Por 6 votos a 4, os ministros do Supremo Tribunal Federal suspenderam a Lei 13.269/2016 e, como consequência, impediram a comercialização e distribuição da fosfoetanolamina sintética, a chamada "pílula do câncer".
Nesta quinta-feira (19/5), os ministros analisaram um pedido de liminar, ou seja, não julgaram o mérito da questão. Até julgar o mérito, a lei ficará suspensa. Ainda não há data para a sessão de julgamento que definirá o uso da substância.
A maioria dos ministros seguiu o voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello, que concordou com o pedido da Associação Médica Brasileira (AMB). A entidade pedia a suspensão da norma por não existirem estudos conclusivos sobre os efeitos colaterais em seres humanos.
Os pacientes que já obtiveram o direito de receber a substância não serão atingidos pela decisão. Eles continuarão recebendo a pílula do câncer até acabar o estoque do local.
A lei foi aprovada pelo Congresso e sancionada em abril pela presidente Dilma Rousseff.
Votaram a favor de suspender a lei os ministros Marco Aurélio, Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Luiz Fux, Cármen Lúcia e o presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski. 
“É no mínimo temerária – e potencialmente danosa – a liberação genérica do medicamento sem a realização dos estudos clínicos correspondentes, em razão da ausência, até o momento, de elementos técnicos assertivos da viabilidade da substância para o bem-estar do organismo humano”, afirmou Marco Aurélio.
Os demais ministros votaram para liberar a substância apenas para pacientes terminais. Foram eles: Edson Fachin, Rosa Weber, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
"Não há inconstitucionalidade nos dispositivos da lei, que se limita a autorizar a distribuição da substância. O uso privado de substâncias ainda que apresentem eventuais efeitos nocivos à saúde, está imune a proibição. O uso da substância é permitido se não há lei que o proíba. Se for proibida, há limite claro quando à ofensividade", afirmou Fachin ao abrir a divergência.
A AMB protocolou uma Ação de Inconstitucionalidade com pedido de medida liminar pedindo para suspender a lei que autoriza o uso da fosfoetanolamina sintética. Na sessão desta quinta-feira, o advogado Carlos Magno Michaellis Junior, que representa a associação, alegou que a permissão do uso da pílula caracteriza risco grave à vida e integridade dos pacientes, uma vez que não se sabe quais são as consequências ao organismo humano. 
Segundo o advogado, a disponibilização da fosfoetanolamina, cuja eficácia não está comprovada, para o combate ao câncer, por livre escolha do paciente e independente de prescrição médica, caracteriza falha do Estado, no cumprimento do dever de promoção do direito à saúde.
O primeiro a votar o pedido liminar foi o relator, ministro Marco Aurélio. Segundo ele, o dever de fornecer medicamento, contrapõe-se a obrigação de se zelar pela qualidade dos produtos oferecidos à população. 
“A esperança depositada pela sociedade em medicamentos, principalmente em doenças como câncer, não pode se dissociar da ciência. É preciso cuidar da segurança e da eficácia do direito à saúde. Há que haver rigoroso crivo científico, apto a afastar desenganos, charlatanismos e efeitos prejudiciais à saúde humana”, afimrou. 
Ele chegou a citar estudo do médico Raul Cuitat quando afirmou que a maior contribuição de Hipócrates à medicina tenha sido afirmar que as doenças deveriam ser entendidas à luz da ciência e não como castigo dos deuses, como apregoavam sacerdotes e curandeiros.
Logo em seguida, o ministro Edson Fachin abriu divergência por entender que o medicamento poderia ser liberado apenas para pacientes terminais. Sustentou que “ante a gravidade da doença a própria Anvisa permite o uso de certas substâncias (ainda não aprovadas formalmente), em casos de doentes portadores de doenças muito graves, sem acesso. Só para doenças debilitantes graves”.
Fachin citou a Resolução 38/2103 da Anvisa, que abriu exceções em processos de uso de medicamentos ainda não aprovados:.
Art. 4º O processo de anuência da Anvisa para os programas de acesso expandido, uso compassivo e fornecimento de medicamento pós-estudo se inicia com a solicitação do patrocinador ou organização representativa do patrocinador à Agência.
