André Callegari

<p align="justify"><a name="_GoBack"></a> Alguns pontos ainda merecem reflexão quando se trata dos acordos de colaboração premiada porque, de fato, nem a doutrina e nem a jurisprudência ainda firmaram posição sobre eles. A ideia nesse breve texto é demonstrar que a Lei 12.850/13 foi omissa em alguns pontos crucias e noutros, deixou de explicitar um procedimento seguro para que se firme o acordo.</p>
<p align="justify">Ao menos em alguns pontos o STF já definiu a questão como o caso de que o acordo se trata de um negócio jurídico personalíssimo firmado entre o Estado e o colaborador, o que impede a impugnação do acordo por terceiros, por exemplo, os delatados<a href="#sdfootnote1sym" name="sdfootnote1anc">1</a>. E isso se deve ao fato de que as cláusulas do acordo em nada repercutem na esfera jurídica de terceiro, motivo pelo qual lhe faltaria interesse para a impugnação<a href="#sdfootnote2sym" name="sdfootnote2anc">2</a>.</p>
<ul class="jota-article__internal-links">
<li>+JOTA: <a href="https://www.jota.info/assine">Assine o JOTA e não deixe de ler nenhum destaque!</a></li>
</ul>
<p align="justify">Quanto ao sigilo do acordo a questão não está pacificada, pois há entendimentos de que ele pode ser levantado logo após a assinatura do contrato a pedido do MPF e por decisão do magistrado ou relator, embora haja vedação expressa na lei para que isso aconteça, porque, como se sabe, o sigilo deverá ser levantado quando oferecida a denúncia. Em nosso ponto de vista isso é coerente com a mesma interpretação que se dá ao acesso ao inquérito, ou seja, enquanto houver medidas de investigação em curso o acesso é negado ao advogado, fato este que não afronta a Súmula 14 do STF.</p>
<p align="justify">Nesse ponto há aspectos importantes que devem ser levados em consideração. Se o sigilo for levantado precocemente de um lado coloca em risco a investigação porque os delatados já terão ciência do que está sendo investigado e de outro coloca em risco o colaborador, que, de uma só vez, terá seu nome revelado há vários delatados.</p>
<p align="justify">A cláusula da não denúncia ou imunidade processual é outra que gera controvérsias sobre a sua aplicação. Apenas para lembrar que não se trata de um instituto novo, pois há muito já era utilizada no direito anglo-saxão nos casos das “testemunhas da coroa”, onde era concedido o prêmio ao arrependido que colaborasse com a justiça delatando os demais partícipes do fato delitivo<a href="#sdfootnote3sym" name="sdfootnote3anc">3</a>.</p>
<p align="justify">Aqui deve vigorar o princípio da oportunidade, embora não sendo a regra no Brasil, há uma mitigação ao princípio da obrigatoriedade da ação penal na própria Lei da Colaboração Premiada. Isso é uma opção do Estado que busca desvelar as atividades de organizações criminosas e, em troca, preserva o colaborador da ação penal. Entendemos que o prêmio pode e deve ser concedido em situações de interesse público e quando a colaboração for qualitativamente relevante para descortinar as atividades da organização criminosa.</p>
<p align="justify">A homologação do acordo e seus efeitos, embora já discutido pelo STF na PET 7074 QO ainda segue sendo relevante porque, de fato, a questão que ficou clara foi a de que o relator pode homologar o acordo sem a necessidade do colegiado, verificando, é claro, os requisitos da voluntariedade, regularidade e legalidade do documento firmado entre as partes, porém, sem adentrar no mérito dos prêmios.</p>
<p align="justify">Aliás, sobre essa questão a Corte já devolveu acordos onde as sanções premias estavam em desacordo com as previstas na legislação penal. De qualquer sorte uma questão que merece atenção são os reflexos da homologação na concessão dos prêmios acordados. Aparentemente houve consenso na Corte quando, por ocasião dos debates, decidiu-se que os prêmios pactuados deveriam ser honrados pelo Estado. Mas a questão não é tão simples e houve divergência no sentido de que, por exemplo, o Ministério Público não pode prometer o prêmio, mas tão somente pleiteá-lo, cabendo ao juiz, na hora da sentença decidir pela sua concessão caso cumprindo o acordo (Min. Gilmar Mendes)<a href="#sdfootnote4sym" name="sdfootnote4anc">4</a>.</p>
<p align="justify">De outro lado, deve-se recordar que está em jogo a segurança jurídica do acordo e do que foi prometido ao colaborador, portanto, ainda que a questão mereça ser revisita o certo é que se deve observar as regras que regem os contratos, bom como se preservar os princípios da segurança jurídica e da confiança.</p>
<p align="justify">Os pontos aqui trazidos na esteira do que foi já decidido pela Corte Constitucional parece que são os que ainda geram polêmica a respeito dos acordos firmados. Trouxemos, a título de exemplo, apenas alguns deles, mas é certo que há muitos outros que ainda deverão ter a necessária sedimentação dos debates do STF.</p>
<p align="justify">-------------------------------------</p>
<div id="sdfootnote1">
<p align="justify"><a href="#sdfootnote1anc" name="sdfootnote1sym">1</a> <span lang="en-US">CALLEGARI, André Luís; LINHARES, Raul Marques. Colaboração Premiada. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2019, p. 153 e ss. </span></p>
</div>
<div id="sdfootnote2">
<p align="justify"><a href="#sdfootnote2anc" name="sdfootnote2sym">2</a> <span lang="en-US">STF, Rcl 21258 AgR, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 15/03/2016.</span></p>
</div>
<div id="sdfootnote3">
<p><a href="#sdfootnote3anc" name="sdfootnote3sym">3</a> <span lang="en-US">CALLEGARI, André Luís; LINHARES, Raul Marques, ob. Cit., p. 124/125.</span></p>
</div>
<div id="sdfootnote4">
<p><a href="#sdfootnote4anc" name="sdfootnote4sym">4</a> <span lang="en-US">CALLEGARI, André Luís; LINHARES, Raul Marques, ob. Cit., p. 63 e ss. </span></p>
</div>


Delação_Joesley

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Lei 12.850/13 foi omissa em alguns pontos e noutros, deixou de explicitar um procedimento seguro para que se firme o acordo

Acordo de colaboração premiada: pontos para reflexão

Lei 12.850/13 foi omissa em alguns pontos e noutros, deixou de explicitar um procedimento seguro para que se firme o acordo