Silvia Piva

Já parou para pensar que o novo sempre assusta? Na infância, o medo de mudar de escola. Na adolescência, o de não ser aceito em determinado grupo, por exemplo. Agora, pense no medo do que é desconhecido dentro do ambiente corporativo, no mercado de trabalho, diante de uma sociedade em constantes mudanças com o advento da era digital. Fica fácil imaginar que, quanto mais fecharmos os olhos para o novo, menores serão as chances de sobrevivência no mercado.
Infelizmente, é o que muitos de nós temos feito na área do Direito há quase 40 anos, das universidades até o desenvolvimento profissional em escritórios e departamentos jurídicos.
<a href="https://conteudo.jota.info/poder-contato?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>O mecanicismo – aqui entendido como uma forma obsoleta de agir e pensar, onde as relações de causa e efeito são previsíveis e nossas ações concebidas como máquinas – ainda é a forma predominante de conhecer e de trabalhar na atividade jurídica (e em muitas outras).
Prova isso é que, diante da era digital, o Direito ainda não tem respostas para muitos problemas, mesmo em meio à abundância de informações, como:
<ul>
<li>Não há crítica e problematização dos desafios da prática jurídica. Continuamos a conhecê-la a partir da mesma dinâmica, com extremas divisões técnicas na teoria e funcionais na prática;</li>
<li>Não existe efetiva articulação do conhecimento teórico com a realidade prática, pois, ao longo da atividade profissional, percebe-se que não sabemos lidar como gestores de problemas em que pessoas atuam para resolvê-los;</li>
<li>Há pouca ousadia e criatividade para buscar soluções diversas nas formas de trabalhar, resolver problemas e criar novos serviços, mesmo com uma cobrança reiterada para que os profissionais desenvolvam tais competências;</li>
<li>Os avanços tecnológicos não têm modificado – nem estrutural, nem conjunturalmente – o trabalho em grande parte dos escritórios e departamentos jurídicos, os quais mantêm a maneira de atuar de forma burocrática, procedimental e com poucos questionamentos sobre o modelo até então adotado;</li>
</ul>
Essas são apenas algumas dentre outras questões urgentes que permeiam a formação e a atuação dos profissionais jurídicos.
Desde que iniciei meus estudos e pesquisas na Teoria da Complexidade, fui concebendo, aos poucos, a necessidade de mudança do paradigma cartesiano-newtoniano, responsável pelo desencadeamento das infindáveis especializações (que foram necessárias e muito úteis à humanidade, mas não mais suficientes), as quais operam a concepção do homem enquanto máquina, sem emoções e obediente a comandos, o que não contribui com seu potencial cognitivo.
E a universidade está modelada na hierarquia e na tradição, assim como a profissão jurídica: práticas absolutamente cartesianas. Só que o mundo está soltando as amarras que atavam o conhecimento à hierarquia e à tradição. O profissional jurídico que não abrir os olhos para isso poderá ficar muito distante do que a própria sociedade precisa e quer na atualidade.
<blockquote class="jota-article__eye">Vivemos uma fase de entropia na área do Direito – lei da natureza onde as estruturas organizadas se desorganizam e, quanto maior o grau de irreversibilidade ao seu estado original, maior a chance de sua morte.</blockquote>
Da desordem vem o caos, e então, a necessidade de reorganizar o sistema.
Precisamos, portanto, sair do estado de imobilização e transformar nossas formas de atuar, reformular nossas ideias, questionar padrões para, justamente, produzir ações novas – usando de toda nossa criatividade e trazendo interferências de outros ramos do conhecimento para refrescar a prática jurídica.
Vale ressaltar que, com a reflexão aqui apresentada, não quero dizer que tradição é ruim e deve ser abandonada. Não. Apenas destaco ser imprescindível enxergar o mundo, hoje, muito mais horizontal, multifuncional. Precisamos nos aproximar para conversar, precisamos colaborar e ouvir novas propostas de soluções diante dos problemas que se impõem, mesmo que não concordemos com elas.
É uma mudança de cultura que reflete em todos esses padrões do Direito. Convido você, profissional, a pensar sobre isso e a adotar novas práticas. Vamos fazer isso juntos?
<hr />
O episódio 52 do podcast Sem Precedentes discute os bastidores e as desconfianças envolvendo o caso Lula no Supremo Tribunal Federal. Ouça:
https://youtu.be/1T8EYyNCQeM

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JOTA

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