Felipe Recondo

Dois votos a favor, nenhum contra, mas algumas manifestações e argumentos que demonstram resistência de integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) à tese de que transexuais podem usar o banheiro público do gênero com o qual se identificam.
Os ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin votaram a favor de Ama, uma transexual que foi retirada de dentro do banheiro feminino pelos seguranças de um shopping de Santa Catarina.
Julgaram que ela e todos os trans – o caso teve repercussão geral reconhecida - têm o direito de serem reconhecidos pelo gênero com o qual se identificam. Podem, assim, usar o banheiro feminino se assim quiserem. E assentaram que cabe indenização por danos morais contra o estabelecimento comercial, como no caso, que não respeitar a opção do trans.
A tese proposta por Barroso, relator do processo, para a repercussão geral é: “Os transexuais têm direito a serem tratados socialmente de acordo com a sua identidade de gênero, inclusive na utilização de banheiros de acesso público”.
Como conclusão, restabelecia a indenização de R$ 15 mil imposta pela justiça de primeira instância de Santa Catarina e derrubada pelo Tribunal de Justiça.
Fachin acompanhou o voto e a tese, mas votou pelo aumento da indenização de R$ 15 mil para R$ 50 mil atualizados monetariamente desde e acrescido de juros de 1% ao mês a contar de agosto de 2008.
O pedido de vista do ministro Luiz Fux reverberou as divergências entre os integrantes do Supremo. Fux disse que há um desacordo moral razoável na sociedade sobre este tema. E justificou o pedido na necessidade de se ouvir a sociedade. Afirmou que seu dever de ofício era pedir vista em razão da repercussão do caso.
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Assim como este caso – RE 845.779 -, há outros 778 processos sobrestados nas outras instâncias do Judiciário sobre esta mesma controvérsia e que aguardam a decisão do STF.
Entre os advogados, como antecipou o JOTA, já havia a expectativa era de que um dos ministros pediria vista. E mesmo que Fux não o fizesse, o julgamento seria adiado em razão da falta de quórum.
Não participaram da sessão os ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. E a ministra Cármen Lúcia deixou o plenário antes de encerrado o julgamento. Com quatro ministros ausentes, o caso naturalmente teria de ser adiado.
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Comentários
Desde o início do julgamento, as perguntas feitas pelos ministros durante o debate mostraram a dificuldade que eles têm para digerir o assunto.
O ministro Marco Aurélio Mello, logo depois do voto do relator, perguntou se Ama (cujo nome civil é André dos Santos Fialho) tinha aparência de mulher. E afirmou que se ela tivesse a aparência de mulher, a segurança do shopping talvez não a tivesse abordado.
Barroso disse então que havia mostrado - antes da sessão - a foto de Ama aos ministros que manifestaram curiosidade.
Fux então perguntou à advogada Isabela Pinheiro Medeiros Gonçalves da Silva se sua cliente, Ama, se submeteu à operação de redesignação. A advogada afirmou que a operação está marcada para fevereiro do próximo ano.
Em seu voto, Fachin respondeu a esta dúvida e antecipou seu voto em outro processo que o Supremo terá de julgar. Para ele, um trans não precisa se submeter à cirurgia de mudança de sexo para ter alterado o gênero – masculino ou feminino - no registro civil. Acrescentou que exigir a submissão à cirurgia seria mais um dano imposto ao transexual.
Ao final, o presidente do Supremo, ministro Ricardo Lewandowski, expôs suas dúvidas sobre o caso. Disse que fica preocupado com a intimidade e a privacidade de crianças e mulheres quando estão no banheiro feminino. E afirmou que as mulheres estariam vulneráveis.
E Barroso retrucou. Disse que argumento nesse sentido seria preconceituoso, afinal um transexual vai ao banheiro em razão de necessidades fisiológicas. Se houver alguma conduta desrespeitosa, por exemplo, poderá ser punido por isso.
Em resposta a Fux, que alegou estar diante de um desacordo moral razoável, Barroso disse que a tese não poderia ser usada quando está em jogo um direito fundamental. “Não importa que a maioria pode estar descontente. Se houver violação a direito fundamental, ele deve prevalecer”, ponderou.
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Voto
Em seu voto, Barroso afirmou que era papel do Supremo, neste caso, assumiu uma posição iluminista para “fazer valer a razão materializada na Constituição sobre os preconceitos que muitas vezes acometem as grandes massas”.
“A ideia de dignidade como valor intrínseco impõe ao Estado que assegure a todos, inclusive às minorias mais discriminadas, o mesmo valor intrínseco que se reconhece às demais pessoas, inclusive o de preservar sua identidade e ser tratado de acordo com ela”, afirmou em seu voto.
Barroso enfatizou que o Brasil é um dos países com maiores índices de homicídio de transexuais. Lembrou o caso em que um pai espancou até a morte o filho de 8 anos com “traços efeminados”.
“É onde existe o preconceito que nós temos o nosso papel mais importante”, argumentou Barroso. “Ninguém escolhe se vai ser  heterossexual, homossexual, ou transexual. É um fato da natureza. E não respeitar isso é desrespeitar a natureza, e para os que creem, é desrespeitar a natureza divina”.

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JOTA

Barroso e Fachin votaram favoravelmente; Fux quer ouvir a sociedade.

Vista no STF adia decisão sobre uso de banheiro por transexuais

Barroso e Fachin votaram favoravelmente; Fux quer ouvir a sociedade.