Nilo Sérgio Gaião Santos

Foi com interesse que recebemos o <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/um-raio-x-das-arbitragens-com-o-poder-publico-13062023">texto escrito por Eduardo Jordão publicado na coluna Publicistas</a> no último dia 13. Nele, o ilustre professor faz apontamentos interessantes sobre as arbitragens que envolvem agências reguladoras federais, além de sugerir outros temas para reflexão.
Neste artigo, vamos prosseguir com esse importante diálogo e tratar de três pontos levantados na coluna: duração dos casos; indicação dos temas mais comuns; e existência de questionamentos judiciais contra as sentenças arbitrais. Dentro do terceiro ponto, incluiremos um rápido panorama das sentenças publicadas até hoje.
Para isso, utilizaremos os dados compilados no recém-lançado <a href="https://www.gov.br/agu/pt-br/composicao/procuradoria-geral-federal-1/subprocuradoria-federal-de-consultoria-juridica/equipe-nacional-de-arbitragens-enarb">site da equipe de arbitragem da Procuradoria-Geral Federal</a> (Enarb/PGF), onde estão disponíveis informações e documentos tanto sobre casos em andamento quanto sobre disputas já finalizadas;
<h3>1) Duração dos casos</h3>
A análise dos casos finalizados demonstra que os procedimentos tem sido definitivamente resolvidos, via de regra, em menos de três anos. O problema é que esse corte metodológico não corresponde à realidade dos novos procedimentos arbitrais.
De fato, todos os casos finalizados até o momento referem-se a disputas da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que se distinguem de outras agências por dois motivos principais. Primeiro, esse peculiar contrato de concessão não possui discussões de reequilíbrio econômico-financeiro, o que traz para a disputa um escopo normalmente mais reduzido; segundo, casos da ANP raramente passam pela produção de prova pericial, de modo que a instrução probatória se desenvolve muito mais rápido.
Coincidentemente, o caso mais demorado (Silver Marlim v ANP) é justamente o único em que houve a produção de prova pericial, a qual durou pouco menos de dois anos.
Essas características não se replicam em casos de outras agências (ANTT, Anatel, Anac e Aneel), que hoje respondem pela grande maioria dos casos em curso. Além de possuírem escopo mais dilatado, boa parte dessas disputas envolvem a produção de prova pericial, o que tem representado um perceptível gargalo na instrução probatória.
Colocando de outra forma: agilidade passada seguramente não garantirá agilidade futura.
<h3>2) Perfil temático das disputas</h3>
O mesmo corte – ANP v demais agências – é aplicável na análise das questões jurídicas levadas a arbitragem.
Os casos da ANP apresentam considerável variação: alguns envolvem questões tradicionais de Direito Público, como o direito à prorrogação contratual (Nova Petroleo) e/ou ao afastamento de sanções impostas pela agência (Brazalta); mas há também casos sobre o indeferimento de negócio jurídico simulado (Petra - Tucano Sul), sobre os critérios para delimitação do campo de petróleo (Petrobras – Tartaruga Verde) e sobre o impacto de atos normativos sobre os contratos (Nova Petroleo e Petra – São Francisco).
Por outro lado, o componente ambiental tem sido uma constante. Das 16 arbitragens instauradas até hoje, 5 casos discutiam exclusivamente o impacto de um ato público de natureza ambiental (como decisões judiciais proibitivas e o indeferimento de licenças) para os contratos.
Para as demais agências federais, a estrutura do litígio tem seguido o padrão aplicável à matéria de reequilíbrio econômico-financeiro. Basicamente, o tribunal terá que decidir se os eventos suscitados pelo concessionário lhe conferem, dentro da matriz de risco do contrato, o direito a alguma espécie de reequilíbrio (como o aumento do pedágio a ser cobrado em uma rodovia ou da receita-teto anual para uma linha de transmissão de energia elétrica).
No caso Viracopos v Anac, por exemplo, um dos eventos submetidos ao tribunal e solucionados na recente sentença parcial referia-se ao impacto que a não construção do trem de alta velocidade entre Rio de Janeiro e Campinas trouxe para a concessionária, que alegava ter sofrido prejuízo com a redução da demanda esperada para o aeroporto.
Em vários casos da ANTT, discute-se, entre várias outras questões, se prejuízos causados pela edição da Lei dos Caminhoneiros (que alterou a sistemática do pedágio cobrado desses veículos) ou pela não obtenção de financiamento junto ao BNDES devem ser ressarcidos de alguma forma. Em casos da Anatel, um bom exemplo de evento discutido em vários casos é a prorrogação do CPMF durante a vigência dos contratos de concessão de telefonia fixa, o que teria incrementado as despesas da concessionária.
O componente ambiental também tem estado presente nessa classe de litígios. Nos casos ALS v ANTT e TNE v Aneel, a principal discussão de fundo é se o concessionário deve arcar com prejuízos causados por atrasos e determinações do licenciador ambiental.
<h3>3) Resultado dos casos e existência de questionamentos judiciais</h3>
Analisando as sentenças parciais e finais transitadas em julgado até hoje, é possível categorizar as decisões da seguinte forma:
<img class="aligncenter wp-image-440607 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2023/06/arbitragens-ag-federais.png" alt="" width="571" height="332" />
As soluções conferidas pelos Tribunais Arbitrais indicam que a hipótese de que o fenômeno do “apagão das canetas” seria um relevante fato causador de arbitragens não parece aplicável a procedimentos envolvendo agências federais. Ao fim e ao cabo, o grande móvel dessas arbitragens tem sido a divergência de interpretação sobre a alocação de riscos contratuais, a qual tem sido decidida favoravelmente às agências em praticamente todos os casos, ainda que na forma de sentenças de sucumbência recíproca.
Até o momento, o único questionamento judicial de que se tem notícia, tanto por concessionários quanto pelo poder público, diz respeito à sentença parcial do caso Petrobras v ANP (campo de Tartaruga Verde). Esse procedimento teve a confidencialidade decretada pelo tribunal, o que nos impede de fornecer maiores detalhes. Pode-se dizer, de qualquer forma, que essa decisão disse respeito a questões preliminares de cunho processual, e não ao mérito do litígio.
<h3>Conclusão</h3>
A submissão de agências federais à arbitragem é um assunto que interessa a vários stakeholders – parceiros privados, órgãos de governo, acadêmicos e contribuintes. Espera-se que a transparência ativa, que tem sido adotada de maneira crescente por entidades da Procuradoria-Geral Federal, possa atrair cada vez mais reflexões sobre o uso do instituto na solução de litígios.<a href="#_ftnref1" name="_ftn1"></a>

pgr-01-joao-americo

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Submissão de agências reguladoras à arbitragem é assunto que interessa a vários stakeholders

Ainda sobre arbitragens com agências federais

Submissão de agências reguladoras à arbitragem é assunto que interessa a vários stakeholders