Mônica Thaís Souza Ribeiro

O dia 30 de dezembro será lembrado pela aprovação do aborto legal na Argentina, projeto em fase de sanção presidencial a ser assinado pelo Presidente Alberto Fernández. A aprovação simboliza a vitória das latinas no controle de seus corpos, no avanço da democracia e em especial, no direito à vida com o seguinte recado: nossos corpos são nossos. Estamos assistindo a uma revolução histórica dos nossos vizinhos.
Desde o nascimento, mulheres são socializadas à terceirização do controle de suas ações: sente-se assim, cruze as pernas. Fale sobre isso, não fale sobre aquilo, não ria alto. Comporte-se. Cale-se. Sorria. Não fique na rua, não é lugar de menina. Lugar de menina é em casa, na cozinha. Pedalar era proibido, sabia?<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> É preciso recordar as restrições impostas a nós, mulheres e explicar por que estamos falando obviedades em tempos modernos.
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Os simbolismos e significados que permeiam nossos corpos são muitos. O que nós precisamos falar é sobre corpos geopoliticamente marcados e a corporificação da política feminista e a subjetividade histórica das políticas de gênero. Políticas públicas que mantém um elevado número de mulheres mortas ou obrigadas a manter a gravidez, viola os tratados de direitos humanos.
Contudo, para determinados grupos, corpos femininos são usados como ferramentas de expressão de poder e controle.
Representantes do patriarcado seguem provocando náuseas sem qualquer constrangimento ao escrutínio público ao impedir o avanço da legislação e da proteção das mulheres em seu direito de decidir sobre o próprio corpo e a organização familiar.
No Brasil, mais de 5,5 milhões de crianças não têm o nome do pai na certidão de nascimento<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> e 1 a cada 5 mulheres já fizeram aborto até os 40 anos<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>. O que isso significa?
<blockquote class="jota-article__eye">Que o fato de ser proibido por lei não vai impedir que as mulheres abortem, o que nos faz refletir sobre a necessidade de olhar para a questão sob o ponto de vista da saúde pública e não de policial.</blockquote>
O que veremos em uma Argentina 2021 é um país que protege suas mulheres da morte em abortos clandestinos e esse número não é baixo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 55 milhões de abortos ocorreram no mundo entre 2010 e 2014 e quase metade aconteceu de forma clandestina<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>.
Tudo isso é relevante sob o aspecto da compreensão da política de regulação social por meio da criminalização, refletindo sobre os corpos femininos e do todo ao qual ele faz parte. A mudança social, a cultura transitória e todas as influências oriundas da participação das mulheres nas decisões políticas deve servir de mudança para protegermos vidas e garantir acesso à informação e à saúde.
Cidade do México, Cuba, Uruguai, Guiana e Guiana Francesa já legalizaram o aborto. Praticamente em todos os países da Europa não há penalização. A maioria dos abortos realizados de forma insegura e letal para mulheres ocorre em países em desenvolvimento que não possuem educação sexual.
Abortos acontecem, legalizados ou não, quer aceitem ou não os fundamentalistas. O mais importante é que aquelas que optarem por fazê-lo, não morram em procedimentos clandestinos, por ausência de suporte do Estado.
O que torna o processo da Argentina mais interessante ainda, é que a decisão partiu do Congresso, no exercício da construção de políticas públicas, quando em outros países a decisão veio das cortes. Os Hermanos têm o Papa, as empanadas, o alfajor, filmes premiados com Oscar, vacina para corona, e agora, consciência política com direito ao aborto legal.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Disponível em: &lt;<a href="http://www.escoladebicicleta.com.br/historiabicicletamulher.html">http://www.escoladebicicleta.com.br/historiabicicletamulher.html</a>&gt;. Acessado em 19 de dezembro de 2020.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Disponível em: &lt;<a href="https://www.cnj.jus.br/programa-pai-presente-completa-cinco-anos-e-se-consolida-no-pais/">https://www.cnj.jus.br/programa-pai-presente-completa-cinco-anos-e-se-consolida-no-pais/</a>&gt;. Acessado em 30 de dezembro de 2020.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Disponível em: &lt;https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext_pr&amp;pid=S1413-81232010011600001&gt;. Acessado em 30 de dezembro de 2020.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a>Disponível em: &lt;<a href="https://www.who.int/reproductivehealth/publications/unsafe_abortion/9789241548434/pt/">https://www.who.int/reproductivehealth/publications/unsafe_abortion/9789241548434/pt/</a>&gt;.. Acessado em 30 de dezembro de 2020.

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JOTA

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