Celso Pansera

Igor Nogueira Calvet

As compras governamentais têm se tornado um tema de disputa entre o Mercosul e a União Europeia, levantando questões cruciais sobre a importância de o Brasil preservar o direito de adotar essa política pública. Esse tema central nas negociações do acordo entre os dois blocos comerciais diz respeito à possibilidade de empresas sediadas no Mercosul e na União Europeia participarem, em igualdade de condições, de processos de aquisição pública de bens e serviços, dificultando assim a priorização de empresas locais pelos governos com o intuito de estimular a produção interna.
Garantir que o Brasil preserve o direito de fazer compras governamentais como uma política industrial e de inovação é estratégico para o desenvolvimento econômico do país, e a preservação desse direito ganha ainda mais relevância quando consideramos a importância das encomendas tecnológicas e das compras públicas de inovação.
As encomendas tecnológicas envolvem a aquisição de produtos e serviços de alta tecnologia. Quando feitas por empresas nacionais, impulsionam o avanço científico e tecnológico do país. As compras públicas de inovação são uma maneira eficiente de estimular o surgimento no país de novas empresas e startups, fomentando o empreendedorismo e a geração de empregos qualificados.
A história mostra que a atual liderança tecnológica de Estados Unidos, China, Japão e da própria Europa foi alcançada com intenso uso das compras públicas que privilegiavam as empresas locais. É fundamental que o Brasil se alinhe a essa tendência global e aproveite o potencial das compras governamentais como instrumento de desenvolvimento tecnológico. Além dos benefícios econômicos, as compras governamentais de tecnologia e inovação têm impactos significativos no desenvolvimento social. Ao incentivar a pesquisa e o desenvolvimento nacional de novas tecnologias pode-se criar soluções em áreas como telemedicina, mobilidade urbana, segurança pública, despoluição de cursos d’agua e novos medicamentos, por exemplo.
As compras públicas podem exercer, também, o papel de aglutinadora nas relações entre o governo, instituições de pesquisa, universidades e empresas nacionais, incentivando a colaboração e a transferência de conhecimento dentro do território. Em seus mais de 50 anos de existência, a Finep tem apoiado os atores do ecossistema de inovação com instrumentos pela ótica da oferta, e certamente exercerá um papel fundamental nas políticas pelo lado da demanda. A ABDI, por sua vez, lançou a iniciativa Hubtec com objetivo de apoiar outras instituições governamentais interessadas na execução das Encomendas Tecnológicas. Quanto maior for a liberdade para selecionar fornecedores nacionais, maior serão os impactos dessas iniciativas.
É sempre bom lembrar que as compras públicas no Brasil somam mais de 9% do Produto Interno Bruto (PIB). Se apenas uma fração deste enorme volume de recursos for empregada para fomentar o desenvolvimento tecnológico e a inovação no país, então, pela primeira vez, teríamos a chance de enfrentar nossos históricos desafios socioeconômicos através do desenvolvimento tecnológico guiado por uma demanda pública.
Em lugar nenhum do mundo se fala em política industrial sem o uso intensivo das compras públicas para inovação e das encomendas tecnológicas. Nenhum país líder abriu mão desses instrumentos para gerar tecnologia nacional. Por que faríamos isso, justamente agora que criamos as condições internas para tanto?

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JOTA

Tema é alvo de disputa entre Mercosul e União Europeia

A importância de o Brasil preservar o direito de fazer compras governamentais

Tema das compras governamentais é alvo de disputa entre Mercosul e União Europeia em negociação de tratado de livre comércio