Diego Pereira

Em uma sociedade complexa, acelerada e dinâmica, a resposta para diversos fenômenos que impactam a vida da população não é unidirecional, mas pautada em diversas linhas de frente e campos sociais como a política, o direito, a ciência e a história. Assim o é no caso das demandas ambientais.  
A literatura histórica informa que, por volta de 1850, 60% de todas as emissões globais de CO2 originados de combustíveis fósseis eram gerados da queima de carvão da Grã-Bretanha.  
Se a Revolução Industrial marca um período de modernidade na sociedade ocidental, inegável sua herança histórica na destruição do meio ambiente. Tanto é verdade que a era de grandes alterações na atmosfera, impactando o clima e a temperatura de forma desordenada, denomina-se antropoceno.  
Quando o tema é justiça climática e o agravamento das injustiças acentuadas pelo desenvolvimentismo das nações desenvolvidas do Norte global em detrimento da miséria do Sul global, reacende o tema da dívida climática – tema aparentemente teórico, muito bem conhecidos pela cor da pele, pela região geográfica e pelo sexo de quem reside no continente africano, na América Latina e na Ásia.  
Nesse contexto de crédito e débito, sujeito de direito e responsável pelo pagamento, que a imagem de opulência de um reinado levanta o debate do quanto deveria ser feito dentro do contexto climático e não o foi.  
Quando a rainha Elizabeth II assumiu o trono britânico em 1952, seu império já era responsável pela destruição ambiental mundo afora. Ali se iniciava, na década de 1950, a preocupação com a questão ambiental que, 20 anos depois, culminaria na primeira conferência mundial do clima, Estocolmo-1972. 
Depois disso, ainda no plano formal, o reinado da rainha Elizabeth II viu a criação do IPCC ligado à ONU e as conferências do clima ganharem corpo e, paralelamente, as reivindicações da sociedade civil e a academia a questionarem o que se chama de dívida climática: compromisso financeiro a ser assumido pelos países ricos que se basearam na industrialização e poluição do planeta em detrimento das nações pobres.  
A rainha morreu com esta dívida. Imprescritível e impessoal, o débito é assumido pelo novo rei e toda sua geração vindoura que desfrute da opulência do bem-estar social experimentado por seus nacionais.  
A dívida é histórica, real, ativa e cumulativa. A título de exemplo, os países africanos, muitos ex-colônias britânicas, são responsáveis por menos de 4% das emissões globais causadores do aquecimento do planeta, ao passo que é o continente que mais sofre com a mudança climática.  
A morte da rainha Elizabeth II se deu entre a última <a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/mercado/metas-da-cop26-pressionam-empresas-a-reduzir-emissoes-de-gases-de-efeito-estufa-22112021">Conferência do Clima em suas terras, em Glasgow</a>, e a próxima conferência, a acontecer no Egito. A oportunidade de assumir novos compromissos ambientais e suas respectivas dívidas climáticas-históricas cabe agora ao novo rei, Charles III, aparentemente engajado com a questão ambiental.  
O melhor entendimento da sociedade moderna deve incluir a ideia de mitigação ao princípio do poluidor-pagador, possibilitando que quem usufruiu, no passado, de uma condição de predador ambiental assuma responsabilidades com quem sofre consequências ainda hoje de tudo isso.  
A justiça pode até tardar, mas deve ter como fim nunca falhar. O nome disso é equidade e compromisso intergeracional, díade que dá suporte à questão climática atual.

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JOTA

Países africanos, muitos ex-colônias britânicas, são os que mais sofrem com a crise do clima

A rainha e sua dívida climática

A rainha Elizabeth II morreu com esta dívida. Imprescritível e impessoal, o débito é assumido pelo novo rei