Luiz Orlando Carneiro

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal, nesta semana, parecer contrário à responsabilização do Estado por danos morais causados a detentos submetidos a condições sub-humanas, insalubres, degradantes ou de superlotação dos presídios, objeto de ação de inconstitucionalidade (ADI 5.170) proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil, em outubro do ano passado.
Para o chefe do Ministério Público, o Estado não deve pagar indenização em tais casos, pois “nem toda inação administrativa rende ensejo a responsabilidade civil do poder público, mas apenas omissões específicas, em que há dever individualizado de agir”.
A polêmica questão também está sendo discutida, no STF, em recurso extraordinário (RE 580.252), com repercussão geral reconhecida, protocolado em 2008, contra acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que entendeu não ser devida, pelo estado, nenhuma indenização por danos morais a um preso que alegava ser vítima de falta de condições mínimas de saúde e de higiene. Com o apoio da Defensoria Pública estadual, o condenado invocou a violação do princípio da dignidade humana, e alegou ser obrigação do Estado a construção de novos presídios com “condições dignas” para o cumprimento de penas de reclusão.
Este recurso já começou a ser julgado pelo plenário, em dezembro último, quando o ministro-relator Teori Zavascki proferiu voto na linha de que tal indenização é devida, mesmo que o Executivo alegue não ter como pagar um número incalculável de reparações por danos morais. O ministro Roberto Barroso pediu vista dos autos, mas seu colega Gilmar Mendes antecipou a sua posição, apoiando o entendimento do relator.
Parecer da PGR
Não é possível saber, ainda, se o julgamento do recurso com repercussão geral será encerrado antes do início da apreciação, pelo plenário do STF, da ação de inconstitucionalidade – que tem, é claro, maior peso e alcance mais amplo do que o RE.
No parecer protocolado no STF na última terça-feira (7/4), relativo à ADI 5.170, o procurador-geral Rodrigo Janot analisou os artigos do Código Civil que tratam da responsabilidade civil do Estado (arts. 43, 186, 927) e, particularmente, a possibilidade da chamada interpretação conforme a Constituição.
Os principais pontos do parecer, em síntese, são os seguintes:
“1. A aplicação da técnica de decisão da interpretação conforme a Constituição pressupõe, como requisito essencial, caráter polissêmico ou plurissignificativo da norma, a ensejar duas ou mais interpretações, desde que uma delas seja compatível com o texto constitucional. 
2. Aplicabilidade da norma a fatos jurídicos indeterminados não significa pluralidade de interpretações, mas multiplicidade de situações jurídicas passíveis de sofrer eficácia da lei. Essa circunstância não autoriza aplicação da técnica de interpretação conforme a Constituição. O fato de o campo de incidência da norma atingir múltiplas situações jurídicas não confere, por si, caráter polissêmico ou plurissignificativo ao preceito; ao contrário, é decorrência da generalidade e da abstração próprias de normas gerais. 
3. É descabida a aplicação de interpretação conforme para alargar o campo de incidência dos arts. 43, 186 e 927, caput e parágrafo único, do Código Civil, de modo a reconhecer responsabilidade civil do Estado por danos morais causados a presos em condições impróprias. 
4. Nem toda inação administrativa rende ensejo a responsabilidade civil do poder público, mas apenas omissões específicas, em que há dever individualizado de agir. 
5. Deixar o Estado de cumprir política pública de ampliação e adequação do sistema prisional não gera automático dever de indenizar por superlotação carcerária, sob pena de convolar o poder público em segurador universal. 
6. Responsabilidade subjetiva do Estado depende de comprovação de dolo ou culpa do agente, de mau funcionamento ou falha da administração (faute du service) e de nexo de causalidade entre a omissão específica atribuída ao poder público e o dano gerado a terceiro. 
7. Apreciação de relações jurídicas concretas que possam dar ensejo a responsabilidade subjetiva do Estado refoge ao domínio objetivo dos processos de fiscalização abstrata de constitucionalidade. 
8. Parecer pelo não conhecimento da ação e, no mérito, pela improcedência do pedido”.

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JOTA

Nem toda inação administrativa rende ensejo a responsabilidade civil, diz parecer

PGR é contra indenização de preso em situação degradante

Nem toda inação administrativa rende ensejo a responsabilidade civil, diz parecer