Luiz Orlando Carneiro

Ainda não foi desta vez que o plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento da ação de inconstitucionalidade (ADI 1.923) em tramitação há mais de 16 anos, que vai definir a amplitude da Lei 9.637/98, do governo Fernando Henrique Cardoso. O texto criou o Programa Nacional de Publicização, que permite às chamadas organizações sociais – entes privados - a prestação de serviços públicos nas áreas de ensino, pesquisa científica, tecnologia, meio ambiente, cultura e saúde. 
O ministro Marco Aurélio – que pedira vista dos autos em maio de 2011 – proferiu, na sessão desta quarta-feira (15/04), um longo voto, no qual acolheu a tese do PT e do PDT, autores da ação, na linha de que a transferência a entidades de direito privado, sem a exigência de licitações, de atividades típicas de autarquias e fundações públicas fere a Constituição.
Assim, o placar, no momento, é de dois votos (Ayres Britto e Luiz Fux) a um (Marco Aurélio), pela procedência apenas em parte da ADI 1.923, mas admitindo ser válida a atuação indireta das organizações sociais, por meio da colaboração público-privada, instrumentalizada no contrato de gestão.
O julgamento será retomado na sessão desta quinta-feira (16/04).
Voto de Marco Aurélio
No seu voto divergente, Marco Aurélio começou por ressaltar que se tratava de um julgamento “fundamental”, em termos de “higidez do direito público”. A seu ver,  o Plano Nacional de Publicização resultaria na “ossificação das formas de atuação do Estado e de certa ideologia”. 
Em síntese, Marco Aurélio afirmou: “Não há como admitir que se passe para entidades sociais privadas as ações públicas nos campos da saúde, do ensino, da cultura ou preservação do meio ambiente, que não dispensam a atuação direta do Estado. O PNP configura privatização que ultrapassa as fronteiras permitidas pela Constituição. (...) Tais serviços são insuscetíveis de serem dados em concessão, e devem ser prestados diretamente pelo Estado. As organizações sociais só podem atuar em caráter complementar (...) A lei (em questã0) promove verdadeira privatização de serviços públicos essenciais (...) Na República, a coisa pública é inapropriável por particular. E a permissão para que não sejam realizadas licitações é inaceitável”.
Histórico
Em 31/4/2011, o julgamento do mérito da ADI 1.923 foi suspenso, por um pedido de vista do ministro Luiz Fux, o primeiro a votar depois do relator, Ayres Britto.
O  ministro Ayres Britto (que substituiu na relatoria o ministro aposentado Ilmar Galvão) afirmou no seu voto que é possível o entendimento de que há serviços públicos “passíveis de prestação não estatal”. Segundo ele, “os particulares podem desempenhar atividades que também correspondem a deveres do Estado, mas que não são exclusivamente públicas”.
No entanto, “se o Estado terceiriza funções que lhe são típicas, há uma situação juridicamente aberrante, pois não se pode forçar o Estado a desaprender a fazer aquilo que é da sua própria compostura operacional, a prestação de serviços públicos”.
Ayres Britto propôs a “modulação” dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade de dois artigos da Lei 9.637 referentes à extinção de “organizações sociais” que até hoje funcionam. De acordo com Ayres Britto, “tendo em vista razões de segurança jurídica, não é de se exigir a desconstituição da situação de fato que adquiriu contornos de consolidação”.
O ministro Luiz Fux acompanhou o voto de Ayres Britto, em sua maior parte. Sublinhou que a Constituição Federal não exige que o Poder Público atue nesses campos, exclusivamente, de forma direta. “Pelo contrário, o texto constitucional é expresso em afirmar que será válida a atuação indireta por meio do fomento, como faz com setores particularmente sensíveis, como, por exemplo, a saúde no artigo 199, parágrafo 2º, a educação no artigo 213, mas que se estende por identidade de razões a todos os serviços sociais”. Portanto, salientou que “cabe aos agentes democraticamente eleitos a definição da proporção entre a atuação direta e a indireta desde que, por qualquer modo, o resultado constitucionalmente fixado – a prestação dos serviços sociais – seja alcançado”.

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JOTA

Caso deve ser retomado pelo plenário na próxima sessão

STF suspende julgamento da ADI de organizações sociais

Caso deve ser retomado pelo plenário na próxima sessão