Ruti Bender

Dalton Cesar Cordeiro de Miranda

Na esfera do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foram submetidos ao instituto do recurso representativo de controvérsia - RRC nº 278/STJ - os Recursos Especiais nº 1.913.392 e 1.908.497, tendo por finalidade dar solução ao seguinte debate: “(não) incide responsabilidade civil por danos materiais e morais coletivos decorrente do tráfego de veículo de carga com excesso de peso nas rodovias federais.” (destaques no original)
Adiantamos nossa opinião no sentido de que a matéria não é de simples resolução, pois orbitam o assunto distintas complexidades que, esperamos o STJ esteja realmente interessado a enfrentar.
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias" rel="attachment wp-att-291213"><img class="size-medium wp-image-291213 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tributos-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>A responsabilidade civil por danos materiais e morais coletivos decorrente do tráfego de veículos de carga com excesso de peso nas rodovias federais, e as ações civis ajuizadas para discussão do tema tomaram por fundamento o “Roteiro de Atuação – Combate ao Excesso de Cargas” elaborado pela Primeira Câmara de Coordenação e Revisão – GT Excesso de Cargas do Ministério Público Federal (MPF).
O ‘roteiro’ em questão está embasado no Parecer Técnico nº 73/2015/5ª CCR para, entre outros assuntos, determinar os embarcadores/transportadores como únicos responsáveis pela deterioração das rodovias federais; sendo ainda importante observar que mencionado ‘parecer’ está manifestamente eivado de vícios, segundo a análise de posicionamentos recorrentes do Tribunal de Contas da União (TCU) e exame de questões técnicas.
Tal afirmação exige ainda mais cuidado e novos ‘olhares’ pelo STJ quando do julgamento do RRC nº 278/STJ.
Em apertada síntese, pois o espaço a nós reservado assim reclama, destacamos que os principais equívocos identificados nas razões de agir do MPF residem na (i) desconsideração de todas as variáveis e de todos os entes direta e indiretamente envolvidos para exame do tema em apresentação (danos às rodovias federais e responsabilização); (ii) desconsideração da diminuição contínua de investimentos públicos para o modal rodoviário; (iii) falta de conhecimento sobre o operacional de carregamento e controle do peso (tipo de carga, acondicionamento, aferimento das balanças oficiais); (iv) o cálculo elaborado no ‘parecer’ parte do pressuposto de que o asfalto das rodovias federais é novo; (v) a vida útil arbitrada para as rodovias brasileiras é muito curta; (vi) a relação então empregada para relacionar o excesso de peso com o desgaste do pavimento superestima esse desgaste; (vii) adota metodologia que aponta um custo médio por acidente pelo menos duas vezes superior ao mais contemporâneo; (viii) a probabilidade arbitrada de acidente com vítima fatal não encontra respaldo na realidade e nos dados oficiais; (ix) há superestimação no valor utilizado para cálculo da receita diária de transporte; (x) não há razão para o dano causado por uma eventual influência sobre terceiros ser proporcional à receita; (xi) já existem penalidades administrativas para o transito com excesso de peso; e, (xii) ao utilizar um multiplicador de tamanho de empresa, o dado empregado faz dupla penalização dos embarcadores/transportadores, desconectando-se do dano que pode realmente estar sendo causado.
Diante de tantos erros o MPF, ao exclusivamente apontar como únicos responsáveis os embarcadores/transportadores para os danos às rodovias federais, omitindo-se a convocar os responsáveis pela sua adequada manutenção e conservação, ao contrário de trazer eficaz e eficiente solução ao problema, frisamos, não desconhecido, promove punições com efeitos funestos sobre o setor produtivo e, consequentemente, sobre a renda e o emprego, minimizando os esforços dos embarcadores/transportadores.
Vamos além em nossa narrativa, pois o MPF parece ter ido ‘atrás do dinheiro’, melhor colocando, ‘de quem teria o dinheiro’, abandonando a necessidade de ‘atacar’ todas as frentes e complexidades que envolvem a questão do excesso de peso no transporte de cargas e danos às rodovias federais.
Neste sentido, sobre a necessidade de um aprofundamento na análise do tema, não realizado, seria imperioso ao MPF ter levado em consideração – antes da adoção de medidas judiciais gravosas contra os embarcadores/transportadores - as constatações feitas pelo TCU, especialmente a problemática para o modal rodoviário brasileiro, tudo, ilustrativamente firmado no documento GRUPO I – CLASSE V – Plenário TC 010.173/2019-6 - Natureza: Relatório de Auditoria [1]; e/ou ainda a orientação consubstanciada no acórdão 2730/2009-Plenário [2]; e/ou no Acórdão 1745/2021 – Plenário [3].
Em apertada síntese, temos que a questão do transporte rodoviário de cargas no país (modal dominante na estrutura logística do país) necessita de um novo olhar crítico, inclusive pelo STJ e por ocasião do julgamento do CCR nº 278/STJ, sendo necessária a construção de uma solução decisória que interprete a efetiva responsabilidade de todos os agentes e atores responsáveis pela edificação (Administração e/ou Engenharia), conservação (Administração e/ou Concessionário) e utilização (Embarcadoras, Produtores rurais, Caminhoneiros e Transportadoras) do modal rodoviário nacional, afastando a ilegítima responsabilidade exclusiva nos moldes pretendidos pelo MPF, amparado em ‘roteiro’ e ‘parecer’ eivados de vícios.
