Mariana Saragoça

Julia Barker

Com montantes vultuosos, o novo estudo realizado pela ABCON/SINDCON demonstrou que o volume de investimentos atualmente necessário para o atingimento das metas de universalização é de R$ 893 bilhões. Do total, estima-se que para os próximos dez anos serão necessários R$ 600 bilhões em novos investimentos, sendo R$ 436 bilhões em esgotamento sanitário e R$ 164 bilhões em abastecimento de água, bem como R$ 293 bilhões na recuperação da rede existente<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Não obstante a evidente necessidade de integração e parceria entre o setor público e privado para acelerar os novos investimentos em todas as pontas do setor (e.g. produção e distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto, destinação de resíduos, dragagem), a regionalização – um dos principais pilares do Novo Marco Regulatório – ainda encontra resistências. Em linhas gerais, o modelo do chamado “filé com osso” só é possível quando há viabilidade econômico-financeira e, atualmente, muitos municípios-chave ou capitais vêm buscando suas próprias concessões/<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ppps">PPPs</a> municipais, inviabilizando projetos formulados com blocos regionais.
Nos estados como São Paulo e Rio Grande do Sul, que optaram por unidades regionais de saneamento em blocos (os quais possuem adesão voluntária), vislumbra-se, hoje, inúmeros questionamentos por parte das prefeituras municipais associados a baixos níveis de adesão dos municípios.
Ainda que o cronograma do <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l14026.htm">Novo Marco Regulatório</a> tenha sido prorrogado, conferindo prazo até março de 2023 para que os estados instituam a regionalização, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Acre, Pará e Tocantins ainda não conseguiram pactuar uma proposta de regionalização. O cenário é preocupante, em especial para os estados do norte do país, nos quais a não adesão das capitais pode inviabilizar o projeto como um todo.
Mesmo nas modalidades nas quais entende-se que há adesão obrigatória (microrregiões e regiões metropolitanas), os obstáculos se apresentam desde a aprovação da lei complementar de criação e se aprofundam nas estruturas de governança regulatória microrregional/metropolitana. A depender da modelagem dos projetos, não é incomum haver uma dinâmica de governança complexa, heterogênea e/ou labiríntica, com atuação de órgãos ou colegiados não apenas nas decisões de delegação dos serviços de interesse comum, mas também em processos desencadeados ao longo da execução contratual, como reequilíbrios, alteração e prorrogação dos contratos.
Nesse contexto, nos arranjos plurifederativos, tanto em concessões comuns como em PPPs, vislumbra-se espaço para aprimoramento visando garantir segurança jurídica ao operador privado, em particular no que tange à extensão de atuação da agência reguladora em suas atribuições de regulação econômica e fiscalização da concessionária. Com relação às PPPs e subdelegações, parece salutar migrar para um modelo em que a atuação da iniciativa privada seja fiscalizada e regulada de maneira efetiva pelas agências reguladoras infranacionais, com verificação periódica de cumprimento das metas contratuais e da qualidade.
Outro desafio da regulação para os próximos anos está atrelado à capacidade da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/ana">ANA</a>) publicar normas de referência de modo a segregar e harmonizar a aplicação das diretrizes aos contratos em curso e aos novos contratos, respeitados os contratos de programa legados. Nessa linha, a tendência é de que os titulares dos serviços e os prestadores estejam mais inclinados a adotar as normas de referência a serem publicadas pela ANA, o que demandará que as entidades reguladoras estejam preparadas tecnicamente para garantir uma regulação de alto nível, não mais represando pleitos de reequilíbrio e reajustes tarifários por ausência de corpo técnico qualificado.
Para a década que se inicia, também se faz essencial que os gestores públicos compreendam a relevância das atividades de resíduos sólidos e drenagem urbana. Apesar do fato de que os serviços de drenagem e esgotamento sanitário são indissociáveis, o planejamento urbano dos titulares dos serviços, em sua maioria, não se apropria de uma percepção integrada dos sistemas. Dado os alarmantes índices de atendimento de esgotamento sanitário no país, é preciso ter foco, ritmo e estratégia para garantir uma expansão que correlacione os sistemas de coleta de esgoto e de águas pluviais, delimitando as atribuições entre o prestador de serviço de coleta de esgoto e o prestador responsável pelos serviços de drenagem de forma a permitir uma maior eficiência em ambas as atividades.
Além de aprimoramentos legais e normativos, um dos pilares para garantir a universalização dos serviços vis-à-vis os quase R$ 900 bilhões em investimentos necessários para os dez anos, sem dúvidas, é a financiabilidade do setor. Para que seja possível destravar os investimentos, faz-se necessário reforçar o papel dos bancos públicos no project finance e na prestação de garantias. De forma complementar, o setor deve observar com atenção a possibilidade do uso de incentivos fiscais (REIDI) nas operações de saneamento, bem como os projetos de lei em trâmite relativos à emissão de debêntures incentivadas.
Para que o setor se mantenha sob os holofotes da população em geral, dos diversos governos e dos players do mercado, será preciso sair do óbvio e lidar com as dores da regulação fragmentada do setor, garantindo arranjos regulatórios robustos mesmo diante do quebra-cabeça normativo, previsibilidade de metodologias e prazos para assegurar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, exequibilidade do financiamento, utilização de novas tecnologias e inovação e expansão das atividades de resíduos sólidos e drenagem. Tudo indica que estamos caminhando na direção certa... agora é acelerar o passo!
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Fonte: Elaboração ABCON SINDCON com base nos dados do SNIS e KPMG. Dados atualizados pelo IPCA

saneamento

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