurado. 
Eficiência financeira: empresas que oferecem soluções para auxiliarem outras empresas no mercado financeiro como análise de dados com modelos de big-data, algorítimos de inteligência artificial, proteção de transações, entre outros. 
Bitcoin: iniciativas focadas na compra, venda e outras transações que utilizam bitcoins ou “cripto-moedas”.
Temos muito a falar deste imenso universo das fintechs, dos empreendedores e dos novos meios de pagamentos. A nossa expectativa é compartilhar com vocês um pouco desta viagem, não apenas com o olhar de quem está dentro desta locomotiva, mas também com uma visão técnica e ampliada do segmento, sua regulação e desafios. Acredito que apostar na capacidade de empreendedorismo do brasileiro e possibilitar inclusão e autonomia financeira é essencial para uma economia mais igualitária e promissora. Chamo especial atenção para os empreendedores individuais, segmento que tende a revolucionar o nosso modelo de mão de obra e todo o contexto de prestação de serviços global. Algumas pesquisas corroboram esse raciocínio ao afirmarem que até 2030 mais de 50% da economia do planeta terá origem no empreendedorismo individual. Isso sem falar da novíssima geração dos millennials, que são empreendedores por excelência, e que provavelmente desenharão o futuro de nossa economia. Que eles, assim como todas as iniciativas em prol dos empreendedores, sejam muito bem-vindos!
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(1) - Com informações do Report Fintech Lab 2016.

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JOTA

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