José Augusto Fontoura Costa

Já de início, um paradoxo: a nova lex mercatoria se afirma constituída pela prática dos comerciantes internacionais, mas aparece pela pena de juristas e habita os textos jurídicos. Esse é apenas o primeiro dos aspectos dentre as diversas marcas da complexidade e diversidade do tema. Desde logo, marca a característica central do Direito do Comércio Internacional: a relação de tensão e complementaridade entre os modelos de negócios nascidos da prática negocial e as roupagens jurídicas possíveis em um ambiente normativo incerto, composto pelos vários direitos estatais mesclados entre si e com os instrumentos internacionais existentes.
O principal objetivo dessa <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/nova-lex-mercatoria">série de artigos</a>, iniciada agora, é o de discutir temas atuais de direto do comércio Internacional em vista da missão de dar a maior segurança e certeza possíveis aos negócios transfronteiriços. Não se trata, portanto, apenas do comércio de mercadorias, mas de quaisquer operações econômicas internacionais.
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias" rel="attachment wp-att-291213"><img class="size-medium wp-image-291213 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tributos-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>
Sabe-se haver imensa variedade desses negócios e isso traça um panorama bem diverso daquele que gestou a lex mercatoria medieval, quando as operações eram claramente centradas no intercâmbio de mercadorias e valores, sem que houvesse investimento estrangeiro em atividades produtivas ou preocupações com a proteção de direitos intelectuais, por exemplo. A produção, ainda que pudesse empregar algum insumo estrangeiro, era organizada localmente.
Entretanto, hoje as cadeias produtivas são, muitas vezes, integradas internacionalmente e formas financeiras possibilitam ampla circulação de ativos securitizados. Tudo isso faz parte do Direito do Comércio Internacional atual.
Bem se poderia deixar de lado as operações econômicas mais complexas e restringir a noção ao comércio em sentido estrito. Aí a nova lex mercatoria seria muito próxima da antiga: importações e exportações, transporte, títulos de crédito, pagamentos. Contratos formulares e cláusulas padronizadas, adequados aos negócios repetitivos nos setores de commodities, já são mais que centenários e passaram por muita reiteração entre atores circunscritos a comunidades setoriais restritas.
Essa é uma abordagem importante, central para a nova lex mercatoria, mas deve ser complementada pela ponta dos relacionamentos de alta complexidade, entre partes que não se relacionam amiúde, muitas vezes detêm competências e experiências diferentes e tratam de amalgamar suas posições em um contato de escopo amplo, de longa duração. Conjuntos de acordos coligados, joint ventures e a formação de pessoas jurídicas são algumas das formas jurídicas relevantes para esse campo, em que as relações vão bem além da troca de mercadorias.
<blockquote class="jota-article__eye">Na prática, porém, a referência voluntária à lex mercatoria nos contratos internacionais é rara. A busca da segurança e certeza é normalmente repelida por algo com contornos tão imprecisos quanto os usos e costumes do comércio Internacional.</blockquote>
Jamais seria razoável substituir um bom contrato formular ou um acordo detalhado pela mera indicação de práticas internacionais. Necessário, porém, seu emprego interpretativo e integrativo dos contratos internacionais. Com efeito, a leitura cuidadosa dos instrumentos contratuais, privilegiando a visão negocial, conduzirá o juiz ou o árbitro a uma compreensão informada por práticas entre as partes e do setor em que atuam.
Ainda há mais complexidade: quaisquer operações econômicas se concretizam em ambientes controlados e regulados pelo puder estatal. Nesse sentido, o Direito do Comércio Internacional não deve abandonar a atuação pública dos Estados e os elementos de formulação e concreçâo de políticas unilateralmente impostas ou internacionailmente concertadas em vários foros internacionais.
Mais que isso: políticas de desenvolvimento, proteção ambiental, concorrência, liberalização commercial e atração de investimentos são, entre outras, componentes do pano de fundo jurídico sobre o qual as relações privadas se projetam. Nesse sentido, o impacto de fontes normativas internas e internacionais se mostra fecundo para a compreensão do comércio Internacional; bastante diferente da busca de um isolamento autonomista defendido por importantes juristas dessa área, iniciando pelo próprio Berthold Goldman, artifice da teoria e da própria denominação da nova lex mercatoria.
Intimamente ligados, os negócios e as formas jurídicas colocam os desafios diários do Direito do Comércio Internacional. Daí a inspiração dessa série de artigos. O desafio é trazer questões negociais e jurídicas atuais e as discutir do ponto de vista do Direito, sem deixar de lado a estrutura das operações econômicas internacionais.
Muitas questões, poucas respostas cabais e abertura a formas ampolas de discussão, essa a intenção dessa série. Fica o convite às reflexão e participação.
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JOTA

Os amplos campos do comércio internacional

A nova lex mercatoria é mais complexa do que parece

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