Kalleo Coura

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes afirmou que as cortes constitucionais são órgãos eminentemente políticos. A avaliação foi feita durante um debate sobre a crise política e conflito entre poderes na Casa do Saber, em São Paulo.
“Na medida em que as cortes constitucionais se consolidam como órgãos de interpretação, elas passam a ser órgãos eminentemente políticos, não político-partidários, mas definidores dos limites de poder”, afirmou o ministro ao ser questionado se a manifestação fora dos autos por parte dos integrantes do tribunal não atrapalha a percepção da sociedade sobre isenção do julgamento.
Mendes é um dos integrantes do Supremo que mais faz considerações públicas sobre os cenários político e jurídico do país. Para o ministro, o papel do presidente do STF é ainda mais político, por ser “o presidente do Judiciário”, papel que é reforçado ao abarcar também a presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“Ele tem um papel importantíssimo de sinalização da representação do Judiciário como um todo, inclusive nos embates com outros poderes. Tem que falar. Presidente do Supremo que não fala, não representa o Supremo”, afirmou.
Segundo Mendes, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral, é uma vantagem que um ministro do Supremo emita opiniões sobre casos já conhecidos e que não estão em julgamento porque “é bom até saber como cada juiz vai decidir”, é uma “segurança”. “O difícil é justificar como alguém decide um caso desta maneira e agora decide de outra. A mim me parece que isto é um problema. Isto tem que fazer de maneira justificada”.
“Herói ministro Fux” 
Mendes qualificou a decisão que declarou inconstitucional a Emenda 62 sobre os precatórios como o maior erro da história do STF. A Emenda vinculava uma parte da receita líquida dos governos ao pagamento de precatórios.
Quando o tribunal declarou a inconstitucionalidade da Emenda, os governadores “que não tinham dinheiro, e agora não tinham obrigação específica, deixaram de pagar”.
“Alguém do bloco vencedor disse: veja, por exemplo, o bom exemplo do Rio de Janeiro. Pagou todos os precatórios. Pegou dinheiro do depósito de privados e pagava precatórios. Veja esse magnífico governo. Inclusive, o ministro Fux [dizia]. Bom, vocês podem ir ao Rio de Janeiro para ver a magnífica obra que lá foi realizada”, ironizou Mendes.
Com o resultado da decisão, a emenda ficou pior do que o soneto. “A OAB, então, correu ao relator da ação, o herói ministro Fux, pedindo a ele que enquanto não soubesse o que ia fazer enquanto modulação de efeitos pelo menos declarasse que a emenda que declaramos inconstitucional ficasse em vigor. Simples assim”.
“O Toffoli, coitado” 
Gilmar foi questionado pelo público se o modelo de indicação presidencial para ministros do Supremo seria o mais adequado. Segundo ele, por causa do escrutínio da sociedade não ocorre aparelhamento na Corte, mas em outros tribunais que não são acompanhados tão de perto, sim.
“Veja o que aconteceu com a Justiça do Trabalho. Em que ninguém reparou e todos os sindicalistas estão lá. Todos os empresários hoje reclamam da Justiça do Trabalho, mas não acompanharam as indicações”, afirmou.
E o Toffoli? Questionou uma pessoa da plateia.
“Ele vem desempenhando bem o seu papel. O Toffoli, coitado, paga um preço danado por conta disso. Ele é um excelente juiz. Sou insuspeito de ser simpático ao PT, não me fizeram essa acusação até hoje. Mas vocês sabem que eu gosto do Toffoli, defendi a ida dele para o Supremo e defendi recentemente a ida dele para a Segunda Turma”, defendeu Gilmar.
Ao fim do debate, Mendes disse em entrevista que “ninguém deseja ser relator da Lava Jato. Isso tumultua a vida de todos e desorganiza por completo o gabinete, que passa a ser concentrado neste tipo de matéria”.
Tribunal mais poderoso do mundo 
O constitucionalista português Carlos Blanco de Morais também participou do evento, organizado pela Casa do Saber e pelo Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP). Para ele, O STF tem funcionado como um superintendente da administração pública.
“O STF é talvez o tribunal mais poderoso do mundo. Através da interpretação, cria verdadeiras mutações constitucionais. É o caso da decisão da união homoafetiva porque a Constituição não previa essa figura. No fundo, o tribunal pregoa um conjunto de princípios e esse critério de decisão tem prevalência sobre uma regra – e não o contrário, o que é uma coisa estranha”, analisou.

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JOTA

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