O STJ necessita entregar justiça, e não ‘fazer’ justiça sem olhar a quem (que é coisa de ‘justiceiro’), para a matéria aqui apresentada.
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[1] Todavia, os desafios no setor de transportes ainda são muitos. Além dos gargalos de infraestrutura em si, demandando vultosos investimentos apenas para cobrir a sua depreciação a despeito de um cenário de forte escassez de recursos financeiros disponíveis, o país ainda enfrenta problemas nos instrumentos de planejamento governamentais vigentes. E se verifica também um gargalo burocrático que afeta diretamente a fluidez das operações de transporte e eleva o custo logístico nacional, principalmente devido à extensão da legislação tributária acessória, demandando a coexistência de grande quantidade de documentos eletrônicos e impressos e a obediência a diversas entidades anuentes do transporte.
(...)
Ao passo que se vivencia queda do investimento em infraestrutura de transportes, verificasse um aumento significativo das principais cargas demandantes de infraestrutura no país para seu escoamento para o mercado externo, como a soja, o milho e o minério de ferro. 
(...). A falta de planejamento governamental integrado dos transportes é também um dos empecilhos ao desenvolvimento de um sistema logístico mais eficiente.
[2] Recomenda-se à Administração, relativamente aos projetos de restauração ou manutenção de pavimentos em obras rodoviárias, identificar as características estruturais dos pavimentos existentes por meio de ensaios destrutivos e não-destrutivos, de forma a permitir a escolha da melhor solução técnica e econômica.
(...)
9.1.2.2. identifique as características estruturais dos pavimentos existentes por meio de ensaios destrutivos e não-destrutivos, de forma a permitir a escolha da melhor solução técnica e econômica;
[...]
9.1.5. avalie, tendo por base os critérios de conveniência e oportunidade, e com suporte em estudos a serem realizados por esse órgão, isoladamente ou em conjunto com o Ministério dos Transportes e da Agência Nacional de Transportes Terrestres, a possibilidade de substituir o modelo atual de contratação de manutenção e conservação de rodovias federais utilizado nos programas PIR IV e Crema, por outro, apto a garantir maior retorno econômico, qualidade e durabilidade dos investimentos, além de conforto e segurança aos usuários da malha rodoviária federal, capaz de evitar deficiências como as apontadas nestes autos, em especial quanto:
[...]
9.1.5.6. à generalização e inadequação de critérios de seleção de trechos incluídos nas soluções de intervenção, de modo a indicar segmentos de rodovia inaptos ao recebimento de soluções padronizadas, onde se verifica que trechos com boas condições são tratados de forma idêntica a trechos que necessitam de intervenção de caráter estrutural;
[3] I.1. Importância socioeconômica
O Contrato 501/2014 abrange os seguintes trechos rodoviários: BR-116/RS (km 296,50 ao km 397,60) , BR-153/RS (km 0,00 ao km 8,70 e km 373,80 ao km 437,00) , BR-290 (km 111,80 ao km 333,00) e BR-471 (km 138,80 ao km 197,90) . A imagem a seguir ilustra os segmentos abrangidos.
Os subtrechos abrangidos pelo contrato compreendem importantes rodovias federais que ligam o interior do estado do Rio Grande do Sul à região metropolitana de Porto Alegre. Constituem-se em eixos para o transporte de cargas e passageiros tanto para a capital do estado quanto para o litoral.
Além de atender a população local, as vias em questão, particularmente a rodovia BR-290/RS, estão entre as principais rotas para os turistas argentinos que visitam o litoral brasileiro utilizando-se do modal rodoviário. Em relação ao transporte de cargas, destaca-se a produção agropecuária da região, em especial os cultivos de soja, arroz, feijão e milho, bem como a criação de gado.
(...)
I.9. Medições indevidas dos serviços de manutenção
Observou-se que as medições dos serviços de manutenção e conservação da sinalização e dos dispositivos de segurança eram realizadas como se a contratada estivesse atingindo o desempenho máximo. Ocorre que a inspeção in loco e os diários de obras indicam deficiências na prestação dos serviços de manutenção pelo consórcio contratado. Identificou-se que a causa de tal discrepância estaria na existência de normativos internos do Dnit que previam o pagamento integral da parcela relativa a manutenção em condições desconformes com as previstas no edital.
(..)
I.10. Medições indevidas dos serviços de implantação
Constatou-se que parte dos serviços de implantação de sinalização horizontal medidos não haviam sido devidamente realizados, uma vez que, para segmentos das rodovias BR-290/RS (km 214-215) e BR-471/RS (km 170-174) , o contratado não realizou a substituição das tachas/tachões no eixo da rodovia pelos novos dispositivos, nos termos do previsto pelo projeto executivo. A completa realização dos serviços de sinalização horizontal, o que inclui a implantação de tachas/tachões, é condição indispensável para que se processe a medição dos serviços. Assim, aponta-se a existência de indícios de medições indevidas.

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JOTA

É necessário afastar a equivocada responsabilidade exclusiva pretendida pelo MPF

A responsabilidade do STJ quando da solução para o transporte de cargas nacional

É necessário afastar a equivocada responsabilidade exclusiva pretendida pelo MPF e para o tema quando do exame do RRC nº 278/STJ