Matheus Teixeira

O Supremo Tribunal Federal declarou constitucional a Lei 12.871/2013, que instituiu o Mais Médicos no Brasil. Por 6 a 2, o plenário da Corte julgou improcedente, na tarde desta quinta-feira (30/11), a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.035, proposta pela Associação Médica Brasileira. Assim, o governo pode seguir com o programa que recruta profissionais estrangeiros para trabalhar no Brasil.
O relator, ministro Marco Aurélio, ficou vencido. Para ele, a legislação não poderia prever a dispensa da exigência de revalidação do diploma dos médicos formados no exterior. Ele também afirmou que é ilegal a forma de contratação dos médicos cubanos, que recebem salário menor do que os demais.
O ministro Alexandre de Moraes, no entanto, inaugurou a divergência e defendeu a constitucionalidade da íntegra da norma. Ele reconheceu que a lei pode ter problemas de execução, como apontou relatório do Tribunal de Contas da União sobre a falta de fiscalização do trabalho dos profissionais estrangeiros, mas disse que não há inconstitucionalidade na matéria.
Moraes iniciou seu voto argumentando que não há problemas na dispensa de revalidação do diploma. “Para mim, diferentemente do que foi alegado, a lei não permite o exercício ilegal da medicina”, afirmou. Ele também defendeu a legalidade da atividade dos médicos cubanos no Brasil. "Quem se inscreve sabe as condições da bolsa. O Brasil não trata desigualmente a bolsa que oferece dentro do programa. Faz um chamamento e, no caso de Cuba, há um intermediário, a Organização Pan-Americana da Saúde, que recruta os cubanos".
O relator, no entanto, fez duras críticas ao tratamento dado aos médicos cubanos que, segundo ele, “viola direitos sociais assegurados aos trabalhadores na Constituição”. Para Marco Aurélio, a relação empregatícia estabelecida com os profissionais daquele país não se coaduna com o código global da Organização Mundial da Saúde para recrutamento internacional de profissionais da saúde.
Antes de os ministros começarem a votar, a advogada-geral da União, Grace Mendonça, usou a tribuna e sustentou que não há ofensa às regras trabalhistas. O advogado José Alejandro Bullon, que falou em nome do Conselho Federal de Medicina, amici curiae no processo, porém, já havia citado a diferença no tratamento aos cubanos. "Não vou nem falar dos médicos cubanos, que recebem apenas uma parcela do salário e o restante é enviado a Cuba através de convênio. Não encontro onde está isonomia de um profissional estrangeiro receber seu salário na íntegra e os cubanos receberem apenas um pequeno percentual", comentou.
Apesar das divergências, todos os ministros concordaram sobre a importância do programa. Para Marco Aurélio, o Mais Médicos é necessário para reduzir a desigualdade na distribuição dos médicos no país. "O Brasil tem proporcionalmente menos médicos do que nações vizinhas com perfil sócio econômico semelhante. Verificamos que há menos de um médico a cada 100 mil habitantes no Acre, Amapá, Maranhão, Pará e Piauí", afirmou.
Os ministros Luiz Edson Fachin, Celso de Mello, Rosa Weber, Luiz Fux e Gilmar Mendes acompanharam a divergência aberta por Moraes, enquanto Rosa Weber acompanhou o relator.
STF NO "ATOLEIRO"
A maioria dos ministros também divergiu do relator e seguiu voto de Moraes no sentido de extinguir por falta de legitimidade a ação proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU), que tratava do mesmo tema, mas era mais ampla. O ministro Gilmar Mendes concordou com Moraes, mas criticou o fato de o plenário ter discutido a matéria por horas para chegar ao final e não reconhecer uma das ações. "Vou fazer apenas uma consideração, tendo em vista o que vem se repetindo nesse ano. Com perdão da sinceridade, estamos caminhando para um atoleiro", criticou.
"Estamos caminhando para completo impasse na nossa atividade, por razões das mais diversas. Sustentações feitas e votos colhidos para depois não conseguirmos julgar o mérito. Temos que analisar criticamente nossos afazeres, porque estamos caminhando para o atoleiro”, alertou.
A presidente da corte, ministra Cármen Lúcia, concordou com Gilmar e afirmou que talvez seja momento de repensar as sessões do plenário. Como exemplo, ela citou que as turmas da corte costumam ter mais celeridade nos julgamentos.
Marco Aurélio criticou a decisão de não reconhecer a legitimidade da confederação. “É hora de o STF evoluir na interpretação do artigo 103 da Constituição de modo a ampliar a legitimação de entidades de classe e confederações sindicais para impetrar ações de constitucionalidade. Não há qualquer razão que justifica visão restritiva do supremo", sustentou.
DESENTENDIMENTO
Outro trecho do julgamento gerou uma tensão entre Marco Aurélio e o ministro Luís Roberto Barroso. Ao se aproximar do horário do intervalo regimental, Cármen Lúcia questionou aos colegas se preferiam seguir ouvindo o voto do relator ou se optavam por interromper a sessão. Barroso disse que tinha uma agenda marcada e que toparia ouvir a conclusão do voto antes do intervalo caso faltassem apenas 10 minutos para o fim, e Marco Aurélio rebateu: “Tendo em conta o cálculo formalizado por vossa excelência, ainda faltam sete folhas e, como são três minutos por folha, dá cerca de 20 minutos". "Nessa altura já estou preocupado por tê-lo feito permanecer no plenário e ouvir toda essa xaropada", completou.

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JOTA

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