Felipe Recondo

Uma sequência de decisões judiciais impôs à Operação Satiagraha, da Polícia Federal,  uma inversão de papéis. Investigadores tornaram-se réus. Investigados tornaram-se vítimas. E as provas de possíveis ilegalidades foram anuladas porque obtidas de forma ilegal, conforme a Justiça.
Conduzida para investigar desvios de verbas públicas, corrupção e lavagem de dinheiro, a Satiagraha da Polícia Federal e do Ministério Público Federal apreendeu documentos do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, e do empresário Naji Nahas.
O desenrolar da operação:
1 – O delegado que comandou as investigações em 2008 afastou-se da Polícia Federal, elegeu-se deputado em 2010 e foi condenado criminalmente pela Justiça. Neste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a condenação pela prática de violação do sigilo funcional na Operação Satiagraha. Ele foi acusado de vazar dados sigilosos das investigações para jornalistas. O acórdão da ação penal ainda não foi publicado. O deputado embargará a decisão.
2 – O diretor da Agência Brasileira de Inteligência, Paulo Lacerda, foi demitido em meio às investigações em razão de suspeitas de instalação de grampos telefônicos no Supremo. Uma conversa entre o ex-senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) e o ministro do STF Gilmar Mendes teria sido gravada. Porém, as denúncias nunca foram confirmadas.
3 – Em razão da participação de agentes da Abin na investigação promovida pela PF, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou, em 2011, todos os procedimentos da operação, inclusive a condenação de Daniel Dantas pelo crime de corrupção ativa. Um recurso extraordinário (680.967) contra essa decisão aguarda julgamento pelo STF desde 2012.
4 – O STF, na semana passada, julgou ilegal a apreensão de discos rígidos dos computadores do Banco Opportunity. O mandado de busca e apreensão indicava que documentos e outros elementos poderiam ser apreendidos no 28o andar do prédio em que funciona o banco. Ao chegar ao prédio, os policiais souberam que havia computadores no 3o andar e pediram, em caráter emergencial, uma autorização para também apreender documentos nesta outra sala. A autorização foi concedida, mas a 2a Turma do STF a julgou ilegal por unanimidade. Os discos rígidos terão de ser devolvidos a Dantas e as informações neles contidas não podem ser usadas pela Polícia Federal.
*Após a publicação desta matéria, a assessoria de imprensa do Opportunity enviou email ao JOTA informando:
A reportagem “Satiagraha: inversão em quatro pontos”, cita Daniel Dantas e o Opportunity.
Por isso, é preciso esclarecer que:
1. Caso Kroll/Chacal 
No final de 2002, a Brasil Telecom (BrT) contratou a Kroll para subsidiar pedido de indenização contra a Telecom Itália por conta de prejuízos sofridos principalmente pelo impedimento de a BrT atuar no mercado de telefonia celular e pela aquisição superfaturada da Companhia Riograndense de Telefonia (CRT). A Kroll havia sido usada com sucesso pelo Congresso Nacional no rastreamento do dinheiro do esquema PC Farias-Collor.
À época, o Opportunity, gestor do fundo de investimento que controlava a Brasil Telecom, se opôs à manobra conduzida pela Telecom Itália, com o apoio de dirigentes de fundos de pensão, para que fosse pago um  sobrepreço na aquisição da CRT. Destaque-se que tanto os fundos de pensão, quanto a Telecom Itália, eram sócios da Brasil Telecom – o que tornava, no mínimo, suspeitos os esforços desmedidos para o pagamento do sobrepreço à Telefónica, dona da CRT.
A partir de então, a Telecom Italia e seus aliados orquestraram ações contra Kroll, Carla Cico (CEO da BrT) e Daniel Dantas, com o intuito de impedir a continuidade do trabalho da Kroll que poderia desvendar o esquema de corrupção transnacional montado pela operadora italiana. 
Essas ações acabaram por mobilizar o aparato estatal brasileiro para usurpar o controle da Brasil Telecom, o que terminou por ocorrer em setembro de 2005.
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2. Falsa denúncia
