Bárbara Mengardo

Em palestra nesta sexta-feira (30/10), o ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), questionou a necessidade de a sociedade elevar juízes ao posto de “heróis”.
Para o magistrado, a prática confirma uma crise nas instituições brasileiras, que não estariam funcionando.
Barroso participou do XXII Congresso Brasileiro de Magistrados, organizado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).
O ministro afirmou que “o mensalão e o petrolão criaram heróis, porque foram juízes que saíram do padrão”, completando que “se um modelo precisa de heróis é porque as instituições não funcionam”.
O magistrado não poupou críticas ao sistema prisional do país. Segundo o ministro, o “sistema punitivo brasileiro é feito para pegar pobres”, e “é muito mais fácil prender um menino com 100 gramas de maconha do que empresário que praticou golpe”.
Para ele, é preciso, entre outros pontos, mudar o sistema recursal, que possibilita a interposição de recursos protelatórios visando a prescrição.
O magistrado também criticou a necessidade de esperar o trânsito em julgado da ação para passar à fase de execução criminal.
“A advocacia criminal passou a ser uma busca desesperada por prescrição”, afirmou.
Vagas para adolescentes
A redução da maioridade penal foi outro tema tratado por Barroso. Sem antecipar qual seria seu voto em um julgamento sobre o tema, o magistrado apresentou três considerações sobre o assunto:
“Quantas pessoas seriam colhidas se maioridade penal baixasse?
Quantas vagas deveriam ser criadas no sistema?
Quanto vai custar para a sociedade essa mudança?”
Epidemia
O ministro afirmou que atualmente há “uma epidemia de processos judiciais no país”, motivada em parte pela atuação do poder público no Judiciário. Segundo o magistrado, o Estado é o maior “cliente” da Justiça, uma vez que é parte em um terço das ações em tramitação.
Barroso criticou o fato de o Estado não realizar acordos, mesmo quando está manifestamente equivocado.
“O poder público litiga de uma forma que sobrecarrega o sistema e faz mal para a justiça”, afirmou.
Ainda sobre a importância da realização de acordos, o magistrado disse que no futuro, “o grande advogado vai ser o sujeito que tem a capacidade de articular e negociar para não propor uma demanda [judicial]”.
O magistrado também respondeu a críticas de que o Supremo seria “ativista”. Para ele, a Corte acaba analisando muitos temas porque a constituição permite que um número muito grande de instituições ajuizem ações diretas de inconstitucionalidade (adins).
Por conta disso, chega à Corte Superior uma gama muito grande e variada de assuntos, que muitas vezes não está regulamentada por leis.
Ainda sobre situações que não encontram amparo em leis ou na Constituição, Barroso citou um caso que chegou ao Judiciário envolvendo um casal de surdos mudos, que desejavam gerar, por meio de manipulação genética, um filho também surdo e mudo.
O objetivo dos pais era garantir que a criança “habitasse o mesmo universo dos pais”.
O ministro afirmou, ainda, ter ouvido de uma juíza um caso envolvendo uma senhora que recebeu um transplante de fígado, mas teve rejeição ao órgão. A magistrada deveria decidir se ela teria direito a voltar ao primeiro lugar da fila de doação, ou se o próximo fígado disponível deveria ir para a próxima pessoa.
“Os juízes têm que fazer escolhas trágicas rotineiramente”, afirmou.
Reforma política
Assim como o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, Barroso criticou o voto proporcional no Brasil. Ele disse que, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 92% dos deputados são eleitos sem votação própria.
O fato, para o magistrado, cria uma situação em que “o eleitor não tem a quem cobrar e eleito não tem a quem prestar contas”. O ministro defende voto distrital misto.
Lewandowski fez a crítica durante a abertura do congresso da AMB na noite de quarta-feira (29/10).
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Barroso também tocou em temas sociais, e afirmou que “o Judiciário não vai mudar o mundo, o que muda o mundo é mobilização social”.
Sobre união homoafetiva, Barroso disse que: “o que vale na vida são os afetos, e o Estado não tem como discriminar o afeto.”

Barroso na 22 conferencia nacional de advogados – Divulgação

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JOTA

Ministro participa de congresso de magistrados organizado pela AMB

O que muda o mundo não é o Judiciário, mas mobilização social, diz Barroso

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