Alessandra Okuma

Há alguns meses os importadores de bens de capital (BK) e de bens de informática e telecomunicações (BIT) enfrentam dificuldades em relação aos seus pleitos de novos ex-tarifarios. Os que conseguem obter seu deferimento, tiveram restrições injustificadas, como a limitação por uma determinada faixa de preço estabelecida de acordo com a cotação do dólar da data do pedido; a revogação intempestiva e desmotivada e; a redução do prazo de validade desse incentivo.
Mais recentemente, a imprensa noticiou a iminente revogação de todos os ex-tarifarios, tendo em vista discussões no MERCOSUL. O argumento adotado pelo Ministério da Economia<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> é que o Brasil teria uma autorização transitória para conceder isenções do imposto de importação, cujo prazo terminaria no dia 31 de dezembro de 2021.
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias" rel="attachment wp-att-291213"><img class="size-medium wp-image-291213 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tributos-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>No entanto, esse argumento decorre de uma interpretação equivocada da Decisão nº 25/2015, do Conselho do Mercado Comum do Mercosul. Vejamos.
A concessão de ex-tarifário para bens de capital tem como fundamento o artigo 17 do Decreto-lei 37/66, que beneficia com isenção produtos sem similar nacional. Referido Decreto-lei, que veicula a regra-matriz do imposto de importação, foi recepcionado pela Constituição atual com força de lei ordinária.
Verificada ausência de produto nacional em condições de substituir o importado, deve ser a isenção do imposto de importação sem qualquer restrição. Não há discricionariedade do Poder Executivo nessas condições.
A concessão de ex-tarifário  é o resultado de um procedimento regulado pelo devido processo legal e pela ampla defesa, regulamentado pela Portaria 309/2019.
O procedimento inicia-se com o requerimento de ex-tarifário, apresentado pelo interessado e acompanhado de documentos e da descrição do produto. A seguir, passa-se à análise preliminar dos requisitos. Aceito requerimento, realiza-se consulta pública para que os fabricantes nacionais, associações ou órgãos e entidades do governo possam apresentar a contestação. A contestação deve estar acompanhada de provas como especificação do bem nacional e do equivalente importado, quadro comparativo, literatura técnica, comprovação de fornecimento dos últimos anos, prazo de entrega, preço de fábrica e outras. Admitida a contestação, o Requerente pode se manifestar no prazo de dez dias.
A Portaria 309/2019 estabelece critérios para a apuração da existência de produção nacional, análise técnica e das recomendações; determina a concessão ou o indeferimento do pedido; bem como procedimentos de alteração e  revogação.
A concessão de ex-tarifários não é um cheque em branco ao Comitê-Executivo de Gestão da Câmara de Comercio Exterior – GECEX, mas tem seus limites claros nas Leis, nos Decretos e na própria Portaria 309/2019. Tanto a  concessão quanto a revogação devem ser feitas por ato motivado, segundo o devido processo legal, contraditório e ampla defesa.
No âmbito do Mercosul, a concessão de ex-tarifário para bens de capital está regulamentada pelo Decreto 5078/2004, que dispõe sobre a execução do Quadragésimo Oitavo Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica no 18, entre os Governos da República Federativa do Brasil, da República Argentina, da República do Paraguai e da República Oriental do Uruguai.
O artigo 7º do Decreto 5078/2004 prevê que bens de capital não produzidos no Mercosul terão isenção durante o prazo mínimo de 21 meses:
“Art. 7 - Os bens incluídos nas listas previstas nos artigos 2 e 3 desta Resolução, serão importados com as alíquotas definidas no presente regime especial de importação por no mínimo 21 meses e no máximo de 27 meses, contados a partir da data prevista para a incorporação da Diretriz que aprovou a inclusão do produto na Lista Comum ou da entrada em vigência da norma interna que modifica as Listas Nacionais, respeitado o disposto no artigo 11 do presente Anexo.”
A lista de produtos brasileiros que são exceção à tarifa externa comum encontra-se disponível no site do Ministério da Economia (<a href="http://www.camex.gov.br/comite-de-alteracoes-tarifarias-cat/98-assuntos/2653-lista-brasileira-de-excecoes-a-tec-letec">http://www.camex.gov.br/comite-de-alteracoes-tarifarias-cat/98-assuntos/2653-lista-brasileira-de-excecoes-a-tec-letec</a>) e, como o próprio nome diz,  a lista inclui todos os produtos ex-tarifários.
Como se depreende, a justificativa do Ministério da Economia de que normas do Mercosul impediriam a manutenção do regime de ex-tarifários depois de 31 de dezembro de 2021 não está em conformidade com o artigo 7º do Decreto 5078/2004.
Sim, temos um mercado comum e de uma política tarifaria uniforme, mas há uma lista de exceções<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> prevista no art. 6, anexo I, do Tratado de Assunção (Decreto 350/91).
Os tratados internacionais devidamente incorporados ao nosso ordenamento jurídico devem ser respeitados pelas leis internas, nos termos do art. 98 do CTN.
O Brasil, assim como os demais países do Mercosul, tem soberania (art. 1º. da Constituição Federal) e competência tributária (arts. 22, VII e 153, I da Constituição Federal) que lhe permitem definir exceções à tarifa externa comum (TEC) para atender os interesses econômicos e sociais do país.
O fato de não haver produto similar produzido no Brasil, nem no Mercosul, também é determinante para justificar a concessão de isenção do imposto de importação, como prevê o art. 17 do Decreto-lei 37/66, pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Para conferir segurança jurídica e previsibilidade aos empreendedores, o prazo de vigência dos ex-tarifários previsto nas Resoluções da CAMEX 08/2001, 35/2006, 17/2012, 66/2014 é de dois anos.
A possibilidade de concessão de ex-tarifários pelo prazo mínimo de 21 meses previsto no art. 7 do Decreto 5078/2004 não foi revogada pela Decisão Mercosul 25/15.
Ao contrário, prevalece o direito de manter exceções à tarifa externa comum, nos termos do art. 6, anexo I, do Tratado de Assunção (Decreto 350/91). Essa disposição deve ser respeitada por todos os atos infralegais, em consonância com o art. 98 do CTN e pelo princípio da especialidade insculpido no art. 2º., § 2º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro- LINDB<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
Assim sendo, a Decisão Mercosul 25/15 não justifica a revogação de ex-tarifarios antes do prazo mínimo de 21 meses, nem impede a concessão de isenções aos bens de capital, como autorizam os arts. 153, I da CF, o art. 17 do Decreto-lei 37/66 e o art. 6, anexo I, do Tratado de Assunção.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> <a href="https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/05/28/tributacao-vira-incerteza-para-geradora-solar.ghtml">https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/05/28/tributacao-vira-incerteza-para-geradora-solar.ghtml</a>
https://inforchannel.com.br/2021/06/29/ex-tarifario-como-sua-possivel-e-iminente-revogacao-impacta-a-economia-brasileira/
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a>  Estarão excluídos do cronograma de desgravação a que se referem os Artigos Terceiro e Quarto do presente Anexo os produtos compreendidos nas Listas de Exceções apresentadas por cada um dos Estados Partes com as seguintes quantidades de itens NALADI. (...)
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> “Art. 2o  Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
<ul>
<li>
1o  A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
</li>
<li>
2o  A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.”
</li>
</ul>

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JOTA

Argumento do governo é que o Brasil teria uma autorização transitória para conceder isenções do imposto de importação

A ilegal revogação de ex-tarifários

Argumento do ME é que o Brasil teria uma autorização transitória para conceder isenções do imposto de importação