Geoffrey A. Manne

Mario A. Zúñiga

A <a href="https://www.tn.gov/content/dam/tn/attorneygeneral/documents/pr/2024/pr24-59-Google.pdf">decisão</a> do juiz Amit Mehta contra o Google no caso antitruste do Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DOJ) sobre a sua ferramenta de busca foi recebida <a href="https://www.nytimes.com/2024/08/05/technology/google-antitrust-ruling.html#:~:text=%E2%80%9CThis%20is%20the%20most%20important%20antitrust%20case%20of%20the%20century%2C%20and%20it%E2%80%99s%20the%20first%20of%20a%20big%20slate%20of%20cases%20to%20come%20down%20against%20Big%20Tech%2C%E2%80%9D%20said%20Rebecca%20Haw%20Allensworth%2C%20a%20professor%20at%20Vanderbilt%20University%E2%80%99s%20law%20school%20who%20studies%20antitrust.%20%E2%80%9CIt%E2%80%99s%20a%20huge%20turning%20point.%E2%80%9D">com grande alarde</a> por muitos.
Embora acreditemos que a decisão seja errônea, alguns especialistas a consideram uma vitória histórica para o DOJ, especialmente seu líder, Jonathan Kanter, que a considera "<a href="https://www.politico.com/newsletters/west-wing-playbook/2024/08/13/the-mt-rushmore-of-antitrust-cases-00173847">o Monte Rushmore dos casos antitruste</a>". Mas essa perspectiva não compreende a história do antitruste em setores de tecnologia e a importância dessa decisão específica.
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O caso dos EUA é semelhante às preocupações levantadas pelo <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/CADE">Cade</a>, que investigou as práticas do Google no mercado brasileiro. Embora os aspectos específicos sejam diferentes, os princípios subjacentes são relevantes para ambos os países.
As alegações de que essa é "a primeira grande decisão antitruste contra um gigante da tecnologia" são exageradas. Houve várias ações antitruste e julgamentos administrativos contra as big techs, incluindo bem-sucedidas contestações de atos de concentração e perdas em processos. E os órgãos reguladores fora dos EUA, especialmente na Europa, moveram (e ganharam) vários processos judiciais.
Somente nos Estados Unidos, vários foram os casos de decisões recentes que decidiram contra as gigantes de tecnologia. Por exemplo, um júri <a href="https://www.theverge.com/23994174/epic-google-trial-jury-verdict-monopoly-google-play">decidiu recentemente contra o Google</a> em um processo antitruste movido pela Epic Games em relação ao Google Play Store, concluindo que "o Google adquiriu ou manteve intencionalmente um poder de monopólio ao se envolver em conduta anticompetitiva".
As autoridades antitruste <a href="https://www.ftc.gov/news-events/news/press-releases/2024/01/statement-regarding-termination-amazons-proposed-acquisition-irobot">impediram a Amazon de comprar a iRobot</a>, e a Federal Trade Commission (FTC) continua a contestar a <a href="https://www.courtlistener.com/docket/67605176/ftc-v-microsoft-corporation/?filed_after=&amp;filed_before=&amp;entry_gte=&amp;entry_lte=&amp;order_by=desc">aquisição da Activision pela Microsoft</a> e a <a href="https://www.govinfo.gov/content/pkg/USCOURTS-dcd-1_20-cv-03590/pdf/USCOURTS-dcd-1_20-cv-03590-1.pdf">compra do WhatsApp e do Instagram pela Meta</a>. O caso EUA vs. Google pode ser o mais divulgado e recente deles, mas é incorreto <a href="https://www.politico.com/newsletters/west-wing-playbook/2024/08/13/the-mt-rushmore-of-antitrust-cases-00173847">afirmar</a> que somente agora as "empresas de internet estão sujeitas às leis antitruste". 
No entanto, algumas pessoas consideram isso uma grande "novidade" porque o Google agora é um "monopólio declarado”. Essa descoberta não é surpreendente, nem particularmente reveladora. Há muito tempo, o Google detém uma parcela substancial do mercado de ferramenta de busca (search engine) nos Estados Unidos. Mas, como julgado na<a href="https://law.justia.com/cases/federal/appellate-courts/F3/253/34/576095/"> decisão</a> <a href="https://law.justia.com/cases/federal/appellate-courts/F3/253/34/576095/">de 2001 </a>no caso <a href="https://law.justia.com/cases/federal/appellate-courts/F3/253/34/576095/">Microsoft</a>, "a mera posse de poder de monopólio não é, por si só, uma violação antitruste". Em vez disso, o reclamante também deve provar uma conduta exclusionária – um requisito muito mais difícil de se atender. 
Ao mesmo tempo, o fato de um tribunal ter determinado que o Google tem poder de monopólio no mercado de ferramenta de busca geral não significa que outro tribunal concordará que ele tem poder de monopólio no mercado de publicidade online ou em outros mercados – ou que a Amazon tem poder de monopólio no varejo ou que a Apple tem poder de monopólio no mercado de smartphones. 
O caso em concreto trata sobre os contratos do Google para pré-carregar a ferramenta de Pesquisa Google (Google Search) como a ferramenta de busca padrão em navegadores (browsers) de internet e em dispositivos móveis (celulares). De acordo com o DOJ, esses contratos excluíram o Microsoft Bing (e outras ferramentas de busca gerais) de efetivamente competirem porque os usuários raramente mudam do padrão ou acessam outras ferramentas de busca. 
