Filipe Denki

Nathalia Machado

É incumbência do legislador infraconstitucional regulamentar os meios pelos quais serão atingidos os direitos e garantias constitucionais no tocante à ordem econômica e, para tanto, foi redigida a Lei nº 11.101/2005 conhecida como Lei de Recuperação judicial, extrajudicial e falência (LRE), que foi recentemente alterada pela Lei nº 14.112/2020.
A Lei nº 11.101/2005, em seu artigo 47 dispõe que a recuperação judicial tem a finalidade possibilitar “a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”, mediante mecanismos que possibilitem a superação da crise econômico-financeira enfrentada pela empresa, objetivando a “manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores”.
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>A recuperação judicial instituída pela Lei nº 11.101/05 é um benefício concedido as empresas viáveis em dificuldade econômico-financeira para o seu soerguimento e, via de regra, benefícios implicam contraprestações.
Para que o judiciário conceda a recuperação judicial, a empresa pleiteadora deverá cumprir determinados requisitos e deveres. Sendo o dever que interessa à discussão suscitada neste artigo o de instruir com as informações e documentos previstos no do art. 51, III, da Lei 11.101/2005, in verbis: Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:  III - a relação nominal completa dos credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço físico e eletrônico de cada um, a natureza, conforme estabelecido nos arts. 83 e 84 desta Lei, e o valor atualizado do crédito, com a discriminação de sua origem, e o regime dos vencimentos; 
Da leitura do dispositivo legal supracitado, infere-se que é obrigação do devedor interessado em obter o benefício da recuperação judicial apresentar os documentos obrigatórios indicados no artigo alhures, de modo a conferir ao magistrado a análise preliminar que possibilidade o deferimento do processamento da recuperação judicial.
<blockquote class="jota-article__eye">Nos processos de recuperação judicial existe o procedimento de verificação de crédito administrativa e judicial.</blockquote>
Na fase administrativa após a apresentação pela devedora da relação nominal dos credores poderá o credor caso seu crédito não conste no referido rol, ou conste, mas esteja incorreto solicitar sua habilitação/divergência de crédito perante o administrador judicial que procederá sua verificação e finalizada essa etapa apresentar uma segunda relação de credores.
Nesta fase a própria devedora pode retificar a relação de relações dos credores por ela apresentada, desde que apresente os documentos comprobatórios para exclusão ou inclusão de novos credores.
Após a conclusão da fase de verificação de crédito administrativa judicial, inicia-se a fase judicial, para que os credores que não tiverem seus créditos habilitados ou inseridos indevidamente ou contenha alguma inconsistência na relação de credores apresentada pelo administrador judicial possam fazer suas considerações, para assim formar o quadro geral de credores.
Na legislação, não é previsto a habilitação de crédito como uma obrigação pelo credor, portanto, entendemos que não cabe ao credor optar pelo mais oneroso para o recebimento de seu crédito, já que o plano de recuperação judicial das devedoras geralmente prevê deságio colossais, anos de carência e pagamento em que se protraem nos anos.
Compartilha desse entendimento o ilustre jurista Manoel Justino Bezerra, “a habilitação não é obrigação do credor e sim, prerrogativa que pode ou não ser exercida por ele a partir de sua própria vontade”.<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>
Destarte, se superada a fase de verificação dos créditos e esta quedar-se inerte, ocorrerá a preclusão da devedora em incluir o crédito na recuperação judicial.
Para o jurista Fábio Ulhôa Coelho<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>: O objetivo do processo de recuperação judicial não é o saneamento da crise econômico-financeira da empresa recuperanda. Em termos exatos, o objetivo é a celebração de um acordo entre devedor e seus credores, no ambiente de um processo judicial, que vise o saneamento da crise econômico-financeira da empresa recuperanda.
Nesta linha de raciocínio, se o crédito não foi informado pelo devedor nas oportunidades previstas em lei, este não será submetido aos efeitos da recuperação judicial, como, por exemplo, a novação (art. 59, da Lei 11.101/2005).
