tributário

Adicional ao RAT sobre ruídos: muito barulho está por vir

Mudança abrupta de entendimento vem gerando autuações milionárias

Adicional ao RAT
Crédito: Pixabay

O tema não é inédito, contudo vem ganhando mais um significativo capítulo: a abrupta alteração do entendimento até então vigente quanto ao adicional da contribuição aos Riscos Ambientais do Trabalho (RAT) — antes denominado Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) — sobre ruído, pago pelas indústrias quando há empregados expostos ao agente físico ruído em níveis acima do permitido pela legislação aplicável. Novo entendimento que já ensejou autuações milionárias em desfavor de inúmeros contribuintes e com potencial para gerar muito mais.

Em um passado recente, o posicionamento era no sentido de compreender o laudo técnico como elemento-base para a comprovação, tanto pela empresa, quanto pelos trabalhadores, das condições de salubridade/insalubridade do ambiente de trabalho para fins de concessão de aposentadoria especial e, logo, para definição se a empresa estaria ou não sujeita ao recolhimento do adicional de RAT.

Veja-se que o artigo 58 da Lei 8.213/91 é expresso ao definir que a prova da exposição do segurado ao agente nocivo seria feita com base em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT), com informação sobre a existência e eficácia de tecnologia de proteção coletiva ou individual capaz de diminuir a intensidade do agente agressivo a limites legais de tolerância.

Mais do que isso, os atos infralegais vigentes também estabeleciam que, caso fosse atestada em laudo técnico a eficácia do equipamento na neutralização dos efeitos do agente nocivo a níveis toleráveis, seria reconhecido o desenquadramento da atividade como especial, a exemplo da Ordem de Serviço nº 600/98, do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)[1], e da Instrução Normativa INSS/DC nº 84, de 17.12.2002 e suas posteriores alterações.

Como se vê, a concessão de aposentadoria especial poderia ser afastada no caso de adoção de medidas de proteção coletiva ou individual, tais como o uso de Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC) ou Individual (EPI), desde que comprovadamente eficientes para neutralizar ou atenuar o agente nocivo aos limites de tolerância permitidos.

Até por isso, a jurisprudência pátria, ao analisar o direito à aposentadoria especial nos casos de trabalhadores expostos a ruído, consagrou a relevância da medição técnica para apuração das condições de ruído a ensejarem a caracterização da insalubridade. E essa orientação jurisprudencial foi mantida ao longo do tempo[2].

Em coerência com esse posicionamento, por um lado, o INSS negou milhares de pedidos de aposentadoria especial; por outro, os contribuintes sempre estiveram seguros de que o sucesso na implementação de políticas de segurança do trabalho, quando comprovadamente eficazes para tornar toleráveis os níveis de ruído a que se sujeitam os profissionais, afastaria a exigência do recolhimento do correspondente adicional ao RAT. Inclusive, por isso, as fiscalizações do INSS concluíam pelo afastamento da exigência do citado adicional quando verificadas provas de que a empresa adotava medidas comprovadamente eficazes no combate à nocividade do ambiente de trabalho.

A grande virada ocorreu no momento em que a Receita Federal, ao substituir o INSS na fiscalização e cobrança das contribuições previdenciárias, desenvolveu uma ideia bastante engenhosa para ampliar a arrecadação: passou por cima da lei e das orientações do INSS e exigiu — inclusive, retroativamente — das empresas o adicional ao RAT, mesmo quando elas vinham seguindo rigorosamente o que determinava a legislação e nas hipóteses nas quais o INSS vinha negando a aposentadoria especial aos seus trabalhadores.

Ainda que a interpretação da Receita pudesse se sobrepor à do INSS, ao menos, não se poderia admitir que o contribuinte fosse punido por observar a única interpretação expressamente consagrada em lei e atos normativos.

Ora, será razoável concluir que o contribuinte deveria analisar a norma jurídica vigente, extrair a interpretação da Receita e agir contrariamente ao posicionamento expresso e reiterado do INSS, sem, no entanto, que qualquer ato da Receita o tenha orientado em tal sentido?

Se não bastante a controvérsia decorrente do novo posicionamento manifestado pela Receita quanto à exigência do adicional ao RAT, essa discussão ainda ganhou mais um ingrediente: a fixação, pelo Supremo Tribunal Federal, do Tema repercussão geral nº 555, o qual, erroneamente, tem sido insistentemente invocado como se representasse um ponto final da Suprema Corte quanto à esta controvérsia, um posicionamento temerário e precipitado.

Ainda mais considerando que essa questão constou no Plano Anual de Fiscalização de 2019, da Receita Federal, com o indicativo de supostas irregularidades em 370 empresas e valores estimados de arrecadação em R$ 946,5 milhões.

Diante da amplitude e complexidade do tema, é certo que a controvérsia demanda, necessariamente, uma minuciosa depuração do conteúdo do mencionado Tema nº 555, da legislação vigente e do que se sabe quanto à real eficácia dos mecanismos de segurança adotados pelas empresas em relação ao ruído. Pontos controvertidos que deixaremos para abordar nos próximos artigos dessa coletânea, elaborados para tratar dessa matéria e a sua repercussão.


[1] “2.2.8.1. Se do laudo técnico constar a informação de que o uso de equipamento, individual ou coletivo, elimina ou neutraliza a presença do agente nocivo, não caberá o enquadramento da atividade como especial.(destacamos)

[2] STJ. REsp nº 689.195/RJ. Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima. DJe de 22.08.2005; STJ. AgRg nos EDcl no REsp nº 1.457.154/SE. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. DJe de 12.02.2016.logo-jota