Luiz Francisco Torquato Avolio

Maria Luiza Gorga

Nesta última parte, retomaremos <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-inadmissibilidade-das-provas-ilicitas-prova-penal-e-segredo-profissional-04022021">alguns pontos</a> recentes acerca da questão do <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-inadmissibilidade-das-provas-ilicitas-prova-penal-e-segredo-profissional-2-11022021">sigilo profissional</a>, bem como apresentaremos nossa conclusão sobre o tema.
Breve incursão acerca do sigilo funcional no Brasil da atualidade
Para finalizar nossa abordagem, tendo em vista os recentes acontecimentos ligados a autoridades envolvidas em procedimentos de projeção nacional, o sigilo funcional ganha relevância ímpar.
Sabe-se que no processo penal de feitio acusatório, como almeja ser o brasileiro, busca-se a paridade de armas entre acusação e defesa, cumprindo ao juiz velar por esse equilíbrio, sob pena de, numa posição puramente adversarial da lide penal, fazer o decantado papel de um convidado de pedra.
<a href="https://conteudo.jota.info/poder-contato"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>Inobstante, mantém as autoridades, a despeito do cargo exercido, sua qualidade de cidadão comum, sem renunciar à proteção que lhes garante a liberdade de expressão. Dessa maneira, não há confundir, nesse passo, o sigilo funcional do promotor ou do juiz com o direito de se manifestar perante a imprensa ou a mídia em geral, incluindo-se as redes sociais.
E, de fato, o tópico do vazamento de informações de procedimentos sigilosos vem causando discórdia entre advogados e autoridades, motivando inclusive a nova redação da Resolução nº 59 do Conselho Nacional de Justiça que, em seu art. 17, caput e §1º prevê a responsabilização pelo fornecimento de “quaisquer informações, direta ou indiretamente, a terceiros ou a órgão de comunicação social, de elementos sigilosos contidos em processos ou inquéritos”, com a “imediata apuração dos fatos pelas autoridades competentes, sob pena de responsabilização”.
A esse respeito, além da tipificação do crime de violação do sigilo funcional no art. 325 do Código Penal, também a questão é normatizada pela Lei Orgânica da Magistratura (art. 36, III), sendo que a mesma vedação alcança os membros do Ministério Público, conforme a Lei Complementar nº 75/1993 (art. 236, II), fazendo-se ainda aplicável a Resolução 23/2007 do Conselho Nacional do Ministério Público (art. 8º).
<blockquote class="jota-article__eye">Para exemplificar, já houve o entendimento de que tais situações de divulgação seriam inadmissíveis, e até forma de amadorismo do membro do Parquet<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, sendo necessária a vedação do agir midiático e voltado à promoção pessoal, o que viola inclusive a moralidade administrativa<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.</blockquote>
Desse modo, embora seja inegável o dever de sigilo que tais profissionais devem guardar, sendo este de grau tal que inclusive pode vir a sobrepor-se ao direito à livre manifestação de ideias e expressão, também é certo que as regras acima não podem ser consideradas mordaças às autoridades, impedindo-as de expressar qualquer tipo de opinião, devendo valer o bom senso e, nos excessos, deixando-se para a Justiça e os Conselhos o julgamento e as punições administrativas e criminais eventualmente aplicáveis.
Inobstante as valorações de cunho moral ou de sopesamento das liberdades individuais da autoridade, certo é que, se uma prova for obtida – comprovadamente – mediante violação do sigilo funcional, esta será considerada ilícita e deverá ser desentranhada dos autos, posto que oriunda de fato criminoso e, dessa forma, inadmissível no processo com fundamento constitucional.
Por todo o exposto, é possível verificar de forma bastante clara o sopesamento realizado pelo legislador ao balancear, de um lado, o interesse do Estado no esclarecimento de delitos e, de outro, o interesse também do Estado na paz social e no bom funcionamento de instituições que tratam da resolução de conflitos privados e apaziguamento social através do cuidado com o corpo, a mente, e as atividades dos cidadãos, bem como a preservação da moralidade das instituições através de certo controle da manifestação das autoridades individualmente consideradas.