Recentemente a 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça em julgamento do REsp. 1.851.692/RS<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a> firmou entendimento de que é faculdade do credor preterido a habitação de seu crédito, ainda que se trate de crédito concursal, in verbis:
RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CRÉDITO CONCURSAL. NECESSIDADE DE HABILITAÇÃO DO CRÉDITO NO QUADRO GERAL DE CREDORES DA SOCIEDADE EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. FACULDADE DO CREDOR PRETERIDO. 1. O titular do crédito que for voluntariamente excluído do plano recuperacional, detém a prerrogativa de decidir entre habilitar o seu crédito ou promover a execução individual após finda a recuperação. 2. De fato, se a obrigação não for abrangida pelo acordo recuperacional, ficando suprimida do plano, não haverá falar em novação, excluindo-se o crédito da recuperação, o qual, por conseguinte, poderá ser satisfeito pelas vias ordinárias (execução ou cumprimento de sentença). 3. Caso o credor excluído tenha optado pela execução individual, ficará obrigado a aguardar o encerramento da recuperação judicial e assumir as consequências jurídicas (processuais e materiais) de sua escolha para só então dar prosseguimento ao feito, em consonância com o procedimento estabelecido pelo CPC. 4. Na hipótese, tendo o credor sido excluído do plano recuperacional e optado por prosseguir com o processo executivo, não poderá ser ele obrigado a habilitar o seu crédito. 5. Recurso especial provido.
No aludido caso o credor não teve seu crédito arrolado no quadro geral de credores, bem como não houve reserva de valores pelo administrador judicial, razão pelo qual demonstrou que têm interesse em prosseguir com a execução individual de seu crédito após o encerramento da recuperação judicial, alegando que não pode ser imposta a habilitação retardatária.
Assim, no julgamento do recurso especial, decidiu a 4ª turma que tendo o credor sido excluído do plano recuperacional e optado por prosseguir com o processo executivo, não poderá ser obrigado a habilitar o seu crédito.
Por outro lado, caso o credor excluído tenha optado pela execução individual, este deverá aguardar o encerramento da recuperação judicial e assumir as consequências jurídicas (processuais e materiais) de sua escolha para só então dar prosseguimento ao feito, em consonância com o procedimento estabelecido pelo CPC.
No âmbito do STJ, a Segunda Seção, ainda que para fins de delimitação de competência, decidiu a tese de que "a habilitação é providência que cabe ao credor, mas a este não se impõe. Caso decida aguardar o término da recuperação para prosseguir na busca individual de seu crédito, é direito que se lhe assegura (salvo se a recuperação judicial for convolada em falência" (CC 114.952/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/09/2011, DJe 26/09/2011).
Coadunamos com o entendimento firmado pela 4ª turma do STJ, a recuperação judicial por se tratar de uma benesse prevista em lei para o empresário ou sociedade empresária em dificuldade financeira viável, cabe a estes estarem atentos na apresentação da relação de credores que pretendem submeter os seus efeitos, ressalvados a exceções previstas em lei, não podendo impor ao credor a habilitação de seu crédito, ainda que sujeito por lei, quando este não devidamente arrolado pela devedora, optando assim pelo mais gravoso para a satisfação de seu crédito.
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<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> (BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas e falência: Lei 11.101/2005 comentada artigo por artigo. São Paulo: RT, 2018, p. 101).
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à lei de falência e de recuperação de empresas. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 253).
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> (REsp 1851692/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/05/2021, DJe 29/06/2021).

recuperação judicial

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JOTA

É responsabilidade da empresa em recuperação mostrar a relação de credores a serem submetidos aos seus efeitos

A negligência da devedora em recuperação judicial na discriminação de credores

É responsabilidade da empresa em recuperação mostrar a relação de credores a serem submetidos aos seus efeitos