Vitor Morais de Andrade

Órgãos de proteção e defesa dos consumidores de todo o país têm questionado a regularidade de publicidades de alimentos que utilizam em sua comunicação imagens e nomes que trazem referência a determinados sabores e aromas que nem sempre fazem parte dos ingredientes que compõem esses produtos.
Os casos mais recentes são dos sanduíches que não possuíam na composição dos hambúrgueres os cortes de carnes que davam nome aos produtos (picanha e costela), mas eram feitos com molhos que levavam ao consumidor a percepção do mesmo sabor. Temos, ainda, uma recente discussão sobre embalagens de bebidas que possuem nos rótulos a imagem de laranjas, limões e uvas, mas não possuem a presença preponderante desses ingredientes em sua composição.
Essa discussão tem gerado grande debate sobre os limites para utilização de imagens e sabores de referência na publicidade de alimentos.
Como existe opinião para todos os gostos, trago algumas reflexões a partir da seguinte pergunta: será que um produto e a sua publicidade podem trazer aromas e sabores característicos de determinados ingredientes que não estão na sua composição, sem que o consumidor seja enganado?
Convivemos diariamente com inúmeros alimentos que fazem alusão a aromas e sabores sem que esses determinados ingredientes façam parte da composição dos produtos. Um café com aroma de baunilha ou um biscoito sabor chocolate são apenas alguns exemplos. Podemos somar um salgadinho sabor cebola, mas que não tem o bulbo entre os seus ingredientes, uma bala sabor morango, um bolo de laranja ou um chiclete de melancia, mas sem tais frutas nas respectivas composições, ou até mesmo um creme com fragrância de cereja ou amêndoas, e assim por diante.
Acreditamos que a degustação de um produto e a sensação provocada pelo seu aroma ou sabor podem ser influenciadas por diversos fatores, além dos elementos objetivos dos ingredientes que o compõem. Ao degustar ou utilizar um produto, estamos também diante de um elemento subjetivo, que nasce a partir da percepção sensorial de cada indivíduo.
Todo consumidor tem condições de analisar o produto a partir da sensação gustativa e olfativa que este lhe proporciona, de forma que o que está em jogo, além das qualidades sensoriais do produto, é a existência de uma comunicação correta sobre ingredientes que dão as características que levaram os consumidores a fazer a sua escolha, inclusive pela preferência a determinado aroma ou sabor de cada um.
Se um produto conseguir igualar os gostos e aromas de ingredientes específicos (frutas, chocolate etc.), entregando ao consumidor a percepção sensorial que ele desejava, somado à informação adequada e clara de que se tratava de alusão a determinado sabor ou aroma, não me parece que estamos diante de qualquer irregularidade.
Há que se somar a esse fato a necessidade de cumprimento das regulamentações específicas, que impõem parâmetros para informação sobre determinados ingredientes. A rotulagem e publicidade são ferramentas importantes de informação e devem estar de acordo com as regras estabelecidas na legislação de alimentos, em geral também definidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/anvisa">Anvisa)</a> ou pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Uma vez cumprido os regulamentos expedidos por autoridades competentes é fundamental que órgãos públicos, inclusive aqueles que compõe o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) e o Poder Judiciário, por respeito à Constituição Federal, prestem deferência ao regulador naquilo que concerne sua atribuição técnica, sendo indevido o controle da interpretação do Regulador, como tentativa de substituí-lo pela sua própria interpretação da lei.
Existem, portanto, desafios para os consumidores pouco informados ou esclarecidos sobre a característica de determinados produtos, bem como sobre as exigências dos órgãos reguladores sobre o assunto.
Esse problema de assimetria informacional tem sido equilibrado pelas normas de proteção dos consumidores, bem como pela autorregulamentação publicitária, que busca definir regras éticas para o ambiente publicitário.
O artigo 17 do <a href="https://www.google.com/url?sa=t&amp;rct=j&amp;q=&amp;esrc=s&amp;source=web&amp;cd=&amp;ved=2ahUKEwju3OuL1-n4AhVau5UCHdfPDJAQFnoECBAQAw&amp;url=https%3A%2F%2Fwww.gov.br%2Fsecom%2Fpt-br%2Facesso-a-informacao%2Flegislacao%2Fca2digobrasdeautoregulanovo.pdf&amp;usg=AOvVaw2t_hUvRFElv8pEEVrNdXGm">Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar)</a> recomenda que, ao aferir a conformidade de uma campanha ou um anúncio, o teste primordial deve ser o impacto provável do anúncio, em sua totalidade, sobre aqueles que irão vê-lo ou ouvi-lo. A partir dessa análise global é que se examinará detalhadamente cada parte do conteúdo visual, verbal ou oral do anúncio, bem como a natureza do meio utilizado para sua veiculação. Essa disposição dialoga com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que no artigo 6º considera direito básico dos consumidores a informação clara sobre as características e a composição dos produtos e condena publicidade enganosa e qualquer método comercial desleal.
Portanto, se a experiência sensorial do consumidor conseguir fazer assimilações de gostos ou aromas de qualquer produto que use substâncias com propriedades odoríferas e/ou sápidas, capazes de conferir ou intensificar o aroma e ou sabor dos alimentos referência, nos cabe analisar se a publicidade foi honesta e transparente sobre tratar-se de alusão a determinado aroma ou sabor e não do ingrediente referência.
Por isso, os anúncios devem ser realizados de forma a não explorar a falta de experiência ou de conhecimento dos consumidores, tampouco se beneficiar de sua credulidade, contendo sempre uma apresentação verdadeira sobre os ingredientes que os compõem e as experiências sensoriais que proporcionam, seja sobre seu sabor, aroma e natureza (deixando claro se são naturais ou artificiais).
A publicidade, em última análise, não pode atribuir qualidades que não sejam verdadeiras ou que possam causar confusão sobre a natureza do produto. Mas, uma vez comunicando de forma correta a experiência gustativa ou aromática que será entregue ao consumidor, deixando claro que se trata de referência a sabores, poderá fazer uso desses elementos. É nesse ponto que se harmoniza a necessária proteção dos consumidores, juntamente com o desenvolvimento das atividades econômicas de forma saudável e sustentável.

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JOTA

Publicidades de alimentos que utilizam em sua comunicação imagens e nomes que trazem referência a determinados sabores e aromas

Aromas e sabores: afinal, qual o limite para usarmos essas referências na publicidade de alimentos?

Publicidades de alimentos que utilizam em sua comunicação imagens e nomes que trazem referência a determinados sabores e aromas