Nessa orquestração, a falsa denúncia armada, em 2004, pelos italianos – a de que Daniel Dantas, por meio da Kroll, estaria “espionando” a Telecom Itália e o alto escalão do governo Lula – tornou-se a mais estridente.
A “denúncia” apresentada pela Telecom Itália à imprensa e à Policia Federal brasileira,  origem do  escândalo policial/midiático, foi considerada falsa pela Procuradoria de Milão.
Em 25 de setembro de 2007, o juiz italiano, Guiseppe Gennari,  afirmou:
“... Jannone (ex-chefe de Segurança da Telecom Itália no Brasil) já demonstrou concretamente a própria vontade e capacidade de desviar as investigações da verdade e orientá-las para os objetivos cômodos para o interrogado. Basta, para tal fim, lembrar a falsa denúncia que Jannone apresenta no Brasil como base em documentos que ele mesmo havia contribuído para subtrair ilicitamente da Kroll”.
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Em 9 de julho de 2009, em um dos processos na Itália, Daniel Dantas e empresas que utilizam a marca “Opportunity” foram habilitados como vítimas de crimes cometidos pela Telecom Itália. Em 10 de fevereiro de 2012, Daniel Dantas foi absolvido das acusações na operação Chacal no Brasil.
Em julho de 2013, na Itália, Marco Tronchetti Provera foi condenado a 20 meses de prisão por espionagem e por ter  obtido e usado com fins lucrativos, um "CD contendo dados e informações obtidos por meio de invasão informática aos computadores da Kroll" e que ele tinha "conhecimento de sua procedência ilícita", conforme destaca a imprensa italiana.
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3. Mandado de busca e apreensão
O caso Kroll, foi o estopim da Chacal, que foi deflagrada em 27 de outubro de 2004,  com a invasão à sede do Opportunity e à casa de Daniel Dantas e de Carla Cico.
O mandado de busca e apreensão era para o 28º andar, local do escritório de Daniel Dantas. Os policiais resolveram também invadir o 3º andar – onde funcionava o Banco Opportunity, antigo Banco Lógica, de Dorio Ferman, que  sequer era investigado, e apreenderam HDs que, mais tarde, foram usados na Satiagraha. Ressalte-se que a Brasil Telecom, empresa que contratou a Kroll, não fez parte da investigação.
É como se policiais tivessem, por exemplo, um mandado de busca e apreensão para a Bradesco DTVM e resolvessem estender o mandado também para o Banco Bradesco porque as duas empresas ficam no mesmo edifício.
4. Satiagraha
A Operação Satiagraha, desdobramento da Operação Chacal, ocorreu, entre outros motivos, para ocultar os crimes originalmente cometidos pela Telecom Itália e autoridades brasileiras.
O próprio Ministério Público Federal, por duas vezes, pediu a descontinuidade da investigação, “já que dos autos não consta nada de concreto que sequer surgira a prática de crime por quem quer que seja”.
Em 7 de junho de 2011, a operação Satiagraha foi anulada pelo Superior Tribunal de Justiça, acatando parecer do Ministério Público Federal, em razão da participação ilegal de agentes privados e da ABIN.
Em 21 de outubro de 2014, Protógenes Queiroz, que comandou a Satiagraha, foi condenado por violação de sigilo funcional de forma qualificada (artigo 325, parágrafo 2º do Código Penal) pelo Supremo Tribunal Federal em votação unânime (3 votos a 0). Os ministros fixaram a pena em 2 anos e 6 meses, substituída por prestação de serviços. Foi mantida a perda do cargo público e a Câmara dos Deputados foi notificada para que decida sobre os direitos políticos do condenado.
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5. Recursos Públicos
O Opportunity nunca lidou com recursos públicos.
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6. Vítimas 
O Opportunity e seus executivos foram vítimas das operações Chacal e Satiagraha, encomendadas para atender interesses privados.  As ilegalidades verificadas não são fruto do acaso mas produto de mobilização indevida do aparato estatal acionado por concorrentes do Opportunity.

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JOTA

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