No entanto, há outra explicação para a falta de sucesso do Bing: talvez ele simplesmente não fosse tão bom. O juiz não descarta essa possibilidade nem mostra que o Bing teria sido bem-sucedido sem os contratos do Google. Como explicamos <a href="https://laweconcenter.org/wp-content/uploads/2024/08/Manne-Google-Search-Decision-Analysis-2024-08-14.pdf">de uma forma mais detalhada</a>, a conclusão jurídica de que o DOJ não precisava descartar outras possíveis causas do fracasso do Bing se baseia em uma interpretação equivocada do precedente estabelecido no caso Microsoft.
Para que seu caso prevalecesse, o DOJ deveria ter sido obrigado a provar que os contratos de distribuição padrão do Google efetivamente excluíram o Bing do mercado em detrimento dos consumidores. Mas esses contratos não são, de fato, exclusivos, e os usuários podem alterar facilmente os padrões ou acessar outros mecanismos de pesquisa.
A verdadeira questão é por que os usuários não mudam com frequência. Será que é simplesmente porque eles preferem a Pesquisa do Google (Google Search) ou será que, como o juiz compreendeu, o "poder dos padrões" faz com que os usuários continuem a usar os serviços fornecidos inicialmente? As evidências sugerem a primeira hipótese.
Na Europa, onde o Google foi proibido de ser oferecido como a ferramenta de busca padrão em dispositivos Android desde 2020, sua participação de mercado <a href="https://gs.statcounter.com/search-engine-market-share/mobile/europe/#monthly-202001-202408">quase não se moveu</a>. Em dispositivos Windows, onde o Bing é o padrão, a grande maioria dos usuários ainda escolhe o Google.
Em outras palavras, os usuários não têm problemas em se afastar dos padrões quando a alternativa é preferível. E mesmo quando não há uma ferramenta padrão, os usuários ainda preferem o Google Search. Se isso estiver correto, a decisão judicial tornará mais difícil para os usuários satisfazerem suas preferências – dificilmente um resultado desejável aos consumidores.
A conclusão do juiz parece estar enraizada em uma presunção de que as grandes empresas de tecnologia não podem se tornar dominantes simplesmente por serem melhores. E essa mesma suposição permeia grande parte da recém-descoberta antipatia do mundo pelas big techs. Os esforços para proibir tipos semelhantes de conduta (como a Apple integrando o iMessage aos iPhones ou o Google realizando um “self-preferencing” de seus mapas nos resultados de busca) sem prova de danos aos consumidores terão as mesmas consequências prejudiciais.
E há também uma lição mais ampla. Parte da concorrência mais importante nas plataformas digitais vem dos gigantes da tecnologia que entram nos mercados uns dos outros. A Microsoft está inquestionavelmente competindo com o Google no mercado de ferramentas de busca, mas simplesmente não está vencendo (por enquanto).
Da mesma forma, os dispositivos Android competem com os iPhones da Apple, a Amazon e a Meta competem com o Google na busca, e todos eles competem em inteligência artificial. Um padrão antitruste mais agressivo que julgue a concorrência por resultados em vez de oportunidades poderia ter o efeito não intencional de eliminar os incentivos dos rivais para inovar e derrubar as empresas estabelecidas. Isso não seria bom para os consumidores. 
Essas questões são particularmente relevantes no Brasil, onde a economia digital está crescendo rapidamente. O equilíbrio entre a promoção da inovação e a prevenção de práticas monopolistas é fundamental para o desenvolvimento de um setor tecnológico robusto e competitivo. À medida que os legisladores e reguladores brasileiros enfrentam esses desafios, eles não devem prejudicar os imensos benefícios dos investimentos competitivos dos gigantes da tecnologia.
Embora significativa, a decisão sobre a ferramenta de busca do Google não deve ser vista como um guia definitivo para a aplicação da lei antitruste na era digital. A decisão não se baseia apenas em fundamentos jurídicos questionáveis, mas também em uma compreensão errônea da competição que impulsiona os mercados digitais atuais. À medida que o Brasil continua a desenvolver sua abordagem para regular os gigantes da tecnologia, ele deve promover um ambiente em que as empresas de tecnologia locais e globais possam inovar e competir, beneficiando, em última análise, os consumidores brasileiros e a economia nacional.

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JOTA

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A decisão dos EUA no caso antitruste sobre a ferramenta de busca do Google

Decisão sobre a ferramenta de busca do Google não deve ser vista como um guia definitivo para a aplicação da lei antitruste na era digital