Art. 5º As solicitações de anuência dos programas de acesso expandido e uso compassivo serão analisadas de acordo com os seguintes critérios:
I - gravidade e estágio da doença; 
II - ausência de alternativa terapêutica satisfatória no país para a condição clínica e seus estágios; 
III - gravidade do quadro clínico e presença de co-morbidades; e 
IV - avaliação da relação risco benefício do uso do medicamento solicitado.
O ministro Barroso discordou. Para ele, muito embora tenha passado por testes em camundongos, sem a completa submissão da fosfoetalamina a testes não é possível aferir a sua segurança e eficácia, e também submeter à Anvisa para liberação. "Não se sabe se é tóxica ou se produz efeitos colaterais", disse.
Barroso citou duas teses para suspender a lei. A primeira é que a autorização de uso da fosfoetalomina sintética anteriormente à realização de testes necessários para comprovar que o compsto seja seguro eficaz coloca em risco a vida das pessoas. E em segundo lugar, ele aponta que há, em hipótese, violação da reserva de administração.
"Ao autorizar o seu uso sem a exigência de testes clínicos, o Poder Legislativo substituiu o juízo técnico da Anvisa por juízo político", afirmou.
Em voto rápido, a ministra Rosa Weber seguiu Fachin para ressalvar os casos terminais, mas que, mesmo assim, têm de invocar a resolução da Anvisa de 2013. 
Assim também decidiu o ministro Dias Toffoli. Ele alegou que o mérito administrativo é da Anvisa, que é quem autoriza a comercialização de medicamentos, e não pode ser invadido pelo Judiciário.
O ministro Gilmar Mendes afirmou não ver vícios de iniciativa na Lei 13.269. “Não acredito que, diante da insegurança existente e da precariedade dos serviços de saúde no país, ao suspendermos a lei estaremos produzindo uma situação que vai estimular a judicialização”, afirmou. 
Fux não entendeu da mesma forma e votou para suspender a norma. Ele defendeu que o uso da “pílula do câncer” pode fazer com que os pacientes abandonem o tratamento convencional. 
A ministra Cármen Lúcia levou em consideração que os médicos apontaram riscos de efeitos colaterais e, apesar de afirmar que “a dor tem pressa”, votou no sentido de suspender a norma. 
Por último, o ministro Ricardo Lewandowski ressaltou que a inexistência de estudos científicos que atestem que o consumo da fosfoetanolamina sintética seja inofensivo ao organismo humano e o desvio de finalidade da instituição de ensino, que tem como atribuição promover a educação, são justificativas à suspensão de seu fornecimento pela USP, após o término do estoque já existente.
Lewandowski afirmou que Estado deve agir com bases científicas. Com o seu voto, o placar ficou em 6 a 4 e a lei foi suspensa. 
Leia abaixo os dispositivos que foram questionados da Lei 13.269/2016:
Art. 1º Esta Lei autoriza o uso da substância fosfoetanolamina sintética por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna. 
Art. 2º Poderão fazer uso da fosfoetanolamina sintética, por livre escolha, pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, desde que observados os seguintes condicionantes: 
I - laudo médico que comprove o diagnóstico; 
II - assinatura de termo de consentimento e Cópia ADI 5501 MC / DF responsabilidade pelo paciente ou seu representante legal. Parágrafo único. A opção pelo uso voluntário da fosfoetanolamina sintética não exclui o direito de acesso a outras modalidades terapêuticas. 
Art. 3º Fica definido como de relevância pública o uso da fosfoetanolamina sintética nos termos desta Lei. 
Art. 4º Ficam permitidos a produção, manufatura, importação, distribuição, prescrição, dispensação, posse ou uso da fosfoetanolamina sintética, direcionados aos usos de que trata esta Lei, independentemente de registro sanitário, em caráter excepcional, enquanto estiverem em curso estudos clínicos acerca dessa substância. Parágrafo único. A produção, manufatura, importação, distribuição, prescrição e dispensação da fosfoetanolamina sintética somente são permitidas para agentes regularmente autorizados e licenciados pela autoridade sanitária competente. 
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação

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Por 6 a 4, STF suspende comercialização da pílula do câncer

Maioria segue relator Marco Aurélio