Dessa forma, compreende-se a função de manutenção de parte do tecido social – e, verdadeiramente, do contrato social – que as regras de inadmissibilidade de provas consideradas ilícitas exercem na sociedade, resguardando o respeito às decisões judiciais para que estas sejam consideradas justas e razoáveis.
A título de conclusões, permitimo-nos alinhar as seguintes:
a) São ilícitas as provas colhidas fora do processo e admitidas com violação a normas e princípios de direito constitucional, e também de direito material, e ilegítimas as provas cuja produção revelou-se irritual em relação às normas processuais;
b) Apesar da previsão legal da inadmissibilidade das provas ilícitas no processo penal, a distinção entre provas ilícitas e ilegítimas afigura-se ainda relevante do ponto de vista doutrinário e prático, tendo em vista os efeitos de sua utilização, acarretando as ilícitas a sua inadmissibilidade e consequente inutilização, enquanto as ilegítimas a sua nulidade, ressalvada eventual repetição da produção desse meio de prova segundo os parâmetros legais;
c) O sigilo profissional constitui matéria de ordem pública, eis que concebido enquanto salvaguarda do direito de defesa;
d) A quebra do sigilo profissional só é admitida excepcionalmente, na presença das hipóteses legais, sob pena de constituir prova ilícita ou ilegítima, consoante a violação se verifique fora ou dentro do processo, respectivamente;
e) Da espécie sigilo médico, podem-se extrair três modalidades: o segredo oral – as confidências dos pacientes e as observações do profissional –, o segredo documental – sobretudo recaindo sobre o prontuário médico, bem como outros documentos como exames –, e o segredo processual – consubstanciado pelo laudo pericial civil, administrativo ou criminal;
f) Ressalvadas as hipóteses legais, não pode o médico revelar o sigilo de forma que prejudique o paciente ou o exponha a processo criminal;
g) O sigilo profissional do advogado constitui garantia atinente à ampla defesa, só podendo ser afastado na forma da lei (CPP, art. 243 § 2º, e Estatuto da Advocacia, art. 7º, II, § 6º e 7º);
h) Embora definido pelo legislador dentre os direitos do advogado, trata-se, na verdade de um dever, conquanto relativo, que pode ceder somente em casos excepcionais, em face de outros valores relevantes, como a dignidade profissional, a honra e a imagem do advogado;
i) A tutela do sigilo profissional do advogado envolve a inviolabilidade do escritório e das comunicações do advogado, inclusive com o cliente preso;
j) A interceptação telefônica de terminais de escritórios de advocacia é prática altamente condenável, não podendo atingir, igualmente, os meios de comunicação e arquivos individuais dos advogados relacionados a seus clientes, salvo as hipóteses legais;
k) Conquanto a gravação clandestina não se afigure de per si ilícita, por não interferir com o sigilo das comunicações telefônicas, pode implicar ofensa ao direito à intimidade, tutelado no inciso X do art. 5º da CF, na expressão do direito à reserva, que é a expectativa de não ver divulgados fatos confiados a um interlocutor, em caráter confidencial, como decorrência, muitas vezes, do sigilo profissional; e
l) O direito de livre expressão dos magistrados e promotores de Justiça não pode ser censurado, salvo se constituir violação do sigilo funcional, o que acarreta a inadmissibilidade das provas decorrentes.
Frente a tais conclusões e a tudo quanto o exposto, nos afigura necessária a melhor regulamentação da questão, de modo que as balizas sejam definidas e respeitadas de modo uniforme, não se deixando ao arbítrio de julgadores decidi-las.
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O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
https://youtu.be/-hMj5lwWXEE
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> CNMP, PAD 0.00.000.000981/2011-56, relator conselheiro nacional Almino Afonso, j. 18.04.2012.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> CNMP, Recurso Interno em Reclamação Disciplinar 0.00.000.000482/2009-44, relator conselheiro Cláudio Barros Silva, j. 31.05.2011.

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JOTA

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